Apenas 15% das secretarias municipais da região são chefiadas por pretos e pardos

Diversidade? Das 152 secretarias municipais com nomes definidos nas prefeituras da região, só 27% são chefiadas por mulheres e 15% por pretos e pardos

Por: Tatiane Calixto & Da Redação &  -  10/01/21  -  22:26
Curso é oferecido aos professores pela Prefeitura de Bertioga
Curso é oferecido aos professores pela Prefeitura de Bertioga   Foto: Dirceu Mathias/Prefeitura de Bertioga

O alto escalão das prefeituras da região é composto, em maioria, por homens brancos. Das 152 secretarias municipais com nomes definidos, 73% são chefiadas por homens e 85,53% por pessoas que não se declaram pretas e pardas. Para especialistas em carreiras, relações raciais e outras áreas, promover a diversidade e a representatividade em cargos de poder é fundamental para garantir políticas públicas eficazes e combater o preconceito.


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Na Baixada Santista, conforme a Fundação Seade, as mulheres são 52% da população. Entre os munícipes que autodeclararam a cor, no último Censo do IBGE, em 2010, quase 42% afirmaram ser pardos ou pretos. Hoje, os negros são a maioria da população do País, chegando a quase 56%.


Ainda assim, em Bertioga, das 11 secretarias, apenas a de Desenvolvimento, Trabalho e Renda é comandada por uma mulher, Iza Maria Lagarcha Perez, e nenhuma por negros. Trata-se do secretariado menos diverso da região. Apesar disso, a Prefeitura garante que, no governo, há dezenas de mulheres e negros em postos importantes.


Já a Prefeitura de Peruíbe, proporcionalmente, possui a maior diversidade no alto escalão. Mesmo assim, das 13 secretarias, oito são comandadas por homens e 11 por brancos. As informações foram passadas pelas próprias prefeituras, com exceção de Cubatão, que afirma não ter definido o secretariado.


Cenário santista


Em Santos, das 17 pastas, 13 têm homens à frente. Além de quatro secretarias, a vice-prefeita é uma mulher e também são femininos os comandos da Capep-Saúde e Fundo Social de Solidariedade. Em relação aos negros, só os secretários de Finanças e Gestão, Adriano Leocádio, e de Esportes, Gelásio Ayres Júnior, se autodeclaram afrodescendentes.


O prefeito Rogério Santos (PSDB) destacou que, recentemente, foi encaminhado um projeto de lei à Câmara que reserva a pessoas negras 20% das vagas em concursos para cargos efetivos e empregos públicos na Administração. A medida, segundo ele, deve ser implementada em breve.


“Tenho um cuidado para estabelecer políticas públicas de valorização e empoderamento das mulheres”, garante Rogério. Parte deste trabalho é executado pela vice-prefeita, Renata Bravo, que busca garantir o fortalecimento de políticas ao público feminino.


Única Prefeita


“Ao longo dos últimos anos, o respeito à diversidade e pluralidade sempre foi uma bandeira em Praia Grande, além da busca pela equidade na oferta de serviços e atendimentos. Seguiremos com esses compromissos”, garantiu a prefeita Raquel Chini (PSDB), única mulher eleita no pleito de 2020 para chefiar uma prefeitura na região.


Ainda assim, das 17 secretarias praia-grandenses que têm nomes definidos (são 20 ao todo), 12 têm secretários homens. Os negros são apenas três. Um exemplo é a Educação, onde assumiu Maria Aparecida Cubilia, mulher e negra.


Gestões dizem priorizar critério técnico


Todas as prefeituras que responderam à Reportagem encaram seus quadros como diversos e maioria justifica a escolha com base em critérios técnicos.


“A capacidade técnica é o que norteou a composição de nosso governo. Fico satisfeito de termos reunido afrodescendentes e mulheres extremamente competentes, dentro deste critério”, diz o prefeito de São Vicente, Kayo Amado (Podemos), onde há 21 secretarias, sendo 14 lideradas por homens e três por negros.Lá, a vice-prefeitura é de Sandra Conti.


Segundo o prefeito de Mongaguá, Márcio Cabeça (Republicanos), a questão da diversidade e representatividade tem peso, mas o valor profissional dos integrantes da gestão é o carro-chefe para a escolha.


Mudança em seleções


Ana Minuto, consultora de carreira e especialista em Diversidade Racial, defende que gestores em geral invistam em seleções voltadas a mulheres e negros. Isso garantirá oportunidade e a certeza de que encontrarão pessoas qualificadas com esse perfil. Sem isso, será difícil combater o preconceito.


“Os negros e mulheres têm qualificação, mas os processos os excluem. Se você é um homem branco, é mais difícil trazer um negro para a empresa ou prefeitura. Por isso, é preciso encontrar caminhos para trazer negros e mulheres a esses locais”.


Ela conta que, em um de seus projetos, teve que mapear perfis de mulheres para concorrer a bolsas de desenvolvimento em liderança. Assim, pôde comprovar a qualificação acadêmica do público feminino.


“Eram 300 candidatas, mais da metade tinha pós-graduação e algumas em processo de PhD. Mesmo assim, muitas não estavam no mercado. Dependiam de bolsas ou trabalhavam informalmente”.


Mudança em cargo de poder é urgente


Noemi Lopes, cientista política e articuladora política da ONG Elas no Poder, acredita que a maior participação de mulheres e negros em cargos de poder é um assunto urgente. “Estudos mostram que negros ocupam apenas 15% de cargos de liderança na gestão pública e isso resulta em má elaboração de políticas que não atendem à real necessidade da população brasileira, formada em maioria por mulheres e negros”.


Isso ocorre, segundo Noemi, pois quem elabora e implementa essas políticas desconhece os pontos, dilemas e dificuldades do público-alvo por falta de vivência e experiência. “Isso ocorre na pandemia. As mulheres são as maiores usuárias do SUS e maioria entre os profissionais da enfermagem, mas não ocupam os cargos de poder no combate à covid-19. Nos ministérios, só há duas mulheres e nenhuma à frente das políticas de Saúde”.


Maioria sem representatividade


Eloy Oliveira, diretor executivo do Instituto República.org, instituição que visa a melhoria da gestão de pessoas no serviço público, revela que quanto mais alto o posto, menor a presença negra. Por outro lado, as mulheres são maioria no serviço público brasileiro (59%), mas distantes do alto escalão e problemas na remuneração, com salário médio 25% menor que o dos homens.


“A solução passa por mais transparência dos governos em relação ao funcionalismo. Só com uma radiografia poderemos formular iniciativas eficazes para reduzir o desequilíbrio. Um governo plural é o primeiro passo para o combate efetivo das desigualdades”, diz Oliveira.


Dificuldades estruturais


O machismo e o racismo estrutural são dois fatores que afastam mulheres e negros dos cargos de poder. A análise é de Edilene Machado Pereira, ativista e pós-doutora em Relações Raciais. Ela vê avanços importantes da política pública à população afrodescendente, com mais portas abertas na Educação. Mas também admite alguns retrocessos nos últimos anos que impediram avanços.


“Levantamentos apontam que mulheres têm mais escolaridade que os homens. Mas, muitas vezes, quando a seleção passa por quesitos subjetivos, mulheres e negros não conseguem avançar. É um universo de exclusão”.


Dificuldade


O advogado criminalista Émerson Lima explica que, ao longo dos anos, as mulheres conquistaram direitos, mas ainda há um forte preconceito no País. “O mercado de trabalho é um dos fios condutores do preconceito, poisdeixa de contratar mulheres negras,por exemplo. Há predominância dehomens brancos em larga escala,em especial na AdministraçãoPública”.


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