Viabilidade para quem, cara-pálida?

Ele é engenheiro civil e mestre em Engenharia de Transportes pelo Instituto Militar de Engenharia

Por: Luis Claudio Santana Montenegro  -  23/05/23  -  06:27
  Foto: Ilustração: Max

Começo nossa reflexão com dois conceitos fundamentais: (i) não há escassez de áreas para empreendimentos portuários no Brasil; e (ii) o serviço portuário é de natureza totalmente privada há mais de 30 anos.


Quanto ao primeiro conceito, saibam que mais de 56% das áreas dos 37 portos públicos brasileiros estão desocupadas. Em alguns portos, esse percentual chega a assustadores 90%. Mas, mesmo que não houvesse, ainda seria possível desapropriar novas áreas para garantir a nossa capacidade portuária. Enquanto há muita área disponível, nosso país gasta cerca de R$ 48 bilhões por ano com filas de caminhões e navios nos portos, justamente por falta de capacidade operacional.


Tamanho contrassenso é causado única e exclusivamente por burocracia, já que uma cessão de área em um porto público – o chamado arrendamento portuário – leva de três a cinco anos para ser formalizada. Mais preocupante é que a ocupação de 70% dessas áreas vazias renderia aos cofres públicos, a preços médios pagos pelas áreas atualmente ocupadas, cerca de R$ 3,12 bilhões por ano, o que significa mais de dez vezes o orçamento público de investimentos em portos nos últimos anos.


Um dos documentos burocráticos mais famosos quando se fala de arrendamentos portuários no Brasil é o chamado Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental, o famigerado EVTEA. Mas pergunto: para que o Estado quer saber se um empreendimento será viável? Arrendamentos portuários são cessões de áreas exclusivas a operadores privados que ali queiram investir, dando-lhes garantias para seus investimentos nas operações de carga e descarga de navios, trens, caminhões e dutos.


A exigência de um EVTEA é prerrogativa legal para processos de privatizações de empresas, concessões e permissões de serviço público, contratações das parcerias público-privadas (PPP) ou outorgas de atividades econômicas reservadas ou monopolizadas pelo Estado. Arrendamentos de áreas em portos não se encaixam em nenhum desses casos.


De fato, um EVTEA pode servir para avaliar o preço da cessão de uma área pública para um operador privado. Sendo assim, uma solução muito mais racional e dinâmica seria que os Planos de Desenvolvimento e Zoneamento Portuários (PDZPs) pudessem avaliar previamente o preço de mercado das áreas disponíveis em cada porto por métodos conhecidos do setor imobiliário.


Uma outra possibilidade é de que o Estado queira receber parte da rentabilidade de cada negócio de operação portuária a ser implantado em seus portos. Legítimo, mas discutível, pois a estrutura de um condomínio portuário deveria ser administrado a custo, e não a lucros, pois a atividade portuária não tem um fim em si mesmo para o Estado, mas tão somente o de servir como ferramenta de competitividade para ampliar o comércio, principalmente o que realizamos com o mundo. Ainda assim, seria também possível entender previamente o preço das diversas oportunidades em cada porto e disponibilizá-los de forma transparente à sociedade.


Alguém pode alegar que os principais portos do mundo tratam cada nova instalação portuária como um business case. É verdade, mas isso ocorre porque os investimentos públicos de ampliação da infraestrutura desses portos só são feitos se houver contratos prévios que lhes deem sustentação. Nesse caso, é totalmente compreensível que se queira saber a viabilidade dos investimentos públicos. A proposta que trago é a de extinguir imediatamente a exigência do EVTEA, ocupar todas as áreas vazias nos nossos portos e ampliar as áreas quando houver necessidade. Mais argumentos, além das questões de como operacionalizar e como fiscalizar esse novo modelo ficam para nossa próxima coluna!


Tudo sobre:
Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
Ver mais deste colunista
Logo A Tribuna
Newsletter