É entre piruetas e saltos que o Instituto Rudá, braço social do Circo Rudá, abre as portas para que crianças em vulnerabilidade social descubram o mundo do circo e o futuro que se descortina através dele, em Santos.
De manhã e à tarde, cerca de 30 assistidos por comunidades e instituições participam das aulas, oferecidas por profissionais do picadeiro que, agora, oferecem a chance de continuidade da arte e de uma nova história de vida para os pequenos.
A ideia surgiu de quem viu seu talento ser despertado e oportunidades brilharem em seu caminho a partir de um projeto social na área do esporte montado pela Prefeitura de Santos. Coincidentemente, tudo começou no bairro onde hoje Gustavo Lobo preside o instituto: o Estuário.
“Parece que Papai do Céu brinca com a gente. Se não fosse o esporte, eu seria mais um número nas estatísticas e, como nunca imaginei, abri um instituto na mesma rua em que cresci.”
E, como diz o ditado, o mundo dá voltas. Agora repete um ciclo que alterou o seu destino e que promete mudar o de muitos outros.
O esporte levou Gustavo, ainda menino, para a ginástica artística. Representou o Brasil e deu muito orgulho para o País.
Mas ele foi além. Reencontrou uma paixão e, daí para a frente, o circo nunca mais saiu de sua vida. Ele ingressou no Cirque Du Soleil, um dos mais conhecidos do planeta e, além dos espetáculos, atuou em outras fronteiras.
“É o Circo do Mundo, que também trabalha com crianças e adolescentes em situação de risco em vários países. Participei de muitas ações. Quando voltei, disse: ‘É isso que vou fazer’.”
A vontade de desenvolver um projeto social aumentou depois de criar sua própria companhia, a Rudá, e montar espetáculos em solo nacional.
Em abril deste ano, sonho e realidade se encontraram – e não vieram sozinhos. Gustavo batalha com um time de peso, que se doa de alma e coração para os pequenos encontrarem no instituto não só vocação e talento, mas uma bússola que aponte para uma profissão e um futuro diferente.
Levam jeito
Nas mãos do professor e coordenador pedagógico, Fausto Franco, eles já se soltam entre um exercício e outro. Esquecem histórias tristes, que envolvem o afastamento da família e dificuldades diárias. Assim, aptidões vão surgindo.
“Eles são muito espontâneos. Observar como um se dá bem no tecido, que o outro se encantou com a cama elástica e, a partir desse encantamento, como vão se dedicando e progredindo, é muito gratificante.”
Basta olhar Julia, de 6 anos, que amou o tecido acrobático e nem vê a hora passar durante a aula. “Eu sonho que estou num lindo palco.”
Lucas, de 12 anos, também se perde no tempo, dividindo-se entre cama elástica, tecido acrobático e a roda. “Adoro aprender. Me imagino num espetáculo. É muito emocionante.”
Superando expectativa
Difícil para os profissionais envolvidos no projeto foi dimensionar o que viria do encontro com os garotos, que têm de 7 a 15 anos.
“Sabia que a gente ia fazer um trabalho com cunho social e da importância disso. Mas não estava muito preparada para saber a história de cada um. Acho que essa é a parte que mais pega para mim”, conta, emocionada, a coordenadora Sarah Antunes.
Depois disso, ela diz que só aumentou a vontade de que tudo dê certo e que o circo seja apenas um empurrão para um futuro promissor.
“A gente entende o circo como profissão. E a ideia é que essas crianças tenham acesso a isso. Assim como tem muita criança querendo ser jogador de futebol, tem muita gente querendo fugir com o circo”, brinca. “E a gente está aqui para que eles encontrem essa possibilidade, que eles encontrem uma profissão no circo. E abrir portas, se eles quiserem.”
Quem participa se vê de outro jeito
O desenvolvimento emocional e psicológico de crianças e adolescentes também começa a ser visto em seis meses de projeto, diz a psicóloga e coordenadora social Ariana Gonzaga.
Muitos fazem parte de instituições como a Casa da Criança e o Anália Franco. “São crianças que estão em condições de vulnerabilidade extrema e muito fragilizadas sem a integração sem a ideia da família.”
A psicóloga do Anália Franco, Maria Luiza Alves da Silva, considera que a iniciativa “ajuda a forma como começam a se enxergar. Veem que estão em um projeto bacana, que tem outra proposta e, querendo ou não, estão representando o Circo Rudá”.
Também são atendidos pelo instituto jovens que passam por abrigos e comunidades como Vila Sapo, em Santos, e México 70, em São Vicente.
Próximos passos
O instituto também quer ampliar o atendimento para a área educacional e atuará em parceria com a Secretaria de Educação de Santos. Mesmo assim, sente falta de mais apoio do Município e de empresários.
“O projeto pode parar em dezembro se não tiver incentivos. (...) Estamos dando a contrapartida para a sociedade. Mas devagarinho a gente vai”, acredita o idealizador da instituição, Gustavo Lobo.
Perfil
Instituto Rudá
O que é?
O Instituto Rudá, braço social do Circo Rudá, tem um projeto para ajudar crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social por meio de atividades circenses. A ideia é integrá-los ao mundo da arte e da expressão, descobrindo talentos ou abrindo portas para futuros profissionais.
Onde?
As atividades ocorrem às terças e quintas-feiras, na sede do Instituto, que fica na Rua Otávio Corrêa, 160, no Estuário, em Santos