Escritora santista Maria Valéria Rezende se diz apreensiva com a Covid-19, mas mantém produção

Escritora, de 78 anos, está em isolamento social na Paraíba, onde reside desde o fim dos anos 1970

Por: Lucas Krempel & Da Redação &  -  23/06/20  -  12:37
A situação do Brasil deixa a autora extremamente inquieta
A situação do Brasil deixa a autora extremamente inquieta   Foto: Adriano Franco/Divulgação

Ficar em casa parece uma missão árdua para muitos. No entanto, isso não é um problema para a escritora santista Maria Valéria Rezende, de 78 anos, que está em isolamento social na Paraíba, onde reside desde o fim dos anos 1970. A situação do Brasil, porém, deixa a autora extremamente inquieta.


“Ficar em casa, para mim, não é sacrifício. Pelo contrário, seria um prêmio se não fosse o pandemônio do País e do mundo que entra pelos sete buracos do meu equipamento eletrônico. É impossível ficar indiferente e desligar-me. A indignação e a sensação de impotência, quase de culpa por não conseguir ser mais ativa e achar que estou fazendo uma diferença no combate por tantas causas que me tocam fundo: o antifascismo, o antirracismo, o antimachismo e por aí em diante, me deixam exausta e inquieta o tempo todo”, desabafa.


Rotina


Ao falar de sua rotina em meio à pandemia, Maria Valéria faz uma análise da residência. “Estou realmente de retiro em casa... por sorte uma casa no chão, de um conjunto popular, com quintal-jardim que, agora, está virando um matagal, e uma espécie de reserva animal, principalmente de passarinhos e calangos, sem contar as duas jabutizas (Lygia e Clarice) que passeiam e se escondem na folhagem”. 


Engana-se, entretanto, quem pensa que a vencedora do Prêmio Jabuti 2015, com o romance Quarenta Dias (Alfaguara), está com a produção parada. “Tenho muitos planos na cabeça, um romance iniciado (Toda Família tem um Esqueleto no Armário, cujo título já diz de que se trata...) que acabou cozinhando em banho-maria na cabeça, mas no papel está apenas nas primeiras 30 páginas, esperando tempos melhores”.
O último livro da santista foi o romance Carta à Rainha Louca, de 2019, lançado pela Alfaguara.


Muito requisitada para colaborações e lives, Maria Valéria conta que tem dificuldade em dizer não aos pedidos, o que acaba atrapalhando na hora de produzir tudo que gostaria.


“Fico espantada de ler dos outros que estão entediados, não têm o que fazer e assistem séries inteiras, filmes, todas as ‘laives’. Eu mal dou conta de saber que dia é hoje ou que horas são, quando vejo o dia escureceu”, surpreende-se.


Pós-pandemia


Refletindo sobre um futuro pós-pandemia, a autora não consegue imaginar como será o mundo depois do isolamento social: “Nem mesmo tenho certeza de que vou ver isso”. Mas quer manter a esperança por dias melhores. 


“Sou teimosamente esperançosa e fico apostando numa consciência social e ambiental mais agudas e justas. O fim do desperdício, do descartável, mais do que tudo o fim da ideia de que há pessoas descartáveis. “Fico sonhando que certas lutas que estão sendo aceleradas pelas condições dadas neste momento, principalmente a luta antirracista, são irreversíveis e estão dando um passo largo agora... E assim continuo com meus sonhos”.


Morando em João Pessoa, Maria Valéria revela sentir falta dos longos papos com amigos, principalmente na mesinha do jardim da sua casa.


“Benéfico, se é que se pode dizer assim, é que, apesar de agora estarmos todos com máscaras de pano na cara, não está mais sendo possível mascarar as enormes injustiças estruturais que passavam despercebidas para quem não as sofria! Só faço rezar para que não sejam novamente esquecidas e ‘naturalizadas’ quando e se a pandemia e o pandemônio acabarem”.


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