Polêmica, nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental gera críticas e temores

Há consenso sobre rever a lei de licenciamento ambiental, mas texto aprovado recebe críticas de vários setores

Por: Arminda Augusto  -  30/05/21  -  20:27
  Não faltam críticas e temores em relação à nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, aprovada há duas semanas pela Câmara dos Deputados
Não faltam críticas e temores em relação à nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, aprovada há duas semanas pela Câmara dos Deputados   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

Insegurança jurídica e econômica, guerra fiscal e ambiental entre estados e municípios, adoção de critérios subjetivos para liberação de obras, desidratação dos órgãos de fiscalização ambiental. Não faltam críticas e temores em relação à nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, aprovada há duas semanas pela Câmara dos Deputados. O texto está agora no Senado e, se aprovado, segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).


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As mudanças estão em discussão no Congresso Nacional há 17 anos, mas, segundo organizações ambientais, especialistas e estudiosos ouvidos por A Tribuna, o texto apresentado pelo deputado e vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), Neri Geller, não foi discutido previamente e coloca em risco a política ambiental no País.


O novo projeto flexibiliza a lei de licenciamento ambiental, simplifica alguns processos e cria uma modalidade de autodeclaração. A lei também dispensa de licenciamento algumas obras.


Se já tivesse entrado em vigor, empreendimentos como a barragem de Brumadinho (MG) poderiam ter sinal verde para funcionar com uma simples autode-claração de cumprimento das normas ambientais.


Pelo novo texto, empreendimentos de baixo e médio risco não precisam de análise prévia. O aval será emitido apenas com o preenchimento de requerimento em que declaram seguir os parâmetros de segurança ambiental.


A duplicação da Rodovia dos Tamoios, no Interior Paulista, por exemplo, também não precisaria de estudo e relatório de impacto ambiental, porque a via já opera com aval.


Subjetivo


“Empreendimentos de ‘porte insignificante’ serão eximidos de licenciamento. Mas quem define o que é ‘porte insignificante’? Segundo o projeto, cada estado e cada município. Se Minas Gerais decretar que barragens de rejeitos têm porte insignificante, nenhuma delas precisará mais de licença por lá”, critica Fábio Feldman, ex-deputado federal e ex-secretário estadual de Meio Ambiente.


“A lei aprovada perde os principais instrumentos de inovação do licenciamento ambiental, contidos nas últimas versões do projeto. O licenciamento trata do nosso direito a um ambiente saudável para as atuais e futuras gerações”, diz Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.


Sem sintonia


“Esperamos que o Senado traga à tona o compromisso constitucional do Estado em garantir um ambiente equilibrado para todos os brasileiros e inserindo novamente o Brasil nas agendas ambientais em coerência com as conquistas e compromissos assumidos com as agendas nacionais e internacionais, inclusive em cumprimento ao Acordo de Paris sobre Mudanças do Clima e aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, diz Sidnei Aranha, secretário de Meio Ambiente de Guarujá.


Marcio Paulo, secretário de Meio Ambiente de Santos, também lamenta a falta de debate sobre o tema, e a aprovação a toque de caixa da nova lei. “No momento em que se discute mais transparência, envolvimento e participação da sociedade, a Câmara aprova dessa forma um texto sobre o tema que estava parado há quase 20 anos”.


Razões da lentidão são outras, diz professor


Se o licenciamento ambiental hoje é lento, o motivo é o desmonte dos órgãos ambientais e a falta de estrutura das equipes, e não um problema de legislação. A opinião é do professor universitário Fernando Rei, ex-presidente da Cetesb, um crítico das mudanças aprovadas pela Câmara. Ele pondera que 20% dos processos de licenciamento, hoje, já são digitais e simplificados. “Em São Paulo, só cerca de 1.500 empresas precisam de acompanhamento, as demais são de baixo impacto, com processos ágeis e simples”.


Caro?


O professor também desqualifica a crítica de que licenciar é um processo caro, pois “representa menos de 1% do custo do investimento”. “O licenciamento conversa com desenvolvimento sustentável, porque a pauta econômica hoje passa pelo respeito às regras ambientais. É um ativo das empresas, hoje, cuidar do ambiente”.


Fernando Rei critica o que chama de “excesso de protagonismo” do Ministério Público (MP), quando judicializa processos que já estão licenciados pelos órgãos de controle, como a Cetesb. “O MP não tem nada a ver com estrutura de licenciamento. Aliás, seria bom que o MP entendesse que a quem compete licenciar é o órgão ambiental. Infelizmente, na Baixada, o MP é excessivamente ativo, busca um protagonismo que não tem. Na Baixada Santista, o MP é um problema”.


A favor


Em encontro virtual promovido na semana passada, o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, ressaltou a importância de se ter uma regulação única tratando do tema e que o desafio de todos é explicar os benefícios da legislação à sociedade e aos senadores. Nesse mesmo encontro, o deputado federal Neri Geller (PP-MT), relator do projeto de lei, destacou a importante aprovação na Câmara. “É um ganho para o Brasil e precisamos de ajuda para continuar a divulgar a importância desse projeto”.


O deputado disse que a nova lei vai garantir segurança jurídica ao empreendedor, mantendo a defesa ao meio ambiente, e contribuir de diversas maneiras, inclusive para o andamento de grandes obras de saneamento básico e aterro sanitário. No evento on-line, Nilson Sarti, presidente da Comissão de Meio Ambiente da CBIC, reforçou a importância da mobilização e da discussão do projeto de lei no Senado, que em sua opinião, está consistente e amadurecida. “É preciso avançar e rebater as falácias”, destacou. Para Sarti, a lei é importante para o setor da construção e para a sociedade, pois uniformiza, simplifica e oferece segurança jurídica ao unificar normativos já existentes.


MP prevê mais judicialização de processos


Para a promotora ambiental Flávia Gonçalves, a morosidade é fruto da falta de estrutura e de funcionários dos órgãos encarregados de licenciar e acompanhar os processos. “O Ibama, por exemplo, não tem concurso público desde 2013”. Segundo ela, “outro ponto que os empreendedores não gostam de ouvir é a qualidade dos projetos submetidos ao licenciamento, muitas vezes com apresentação de relatórios de impacto ambiental confeccionados por empresas através de um ‘copia e cola’”.


Da forma como foi aprovado, diz Flávia, o texto tem grande potencial de impactar a governança ambiental do País, gerando insegurança jurídica e sinalizando que “haverá grande judicialização em relação à qual determinados empreendimentos e atividades estarão sujeitos a paralisações, atrasos e questionamentos judiciais, com um aumento do risco-país”.


Deputados aprovam a lei


Junior Bozzella (PSL): “A aprovação da lei vai ao encontro da necessidade urgente de fazer as coisas andarem no nosso país. Burocracia não resolve os problemas ambientais que enfrentamos aqui hoje. Ao invés disso, traz retrocesso e faz com que patinemos em questões como saneamento básico. A nova lei desburocratiza as licenças e com isso garante mais acesso a todos”.


Rosana Valle (PSB): “Ao contrário do que estão querendo passar, a nova lei vai coibir as agressões ambientais, pois, do jeito que está, a demora e a burocracia estimulam o descumprimento da lei. Votei sim ao corpo do projeto porque entendo que era necessário atualizar a lei do licenciamento ambiental, mas votei contrariamente a pontos específicos, e fui voto vencido, mas agora a discussão recomeça no Senado”.


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