Depois de um longo período de ostracismo, muito em razão de sua arrogância e prepotência, além da insistência em ser muito mais do que apenas um treinador, Vanderlei Luxemburgo conseguiu voltar a trabalhar em um time de tradição, o Vasco, no Rio de Janeiro. Foram mais de dois anos sem proposta de um grande clube, numa clara rejeição aos seus métodos e, principalmente, soberba.
O Vasco, em situação crítica, dentro e fora do campo, sob ameaça de rebaixamento, praticamente o ressuscitou para o futebol. Pode ser o canto do cisne em termos de trabalho no esporte. É sabido que, segundo crença antiga, o cisne-branco é completamente mudo durante toda a sua vida, mas pode cantar uma bela e triste canção antes de sua morte (obviamente, o foco aqui é a carreira).
Nessa segunda, ao que parece muito mais na base da amizade, Luxemburgo foi ao Programa Bem, Amigos, do SporTV. A expectativa era rever um treinador diferente, mais humilde e controlado. Diz o velho adágio, porém, que o lobo perde o pelo, mas não perde o vício (ou a pose, como se diz popularmente).
Em meio ao debate sobre as performances dos times e seus respectivos treinadores, Luxemburgo, é verdade, até reconheceu o bom trabalho realizado pelo técnico Jorge Sampaoli no Santos. Na sequência, porém, recusou que o argentino esteja também transmitindo ensinamentos aos brasileiros.
Admitiu que a vinda de estrangeiros para comandar clubes brasileiros “é legal”, mas nada além. Complementou que houve uma grande mudança no futebol brasileiro, privilegiando a tática em detrimento da essência e da história que sempre caracterizaram o esporte no país.
E mais: que Sampaoli tem a seu favor o DNA ofensivo do Santos, facilitando a aplicação de seus métodos e filosofia de trabalho. Em síntese, tergiversou e, mais uma vez, mostrou que não aprendeu as recentes lições que o futebol e os clubes lhe impuseram.
Vários foram os técnicos que passaram pelo Santos nos últimos anos, entre eles o próprio Luxemburgo, e nenhum conseguiu fazer o time praticar o futebol atual. Os poucos períodos de grande sucesso foram mais uma consequência de safras ou craques que vieram da base, como Robinho e Diego, Ganso e Neymar e outros que reviveram os grandes momentos do clube.
O trabalho de Jorge Sampaoli, porém, é muito diferente, vai além da presença de um ou dois jogadores de grande talento. O time hoje, a rigor, não tem um craque ou estrela diferente. É, sim, consequência de filosofia de trabalho e de um sistema tático que exige intensidade, aplicação, doação e sentido coletivo. E a meta é sempre o gol.
Salvo equívoco, na grande apresentação que derrubou o Goiás e seu treinador, apenas o goleiro Éverson não chutou a gol. E, segundo consta, além de suas habilidades defensivas, cobra muito bem falta nas proximidades da área. Parece, contudo, que não tem autorização do treinador para tal ação ofensiva.
Juca Kfouri, jornalista e reconhecidamente corintiano fanático, disse nessa segunda, durante um programa esportivo, que torce para o Santos ser o campeão brasileiro, pelo futebol que pratica desde a chegada de Sampaoli. Foi, é claro, alvo de piadas e ironias de seus colegas de bancada, a maioria duvidando de sua sinceridade, mas quem o acompanha sabe que por várias vezes afirmou que o clube da Vila Belmiro é o único que efetivamente dá prazer em ver jogar.
Não tem nada de burocrático, de óbvio ou excessivo apego à defesa. Pelo contrário, durante os 90 minutos só visa o gol. Sem dúvida, por isso é que o time é líder isolado e contabiliza uma série de sete vitórias consecutivas.
Assim, queira ou não Vanderlei Luxemburgo, Jorge Sampaoli está, sim, transmitindo ensinamentos ao futebol brasileiro. Ou, no mínimo, indicando “o caminho das pedras”.