As análises do impacto econômico da pandemia no País se concentram no fechamento de empresas devido aos vários lockdowns. Entretanto, economistas apontam outras cicatrizes que podem atravessar os próximos anos, o que exige ações do gestor público e da sociedade para atenuá-las. Os principais pontos de influência são o nível de poupança, desigualdade-desemprego, endividamento, ensino e reglobalização, segundo reportagem de ontem do jornal Valor.
O pior desses legados é o da desigualdade com desemprego da baixa renda. Conforme a FGV Social, a renda individual média está 9,4% inferior à de 2019, mas 21,5% menor se considerados apenas os 50% mais pobres do País. O alerta é de que a falta de trabalho em níveis elevados pode deixar de ser temporária e durar alguns anos. Como a recontratação ocorre com rendimentos reduzidos, a massa salarial encolhida desestimularia o consumo, lembrando que essa conta e não a dos investimentos é que move a economia brasileira. Assim, a redução do custo da mão de obra e programas trabalhistas são ferramentas que o governo deverá mirar de forma estratégica.
Como consequência do empobrecimento, 74% das famílias estão endividadas, frente 65% no ano passado, segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC). São pessoas que tomam crédito para pagar no fim do mês despesas básicas, como luz, transporte e alimentação. Mas entre as famílias, 25,5% atrasam o pagamento ou estão inadimplentes. Portanto, é fundamental estimular a geração de emprego. Para resultados objetivos, faltam mais renegociações para evitar o calote em série.
Já a formação de poupança na pandemia, sustentada pela redução dos gastos de lazer e alimentação fora de casa, pode se dividir entre os recursos que serão canalizados para o consumo ou a precaução, quando se guarda dinheiro por medo. A incerteza tem fundo psicológico, mas uma retomada mais firme pode trazer a confiança de volta.
Segundo especialistas, as perspectivas são ruins para a educação, pois o afastamento das salas de aula terá efeito econômico – o reflexo será um salário mais baixo daqui alguns anos devido ao aprendizado prejudicado. O economista Marcelo Neri, do FGV Social, explicou ao Valor que adolescentes estão acostumados à internet e se adaptaram melhor ao ensino remoto. Já as crianças não – elas dependem mais de um tutor.
Outro efeito da pandemia é a reversão da globalização, com economias ricas tentando recriar cadeias industriais em seu território para não dependerem da China. É mais provável um meio termo, com países alternativos suprindo esses mercados ao invés de apenas o gigante asiático. O Brasil poderia até aproveitar essa tendência, mas Vietnã e Tailândia têm vantagens, como o baixo custo. O Brasil precisa reduzir seus custos, centrar na qualidade da educação e gerar empregos para os mais pobres.