Deputados da Baixada Santista divergem sobre mudanças na Lei de Improbidade Administrativa

Mudança aprovada na Câmara dos Deputados provocou intensa discussão entre os gestores públicos, MP e demais políticos

Por: Sandro Thadeu  -  20/06/21  -  14:29
 Deputados da Baixada Santista divergem sobre mudanças aprovadas
Deputados da Baixada Santista divergem sobre mudanças aprovadas   Foto: Arquivo AT

As mudanças aprovadas na Lei de Improbidade Administrativa (8.429/1992) pela Câmara dos Deputados, na última semana, têm provocado um intenso debate entre os gestores públicos, integrantes do Ministério Público (MP) e representantes da política.


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O substituto do Projeto de Legislação 10887/2018, que trata dessas modificações, elaborado pelo deputado federal Carlos Zarattini (PT), recebeu o aval da maioria da Casa (408 votos favoráveis, 67 contrários e 1 abstenção). Agora, o texto segue para o Senado.


De um lado, os promotores de Justiça apontam que as alterações representam um retrocesso no combate à corrupção. Do outro, quem atua ou esteve em cargos públicos entende que essa atualização era necessária para não se cometer injustiças.


 O substituto do Projeto de Legislação 10887/2018, que trata das modificações, recebeu votos favoráveis de 408 deputados; 67 foram contra
O substituto do Projeto de Legislação 10887/2018, que trata das modificações, recebeu votos favoráveis de 408 deputados; 67 foram contra   Foto: Divulgação/Câmara dos Deputados

A principal mudança é a punição somente a agentes públicos que agirem com dolo, ou seja, com a intenção de lesar o poder público.


O prazo máximo para as penas de perda dos direitos políticos em caso de enriquecimento ilícito foi ampliado (de até dez para até 14 anos) e de prejuízo ao erário (de até oito para até 12 anos). Porém, a previsão de pena mínima foi retirada.


A matéria prevê ainda a prescrição de oito anos para a propositura de ação por improbidade, contas a partir da data de ocorrência do fato.


O ex-prefeito de Bertioga e secretário do Conselho Deliberativo da Associação Paulista de Municípios (APM), Mauro Orlandini (PSL), disse que já estava mais do que na hora de alterar a legislação.


“Erros administrativos são muito diferentes de erros dolosos. Conhecemos muitas histórias neste universo da gestão pública. É necessário que sejam defendidos os defensáveis e punidos os verdadeiramente desonestos e mal intencionados”, ressaltou.


Na avaliação do ex-chefe do Executivo, essas mudanças, caso confirmadas no Senado, serão positivas, pois muitas pessoas bem intencionadas e capazes ficam com receio de participar da política, em especial nos municípios, e poderão ter mais tranquilidade ao atuar no poder público.


Zarattini explicou que, em 2018, um grupo de juristas coordenado pelo ministro Mauro Campbell, do Superior Tribunal de Justiça, fez um anteprojeto para atualizar essa legislação. Na avaliação dele, o MP precisará trabalhar mais.


“A lei aumentou as penas e o rigor. As pessoas que cometerem algum ato de enriquecimento ilícito, dano ao patrimônio, promoção pessoal e nepotismo serão devidamente processadas. O Ministério Público terá se esforçar mais para fazer a investigação mais rapidamente”, explicou.


O petista citou que o projeto de lei estabelece o prazo de seis meses para a duração de uma investigação, prorrogado por igual período. Após esse período, o promotor terá 30 dias para propor a ação.


Professor de Direito Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Márcio Cammarosano entende que esse tempo para apuração é adequado.


“O MP instaura um inquérito civil e diz que está investigando alguém por improbidade, senta em cima e passa anos sem propor a ação. Em rigor, o promotor, diante de um suposto ato de improbidade administrativa, precisa correr com a apuração dos fatos minimamente necessários para entrar com a ação”, explicou.


Segundo o jurista, basta que o MP tenha a prova do fato e indícios de quem é o responsável para propor uma ação. “Provar cabalmente a ocorrência de improbidade administrativa se dá no curso do processo, que geralmente leva três, quatro, dez, 15 anos. Há ações propostas que só são julgadas definitivamente depois de 15 anos”, explicou.


Equívocos de sobra


O procurador de Justiça e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Roberto Livianu, entende ser um equívoco limitar o tempo para concluir um inquérito, independente do grau de complexidade do caso.


Segundo ele, é um erro estabelecer o tempo de prescrição para propor ações a fim de reparar danos ao patrimônio público. “Vejo uma manobra muito bem orquestrada de que se trata de uma modernização da lei. Houve um retrocesso histórico no combate à corrupção e vamos pagar um preço histórico em relação a isso”, desabafou.


Integrante da promotoria de Patrimônio Público e Social de Santos, Carlos Alberto Carmello Júnior entende que a proposta aprovada traz questões graves, como a conduta de quem tenta causar dano ao erário e não consegue, que ficará fora do alcance da lei.


“Atualmente, esta prática seria penalizada, porque atenta contra os princípios da legalidade e moralidade, constitucionalmente estabelecidos. Considero a mudança na lei uma agressão à sociedade e que vai na contramão de leis que nasceram do anseio popular, como a da Ficha Limpa”, justificou.


Deputados da Baixada Santista divergem sobre proposta


Os deputados federais da Baixada Santista tiveram posições divergentes na votação sobre o projeto de lei que prevê alterações na Lei de Improbidade Administrativa.


Júnior Bozzella (PSL) foi um dos 67 parlamentares contrários à propositura. Na avaliação dele, o afrouxamento da legislação é uma “depravação, devassa à lei e libera o vale tudo”.


“Trata-se de uma medida indecente, porque dá carta branca para que corruptos façam o que quiserem sem serem punidos”, destacou.


Na avaliação dele, o Governo Bolsonaro ficará conhecido como aquele que “institucionalizou a corrupção com a ajuda dos aliados”.


Favorável à alteração da legislação, Rosana Valle (PSB) disse que conversou com muitos prefeitos e secretários antes de se posicionar. Nessas conversas, ela ouviu diversos exemplos de processos de improbidade que foram motivados por erros burocráticos e administrativos praticados sem qualquer intenção de fraude.


“As mudanças são necessárias para evitar que profissionais bem intencionados deixem de se candidatar e participar da vida pública por conta de mecanismos que travam e punem injustamente, enquanto os malfeitores continuam praticando atos ilícitos e sempre conseguem se safar”, justificou.


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