O mar, a água potável, os astros

Antes do que se imagina para a entrega das balsas a particulares, vem aí a apressada privatização da Sabesp

Por: Rafael Motta  -  27/10/23  -  06:15
  Foto: Unsplash

O Ministério Público Estadual está cumprindo seu papel ao pedir explicações ao Governo do Estado sobre o desrespeito cotidiano aos cidadãos que dependem das travessias de balsas entre Santos e Guarujá. Mas, como há décadas, tudo ficará como está após as prováveis respostas oficiais, do tipo “estamos investindo no sistema”, “prevemos ‘x’ milhões de reais em reparos e embarcações”, “agora, melhoramos a manutenção” etc.


A espada sobre o pescoço do contribuinte, que só vê o serviço piorar, atende pelo nome de “concessão à iniciativa privada”, ou privatização. Que, no Brasil, é assim: depois de muitos anos sem fazer o que deveria, o poder concedente (Governo Federal, Governo Estadual) faz uma baita aplicação de recursos para corrigir problemas, põe a coisa à venda, obtém dinheiro para reforçar o caixa de imediato e, logo, fica sem o serviço nem o dinheiro.


Antes do que se imagina para a entrega das balsas a particulares, vem aí a apressada privatização da Sabesp. Apressada porque, sem um mínimo de debate com a coletividade, que é a maior acionista da companhia de água e esgoto (o Estado é majoritário na composição da empresa, e não é outro, senão o cidadão, quem custeia a máquina governamental), a proposta foi enviada com pedido de urgência para a Assembleia Legislativa.


Estranha — ou melhor, “estranha” é modo de dizer, porque já se entende: é o tal governismo influindo — é a passividade de deputados e prefeitos diante das explicações formais dadas para vender a ideia e, quiçá em breve, a Sabesp. Entre elas, a de que tudo será mais eficaz e que contratos de longo prazo com as prefeituras serão respeitados.


Dia desses, surgiu a informação de que o Estado planeja um fundo para garantir tarifas menores, injetando verba pública para segurar o preço. Ora, se a tarifa já custa o que custa sem necessidade de aporte financeiro do Governo, que tem lucros bilionários com a Sabesp, a troco de que perder receita constante e saldos positivos de caixa todo ano?


No caso das travessias marítimas, parece que o Estado vem acordando para a crueldade que é impor o castigo de levar mais de uma hora de Santos para Guarujá, quase todo dia e nos horários de pico, a fim de cruzar um trecho oceânico de 400 metros.


Esse despertar atende pelo quase centenário sonho da ponte Santos-Guarujá, que na terça-feira levou o governador Tarcísio de Freitas a Brasília para conversar com seu colega de partido Silvio Costa Filho, ministro de Portos e Aeroportos, ambos do Republicanos.


Parece o mundo correto: o governador fala com um ministro cujo Governo é o de um adversário político, mas não, inimigo nos temas em comum. E, saindo dos círculos da politicagem, nem mesmo o eleitor que se considera mais extremista, esteja ele em qual das pontas for, torce para o plano do túnel dar errado só porque é preciso que dois eventuais antagonistas conversem.


Mas, se nada saiu nem quando os astros estiveram alinhados (isto é, todos eram do mesmo grupo em diferentes esferas de gestão), o jeito é ficar em cima deles.


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