Uma vacina de spray nasal que está sendo desenvolvida pela Universidade de São Paulo (USP) deve se tornar mais uma aliada na luta contra a disseminação da covid-19. Diferente dos imunizantes atuais, que são injetados no braço, a vacina em spray tem como objetivo bloquear a passagem do vírus pelas mucosas do nariz.
Os estudos são conduzidos pelo Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (InCor), ligado ao Hospital das Clínicas da universidade. A pesquisa também conta com parceria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Ela começou em março de 2020, no início da pandemia, e o imunizante já passou por testes laboratoriais e em animais.
O chefe do Laboratório de Bioquímica do InCor, Edécio Cunha Neto, explica que o objetivo da vacina em spray é justamente impedir a propagação do vírus pelo corpo e a transmissão para outras pessoas.
"O principal objetivo dessa vacina nasal é gerar uma resposta imune na cavidade oronasal, que bloqueie o vírus no local de entrada, podendo evitar a transmissão da doença para outras pessoas. Essa é uma propriedade que as vacinas injetáveis não têm. Elas não protegem você de pegar a infecção, mas sim causam uma proteção contra casos graves da doença", explica Neto, em entrevista para A Tribuna.
Uma das diferenças do imunizante em spray para as vacinas já aplicadas é o tipo de anticorpo produzido. O spray nasal estimula o anticorpo IgA, típico das mucosas do nariz. Já os imunizantes injetáveis tendem a produzir o anticorpo IgG, visando a proteção do corpo contra casos graves da doença.
"A vacina que a gente toma (atualmente) protege contra a doença, mas muitas vezes o indivíduo pode infectar o nariz e transmitir o vírus. Nossa vacina de mucosa (spray nasal) vai justamente impedir que o vírus se estabeleça na mucosa, ou seja, eliminar o vírus antes que ele infecte", ressalta o médico Jorge Kalil, chefe do estudo, em entrevista para a TV Tribuna.
Aplicação
Edécio Neto destaca que ainda está em estudo a dosagem da vacina. Ele ressalta que, assim como os imunizantes injetáveis, pode ser necessário que o spray nasal seja aplicado em um determinado intervalo de tempo.
"É possível que essa vacina tenha que ser reaplicada periodicamente. A imunidade contra vírus respiratórios é incompleta e tem uma durabilidade limitada. Você sabe que acaba tendo reinfecções", comenta.
Previsão de uso
Segundo Kalil, ainda não há um prazo concreto para que a vacina esteja pronta, pois a produção industrial do imunizante terá que começar no exterior. Já os testes clínicos (em humanos) podem ocorrer entre seis meses e um ano.
"Estamos trabalhando para o desenvolvimento industrial, que é transformar o protótipo do laboratório em produto. Ao vencer esse gargalo, teremos os testes clínicos. Não consigo precisar um prazo, porque a indústria brasileira não tem a experiência de fazer isso. Vou ter que fazer isso lá fora pra depois trazer a vacina pra ser produzida aqui", ressaltou.
Expectativas
A infectologista Elisabeth Dotti avalia o spray nasal como uma saída positiva, destacando que ele pode simplificar a imunização e diminuir os custos.
"Tem mais umas seis ou sete vacinas em estudo (no mundo) para fazer essa parte inalatória. Eu acho perfeito. Vai evitar agulha, seringa, álcool. É um corte de gasto absurdo, e você corta a mão humana na história. O nariz é uma forma muito boa de absorção. É bem mais ágil, fácil, barato e tranquilo", disse para A Tribuna.
Já o médico Ricardo Hayden enaltece a flexibilidade que a vacinação por spray nasal pode gerar para a população.
"Você pode colocar as pessoas em uma fila pra entrar em um hospital, uma estação de metrô, uma escola, e fazer com que essas pessoas sejam vacinadas, desde que de forma organizada. É uma forma prática de você atingir as pessoas e dar um reforço de defesa (ao organismo)", afirma.