Liberdade de expressão na web tem mesmo limite que no mundo offline, alertam especialistas

Usuário corre risco de se tornar alvo de processo se não tiver cautela com o que escreve

Por: Daniel Rodrigues*  -  21/12/21  -  14:42
A Internet acaba encorajando a disseminação de postagens ofensivas, por favorecer o anonimato e a falsidade ideológica
A Internet acaba encorajando a disseminação de postagens ofensivas, por favorecer o anonimato e a falsidade ideológica   Foto: Unsplash

Quem faz publicações na internet mencionando o nome de uma pessoa ou empresa deve ficar atento. Dependendo da gravidade do que for postado, o autor pode se tornar alvo de processo. A advogada Lorrana Gomes afirma que, no ambiente on-line, a liberdade de expressão de uma pessoa termina onde começa o direito do outro de não ser difamado ou injuriado.


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“As pessoas devem se comportar na internet exatamente com a mesma cautela com que se comportam offline. Quase todos os crimes ou condutas puníveis offline podem ser punidas também on-line”.


O especialista em Direito Digital Mateus Catalani Pirani concorda e afirma que a liberdade de expressão é o direito constitucional que todos têm de dizer o que desejam falar, só que na forma da lei.


“Nesses moldes, a opinião é livre e vedada ao anonimato, porque é necessário sustentar o que se diz. Na hipótese de infringir a lei, haverá respostas legais, com base em calúnia, injúria e difamação”.


Catalani explica que as pessoas precisam se conscientizar de que a liberdade de expressão inclui o fato de que elas, cedo ou tarde, vão ouvir coisas que não gostam. “Precisamos entender que, juridicamente falando, as opiniões podem ser diversas, mas a liberdade de expressão tem seus limites”.


Defender ou encorajar práticas criminosas é um discurso que não pode ser tolerado, mas ao exercer essa intolerância, deve-se ter cautela para não ser igualmente ofensivo, alerta o advogado.


Por sua vez, Lorrana lembra que narrar um fato que aconteceu não é crime, tampouco punível civilmente, desde que seja verdade e exposto de maneira respeitosa. Ela lembra que a difamação e a injúria caminham juntas, “já que são crimes muito similares”.


Ofensas
A advogada explica que, por se tratar de crime contra a honra, somente a vítima é capaz de dizer se ficou ofendida e decidir se pretende instaurar um processo. Como medida de cautela nas plataformas digitais, os comentários e as avaliações devem conter o mínimo de dados pessoais possíveis e estar sempre de acordo com a verdade, obedecendo a Lei Geral de Proteção de Dados


Para Catalani, a internet acaba encorajando esse cenário, por favorecer o anonimato e a falsidade ideológica, mas faz uma ressalva. Existem inúmeros mecanismos para se identificar os autores de ofensas no meio digital.


“Cada vez mais as plataformas usam tecnologias como inteligência artificial para fazer valer seus termos de uso contra o discurso de ódio e a difamação. O que não significa censura. Não podemos ver como liberdade de expressão o discurso que sustenta racismo, homofobia, pedofilia, misoginia, violência ou ódio”


Adjetivação
As postagens feitas nas redes sociais podem se tornar um crime de difamação quando se passa a adjetivar uma opinião, afirma o advogado José Roberto Chiarella. “Não é um comentário simples de um determinado assunto. Através de uma adjetivação, eu passo a imputar um fato ofensivo à reputação de alguém”. Ele ressalta que isso pode ocorrer, inclusive, por meio de fotos.


Chiarella enfatiza que uma pessoa e uma empresa podem ser criticadas, desde que não seja de modo adjetivado. “Eu posso me manifestar de forma diferente, e isso não gera intolerância de outra parte. Gera pensamentos divergentes e isso é um ponto maior na democracia. O que não pode, na verdade, é você imputar a alguém um ilícito penal, no caso a difamação”.


Também opinando como advogado de empresas, Catalani destaca que as pessoas jurídicas possuem identidade moral, e ofensas a essa moral podem ser contestadas judicialmente. Ele diz ter conhecimento de vários casos envolvendo uso indevido de imagem e nome de terceiro para propagar fake news ou praticar estelionato; além de difamação em ambiente digital, fazendo o uso de redes sociais para ofender alguém, expor conteúdos íntimos ou quebra de privacidade.


Reflexões
Catalani entende que toda crítica é bem-vinda e o senso crítico deve ser encorajado. Para ele, o pensamento divergente não torna a pessoa uma inimiga, do mesmo modo que quem tem a mesma opinião também não é amiga.

“Criticar, construtivamente, produtos e serviços é aquilo que fará o controle de qualidade dos fornecedores. Ainda que se pretenda fazer uma crítica enérgica, ela não poderá ultrapassar o limite da legalidade e se tornar uma ofensa”.


À Reportagem, Chiarella conta que já enfrentou casos assim. “Um prestador de serviços na área da saúde teve o resultado insatisfatório e resolveu ir num atendimento nas redes sociais, difamando a figura do profissional e da clínica dele. Como era na área da saúde, o profissional foi em busca de ressarcimento de natureza moral e pediu ainda uma retratação pública”. Nesse caso, a vítima foi indenizada.


Em outra situação, fotos tiradas num contexto familiar foram divulgadas em um site de relacionamento de conteúdo adulto. “Conseguimos a identificação e, pela URL, buscar a autoria”.


*Reportagem feita como parte do projeto Laboratório de Notícias A Tribuna-UniSantos sob supervisão do professor Eduardo Cavalcanti e do diretor de Conteúdo do Grupo Tribuna, Alexandre Lopes.


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