Em meio às denúncias de interferência por parte do Governo Federal, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) manteve sua tradição e o tema da redação foi de “extrema relevância”, na visão de professores ouvidos por A Tribuna. A primeira parte da prova foi realizada ontem, em todo o País. O tema da redação foi 'Invisibilidade e Registro Civil: Garantia de Acesso à Cidadania no Brasil'.
Além da redação, os candidatos responderam 90 questões de linguagens, códigos e suas tecnologias; e ciências humanas e suas tecnologias. No próximo domingo, serão 45 questões de ciências da natureza e 45 de matemática.
Complexo e relevante
Para Luci Rocha, professora de português e redação do Colégio Objetivo, o tema toca em uma questão de “extrema importância” para o Brasil. “As três expressões que compõem a frase temática, invisibilidade, registro civil e cidadania, nortearão a discussão”, diz ela.
Luci explica que o participante teve que discorrer sobre como a situação de invisibilidade (indivíduos sem documentos e crianças sem registro de nascimento) afeta as condições mínimas de parte da população, “pois esta perde o acesso às políticas públicas de assistência social (...), distanciando-se de direitos mínimos à cidadania”.
O educador Lucas Onofre afirmou que o tema é “preocupante”, principalmente para os alunos de escolas públicas. “Não tiveram uma educação de qualidade na pandemia e não terão facilidade alguma na produção textual, por ser um tema pouco abordado. Isso só comprova o quanto a educação ainda não é tão democrática como gostaríamos”, disse ele, que leciona na rede pública de Santos.
Para o diretor acadêmico da Escola Técnica Estadual (Etec) Ruth Cardoso, Lucas Magalhães, a própria fragilidade do IBGE, pela não atuação do Censo neste ano e no ano passado, por si só, já dificulta o acesso dos estudantes a dados básicos que poderiam servir de base para a dissertação.
Para Magalhães, apesar da temática aparentemente ‘neutra’, a discussão é complexa, especialmente para alunos da rede pública, “que, na maioria das vezes, apreendem sob um cenário estrutural precário e pouco viável no tocante à construção do conhecimento”.
Invisíveis
Segundo a professora de sociologia Rachel D’Amico Nardelli, pensando no Brasil onde a existência vincula-se ao documento, propor uma reflexão sobre isso é “debater os sujeitos invisíveis, como imigrantes, refugiados, trans e travestis”.
E colocar em pauta o abandono parental e com isso a discussão da violência de gênero. Em concordância com as grandes discussões do contemporâneo de Judith Butler, com os debates da Vida Precária, com Mbembe, e Agamben sobre os sujeitos matáveis, justamente por serem aqueles que não tem nome”.