Realidade e ficção

Pets têm papel terapêutico na relação afetiva com as famílias, mas é preciso reconhecer que há limites

Por: Redação  -  21/10/21  -  08:50
 Pets na praia: Você é a favor ou contra?
Pets na praia: Você é a favor ou contra?   Foto: Alexsander Ferraz/AT

Se fosse possível colocar em uma balança os prós e contras do debate que envolve a presença de cães na areia e na água das praias, faltariam pratos para suportar todos os argumentos contrários, que vão da questão sanitária à segurança. Mas não foi assim que a Câmara de Santos interpretou a questão, e aprovou, na sessão de terça-feira, quase que por unanimidade, projeto de lei que circula há dois anos pelos gabinetes do Legislativo. Agora, segue para sanção do Executivo.


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Pelo texto aprovado em segunda discussão, as regras serão definidas pela Prefeitura, que delimitará o espaço e o horário permitidos para a circulação dos cães. Nesse perímetro, também os chuveiros poderão ser utilizados pelos pets. O texto fixa como obrigatório o uso de coleiras, assim como devem estar vermifugados, com atestado assinado por um médico veterinário. Por fim, prevê multa para quem não recolher as fezes de seus animais e determina que a Prefeitura realize, mensalmente, coleta e análise da areia dessa área.


Ora, um texto de Primeiro Mundo para uma cidade onde regras semelhantes já existem e não são cumpridas, sequer fiscalizadas por falta de efetivo ou de boa vontade. Não recolher as fezes dos animais já é passível de multa. Além disso, quantos homens da Guarda Municipal ficarão nessa área, no horário determinado, checando se todos os proprietários estão de posse de documentos e atestados médicos de seus pets? Se não existe efetivo sequer para evitar vandalismos e coibir abusos cidade afora, haverá para a área canina?


Na balança também devem ser colocados os argumentos sanitários, que não dizem respeito apenas às pessoas que circulam pela areia e podem ser contaminadas com microorganismos presentes em fezes e urina, mas também aos próprios animais, sujeitos a dermatites e outras doenças de pele. As questões sanitárias se estendem da areia para o mar, já que o projeto de lei abre a possibilidade de banhos na área delimitada.


Por fim, no pacote das adversidades há ainda os aspectos de segurança. Na ausência de guardas, quem fiscalizará se os animais são de pequeno porte? Quem exigirá a colocação de coleiras? Quem evitará ataques de animais soltos e ferozes? Se acontecerem, de quem será a responsabilidade pelos prejuízos a pessoas e animais menores? Formatar a lei apenas para acomodar situações que já ocorrem é legitimar o erro, é o mesmo que dizer: o que estava errado, agora está certo.


Todos concordam que animais de estimação têm relevância ímpar no convívio doméstico, especialmente nas famílias onde há crianças e idosos. Cães e gatos têm papel terapêutico, de equilíbrio emocional e promoção da qualidade de vida, e a sociedade já avançou bastante na compreensão dessas relações, mas é preciso reconhecer que há limites, cuja transgressão invade o campo da insensatez. Antes de se aprovar medida como essa, é preciso garantir que todos os suportes para que funcione estejam plenos. Não parece ser esse o caso.


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