Duo 509-E se reinventa para chegar ao Lollapalooza

Após 20 anos, Dexter e Afro-X retornam aos palcos, para darem o seu recado

Por: Isabela dos Santos & Do Blog n' Roll &  -  19/02/20  -  12:15
Dexter e Afro-X formam o 509-E
Dexter e Afro-X formam o 509-E   Foto: Divulgação

“Falei: irmão, se for pra gente voltar e fazer showzinho, deixa quieto”. Foi o que disse Dexter ao Afro-X quando decidiram retornar aos palcos para trazer shows do 509-E, com a turnê Vivos.


Assim, o duo dos anos 1990, famoso por expressar a realidade do cárcere em suas letras, não mediu esforços para preparar uma megaprodução.


Com a ajuda do público, tudo ocorreu no mais alto nível, na comemoração dos 20 anos do lançamento de seu primeiro CD: Provérbios 13.


“Foi eletrizante! Casa lotada com 3,5 mil pessoas, na Audio, em São Paulo. Foi como dividir o palco com os Racionais em 2000. Sensação de ressurreição. Tinha artistas presentes da cena do rap, como Gogh, Rappin Hood, ADL da nova geração. Várias pessoas vibraram com o projeto, foi como nosso primeiro show. Foi da hora também ver o reencontro de gerações. O pai que curtia nosso som e o filho que curte rap atual”, comenta Afro-X sobre o primeiro show da turnê, que rolou em 24 de agosto de 2019.


A tal ressurreição da dupla em grande estilo foi o que impulsionou a indicação deles ao Prêmio Quinto Elemento na categoria “melhor show”, e logo depois foram contemplados com a votação popular e ganharam o título. “Ganhamos o prêmio considerado o melhor show do ano, sendo que fizemos só uma turnê de quatro shows. Mas foi visto como um grande espetáculo. Ficamos surpresos que poderíamos ser indicados e ganhar”. 


Mais surpresos ainda eles ficaram quando foram convidados a se apresentar no Lollapalooza 2020, que acontece de 3 a 5 de abril no Autódromo de Interlagos, na Capital. Eles vão tocar no dia 5 de abril. “Eu recebi o e-mail e pensei: nossa, que loucura! Eles viram nosso primeiro show e para nos chamarem devem ter visto um espetáculo”, destaca Dexter.


Ao receber a notícia, Afro-X embarcou em um momento de reflexão: “Satisfatório dividir com meu parceiro de infância sonhos que tínhamos naquela época e na prisão. Foi ver que tudo valeu a pena. Não foi nada fácil chegar a esse momento. A gente conseguiu se superar de várias maneiras, sem esquecer de onde a gente veio. Estamos vivos para narrar nosso momento do cárcere, que é a realidade de vários jovens. A juventude negra ainda está morrendo”, alerta.


Os integrantes ainda ficaram muito honrados de poderem levar a voz do rap “autêntico dos anos 1990” para o Lollapalooza. E para Dexter, o fato do público presente não ser o mesmo de shows que fazem geralmente para a favela traz uma sensação diferente. 


“Para mim, é a visibilidade, dialogar através da música com pessoas que a gente não dialoga, porque ele não é um festival feito para favela. Levar questionamentos e consciência para essas pessoas, que geralmente não escutam nossa música. O rap pode informar também”.


Reatar laços


Para alcançar essas conquistas, a dupla Dexter e Afro-X passou por um período de anos sem se falar, até tudo virar “águas passadas”. Dividindo a cela 509-E no antigo Carandiru, em São Paulo, eles produziram o primeiro CD e conseguiram sair da prisão cerca de 150 vezes para fazer shows, com a ajuda da iniciativa Talentos Aprisionados.


como tudo aconteceu


Afro-X conquistou sua liberdade, o 509-E lançou seu segundo e último trabalho, MMII DC (2002 Depois de Cristo). As atividades foram encerradas em 2003. 


“No passado, aconteceram várias situações. A gente foi no programa do Serginho Groisman (TV Globo) e tivemos um debate com uma autoridade e não podíamos mais sair para fazer show. Eu saí mais cedo da prisão pela minha condenação ser menor. Dexter foi transferido, eu não tinha como visitar ele por causa do regime semi-aberto. Foi um período difícil, colocavam as pessoas uma contra as outras. E eu e ele tínhamos necessidade da construção da carreira solo também. Foi bom para nosso crescimento”.


Porém, Afro-X relata a falta que sentia de seu amigo e do legado que criaram juntos. Foi então que resolveu procurar Dexter. “Ele é uma pessoa de liderança, assim como eu. Fui insistindo e consegui mostrar para ele que tudo foi algo consensual. Que as nossas conquistas e objetivos são maiores que nossas diferenças”.


Em 2017, deram início a uma longa conversa para discutirem os problemas. Após se resolverem, acharam que era uma boa ideia reatar os trabalhos do 509-E. “Passamos 2018 conversando sobre isso. Resolvemos voltar em 2019, quando completamos 20 anos, porque também tava tudo bem corrido para os dois. Desenvolvemos o projeto para presentear os fãs”, afirma Afro-X.


Retomar os trabalhos significou revisitar o conteúdo produzido, que, por muito tempo, não teve atenção da dupla. “Ficou tudo jogado, tudo solto durante esses anos! Sentia que precisávamos consolidar o legado que criamos. Nosso conceito de vida também mudou, surgiram outras lutas, como a das mulheres. Acredito que éramos um pouco machistas. Isso fez a gente refletir sobre as letras”.


Divulgar o trabalho e shows pontuais


A turnê Vivos acabou em 26 de outubro passado. O show do Lollapalooza dá um gostinho a mais no duo. E, daqui pra frente, Dexter explica que o 509-E fará shows pontuais, que não atrapalhem as carreiras solo dos dois. 


Questionado sobre lançamentos de novas músicas da dupla, Afro-X responde: “Por enquanto, reticências. Mas tem muitas coisas pra acontecer. Pensa que o amor tem as etapas. Conquistar, namorar, casar e filhos. Ainda tem muita coisa para organizar e que precisavam ser divulgadas.


Na opinião do rapper, o segundo trabalho do 509-E, MMII DC (2002 Depois de Cristo), foi pouco divulgado. “Foi o momento que aconteceu a transferência do Dexter para Presidente Bernardes, atrapalhou totalmente. Queremos divulgar essas músicas que muita gente não conheceu”.


Se novos lançamentos não estão previstos, os integrantes esperam uma coletânea atualizada de suas obras. 


“O pessoal está nos cobrando novos trabalhos. Temos uma releitura da nossa obra original, com as bpm mais rápidas, lapidamos o conteúdo. Gravamos o show que fizemos em Porto Alegre para a turnê. Vamos nos organizar e lançar esse conteúdo de música. Tem a criação da marca também, com produtos. Mas vem toda a parte da documentação e burocracia...”.



Para este ano, uma confirmação: o lançamento de um documentário. Afro-X afirma que imagens resgatadas de 20 anos atrás compõem o conteúdo audiovisual. 


“São coisas do passado que está sendo legal falar sobre e repensar. É bom quando você volta para sua base. Não existe um futuro sem passado. É gratificante ao extremo preparar o documentário. Também é contar a história para quem não sabe como foi, é forma de fortalecer as pessoas. O 509-E é um manifesto de mudança, através das suas letras. Esse é o objetivo maior. Munição pra revolução”, pontua Dexter.


Serviço


O Lolla Double (válido para dois dias do Lolla) está à venda. Todavia, custa a partir de R$ 750,00 (meia-entrada), R$ 850,00 (entrada social) e R$ 1,5 mil (inteira). O Lolla Day (válido para um dia), entretanto, custa a partir de R$ 360,00 (5/4) e R$ 405,00 (3/4 e 4/4). Já para quem quiser curtir o festival inteiro, o 4º lote do Lolla Pass (válido para os três dias) custa a partir de R$ 945,00. Os ingressos estão à venda no site do festival e bilheteria oficial (sem taxa de conveniência — UnimedHall, em São Paulo).


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