Filme 'Mank' retrata a era de ouro de Hollywood, mas peca pelos excessos

Produção de David Fincher retrata a vida e obra de Herman Mankiewicz - roteirista de 'Cidadão Kane'

Por: Bia Viana & Da Redação &  -  11/04/21  -  09:56
Gary Oldman incorpora o gênio incompreendido e louco, seus vícios e traumas de maneira instintiva
Gary Oldman incorpora o gênio incompreendido e louco, seus vícios e traumas de maneira instintiva   Foto: Divulgação

Sob a forte pressão de lançar um retrato clássico à altura da era de ouro de Hollywood, David Fincher fez o possível para ilustrar a narrativa e estética do cinema da época em Mank, que está entre os filmes com mais indicações ao Oscar este ano. No longa, ele narra uma história real: o escárnio social vivido pelo roteirista Herman Mankiewicz, que enfrentou seus vícios (simbólicos e reais) para escrever o aclamado Cidadão Kane (1941), um dos mais importantes filmes da história.


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A história da produção do filme é ainda mais intrigante do que seu resultado final. O roteiro de Mank foi concebido pelo pai de David, Jack Fincher, um jornalista apaixonado por cinema, há mais de três décadas. Ele não viveu o suficiente para ver seu único roteiro estrear nas telas, pois morreu em 2003. Mesmo assim, seguindo o acordo de exclusividade firmado com a Netflix em novembro de 2020, David finalmente deu vida ao script do pai.


Herman Mankiewicz é o personagem estereotipado ideal para um filme como o que Fincher pretendia fazer. O jornalista e roteirista, não creditado em muitos de seus trabalhos, era um crítico ávido do sistema e da própria indústria cinematográfica, além de um alcoólatra e jogador compulsivo. Um personagem propenso a conflitos, e que realmente os encontrou na vida real: após se isolar completamente em um rancho para escrever Cidadão Kane, um projeto do então pouco conhecido (e muito menos querido) diretor Orson Welles, Herman percebe que aquela pode ser sua obra prima.


Até então, Orson recebia todos os créditos pelo filme, mas Mank levou a discussão ao Sindicato dos Roteiristas, onde lutou até conseguir que seu nome figurasse ao lado de Welles na autoria, em uma relação forçosamente definida como briga (era, na verdade, uma situação bem comum na época: muitos roteiristas não eram creditados e não era algo com que se preocupavam). A conquista dos créditos não podia ser mais certeira: em 1942, o único Oscar conquistado por Cidadão Kane foi justamente o de melhor roteiro.


A persona do gênio incompreendido e polêmico, incorporada de forma quase instintiva por Gary Oldman, que criou uma conexão astuta com o personagem por também ter enfrentado problemas com alcoolismo no passado, é a essência da obra. Os diálogos rápidos e afiados, que homenageiam a própria escrita ágil de Mankiewicz, se dispersam em certos pontos, forçando uma narrativa pouco acessível para o grande público.


A extensão do longa, que se arrasta em muitos plots não desenvolvidos – como a relação de Mank com Marion Davies (Amanda Seyfried) –, dificulta a narrativa e pode torná-la cansativa. Porém, aos cinéfilos de plantão, Mank não deixa de ser um prato cheio para estudos de roteiro, fotografia, maquiagem, montagem e demais linguagens. Sua composição é muito coerente, e talvez pelo excesso de técnica, careça um pouco de sentimento.


Afinal, não há porquê simpatizar com Mank: os poucos sentimentos que extraímos do personagem são sua enorme frustração e indignação constantes, uma raiva contida que o move e parece conduzir todo seu trabalho e relações em seus últimos anos de vida.


Entretanto, há de ressaltar que essa falta de humanidade não é um erro de Oldman. Essa lacuna surge pelas intenções da obra a pretensa “genialidade” e pompa que parece buscar com unhas e dentes, enquanto deixa de lado uma proximidade real com seu personagem principal.


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