Projeto dá apoio emocional gratuito a educadores de escola pública

Na pandemia, sobram desafios e frustrações aos profissionais

Por: Tatiane Calixto  -  25/04/21  -  20:22
  Movimento Quero na Escola e a Fundação SM vão focar o projeto este ano no desafio da reabertura presencial das escolas em plena pandemia; ideia é oferecer escuta para angústias dos docentes em sala de aula
Movimento Quero na Escola e a Fundação SM vão focar o projeto este ano no desafio da reabertura presencial das escolas em plena pandemia; ideia é oferecer escuta para angústias dos docentes em sala de aula   Foto: Foto: Vanessa Rodrigues/AT

O professor teve que adaptar horários conforme a realidade que foi imposta em cada casa pela pandemia. Tenta dar jeito na frustração de ver a participação de muitos alunos minguar com o ensino remoto ou o risco de evasão aumentar com o passar dos meses sob o efeito da covid-19. Na pandemia, sobram desafios e falta tempo para colocar em ordem o que o coronavírus bagunçou. Cada vez mais uma pergunta se torna necessária: como está a saúde mental dos docentes?


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Pensando nisso, o movimento Quero na Escola e a Fundação SM relançam o projeto Apoio Emocional, que busca profissionais de saúde mental para atendimento gratuito a educadores de escolas públicas no Brasil. A primeira edição atendeu 2 mil professores no ano passado, inclusive na Baixada Santista. Agora, focará nos traumas causados pelo prolongamento da pandemia e em como lidar com os próprios lutos e os dos estudantes.


“Este ano, com o desafio da reabertura presencial das escolas em plena pandemia, acreditamos que a escuta das angústias e o acolhimento são fundamentais para dar o suporte emocional que os educadores necessitam”, afirma Mariana Franco, gerente da Fundação SM.


Para tanto, o projeto oferece aos professores as opções de escuta individual, rodas de conversa entre colegas ou com seus alunos e formação sobre como lidar com determinados problemas emocionais. Todos os atendimentos são virtuais.


“O trabalho do professor, embora cercado por alunos, é um pouco solitário. Porque na sala, frente a qualquer problema, a gente tem que agir de forma rápida e, muitas vezes, não há tempo para dividir com ninguém. E isso piorou no ensino remoto para o qual, aliás, não estávamos preparados”, afirma Marcel Messias Gonçalves, 38 anos, professor da rede pública da Baixada Santista.


Ele conta que, como professor de Matemática, sempre utilizou muito a lousa. Agora, teve que se reinventar completamente. E no começo não estava obtendo o retorno que esperava dos estudantes.


“Embora quisesse, também não tinha conhecimento de como abordá-los em relação à questão emocional diante do momento difícil que estamos vivendo e que eu sabia que estava influenciando”.


Foi então que Marcel se deparou com uma reportagem sobre o setembro amarelo que citava o projeto Apoio Emocional e foi em busca de ajuda.


“Para mim, foi uma oportunidade de falar. Com a pandemia, perdemos a sala dos professores, local onde dividíamos angústias e situações. Então, falar com a psicóloga e assumir que estava difícil lidar com a situação foi muito importante”, conta o professor.


Além disso, Marcel confessa que ensinar Matemática on-line é difícil e, apesar dos esforços, nem sempre a participação dos alunos é grande. “A gente faz vídeo para 120, só 13 assistem. E a gente fica frustrado por não ter o retorno que espera. Embora a gente saiba que eles também estão em uma situação nada cômoda”.


Marcel admite que tinha dificuldades de pedir ajuda em momentos difíceis. Mas, agora, percebeu que a saúde mental precisa de mais atenção. “Depois dessa experiência, eu mesmo passei a prestar mais atenção nisso”.


Para os alunos


O projeto também oferece ferramentas para que o docente aborde questões emocionais com os estudantes.


“Eu dou aula para estudantes do 9º ano que além de enfrentar o cenário de pandemia, também lidam com a ansiedade de mudança de nível, do fundamental para o Médio. Então, mesmo nas aulas de Matemática que são mais diretas, conseguimos trabalhar o que chamamos de mural do acolhimento”, detalha Marcel que foi orientado sobre a prática no projeto.


Durante a atividade, os jovens deixam registradas palavras de apoio a um amigo. “Eles gostaram bastante e até pediram para repetirmos nas aulas presenciais”.


Do medo da morte, à preocupação com os alunos


A psicóloga Lia Gonsales foi voluntária do projeto. Ela conta que são várias as angústias trazidas pelos professores, mas entre as principais, além da própria covid-19 e o medo da morte, estão as situações que envolvem os estudantes, principalmente os mais vulneráveis.


“Destaco a preocupação deles com os alunos sem acesso à internet, material ou comida. As questões sociais dos alunos sempre é um ponto importante para os professores”, revela a profissional.


Lia conta que fica claro nas conversas que os professores sentem muito a falta da sala de aula, da presença na escola e do contato com os estudantes e que isso influencia o dia a dia neste novo modelo de ensino.


“Os professores estão na linha de frente cuidando de uma riqueza que são as crianças em processo de aprendizagem e desenvolvimento. É preciso olhar hoje, após um ano de pandemia, para saúde mental destes profissionais. Eles estão exaustos de não serem valorizados e preservados e ao mesmo tempo ansiosos por conseguirem fazer o quase impossível que é educar, ensinar em tempos tão complexos”.


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