Banda virtual Gorillaz transforma álbum 'Song Machine' em série

Banda lança músicas e vídeos como episódios

Por: Eduardo Cavalcanti & Colaborador &  -  27/09/20  -  18:13
Banda virtual transforma em série o novo álbum, ‘Song Machine’, e lança músicas e vídeos
Banda virtual transforma em série o novo álbum, ‘Song Machine’, e lança músicas e vídeos   Foto: Divulgação/Luiz Sérgio Moura - Criação Gráfica

Os britânicos adoram conceitos. O norte-americano Andy Warhol pode ter sido o papa da Pop Art, mas a ideia de tratar a cultura de massa como matéria-prima para um novo tipo de modernismo surgiu em Londres, nos anos 50. Na década seguinte, o rock and roll adolescente e descomplicado de Elvis e Chuck Berry cruzou o oceano e se transformou no rock como experimentação multimídia com o Pink Floyd, ou como arte pop (ela, novamente) com o Roxy Music, nos 70.


Assine A Tribuna agora mesmo por R$ 1,90 e ganhe Globoplay grátis e dezenas de descontos!

O próprio punk, com toda sua pretensa glorificação de tudo que é espontâneo, foi uma criação do provocador cultural Malcolm McLaren, o inventor de fato dos Sex Pistols. Nada mais natural, portanto, que os ingleses Damon Albarn e Jamie Hewlett tenham reunido um pouco de cada uma dessas influências e produzido a banda conceitual por excelência do século 21, o Gorillaz.

Na verdade, a proposta é tão fluida que até o termo banda mal se enquadra como definição. Desde o EP de estreia, em novembro do ano 2000, todos os vídeos e materiais de divulgação mostram o Gorillaz como um grupo de jovens delinquentes desenhados por Hewlett, autor da cultuada Tank Girl, uma personagem punk-feminista de quadrinhos ‘underground’. As músicas ficam por conta de Albarn e mais um elenco interminável de convidados.

Às vésperas de completar 20 anos de estrada (virtual ou não), a banda apresentou um tipo de projeto dentro do projeto, o Song Machine, que consiste de vídeos e músicas lançados em episódios mensais, como uma série. O sexto desses episódios, a faixa Strange Timez, foi lançado no último dia 10 de setembro, com a participação de ninguém menos que Robert Smith, do Cure, nos vocais. Em abril, a inclinação pós-punk da fase atual do Gorillaz já havia sido sinalizada com a participação de Peter Hook, ex-baixista do Joy Division e do New Order, na faixa Aries.

Em outubro, essas e outras canções, inéditas, serão reunidas no álbum Song Machine, Season One: Strange Timez, que virá acompanhado do livro de cartoons Gorillaz Almanac. Se há alguma novidade no som da banda, a julgar pelos episódios já conhecidos, é que ele voltou a ter a bem-sucedida pegada pop alternativa do início dos anos 2000, com ênfase menor no experimentalismo da última década.

De certo modo, o Gorillaz refaz uma trajetória familiar, em se tratando de Damon Albarn. Como vocalista do Blur, ele ajudou a dar forma ao último grande movimento do rock, o Britpop, na década de 90. Depois de produzir o clássico Parklife (1994) e de atingir o megassucesso comercial com The Great Escape (1995), o Blur entrou numa fase quase que de negação de algumas das virtudes desses dois álbuns – principalmente, a natureza acessível das músicas – e se lançou em experiências sonoras de resultados bem menos interessantes.

Mesmo sem buscar a inovação a qualquer preço, o Gorillaz faz uma combinação de estilos – do hip hop ao dub reggae, passando pelo soul e por texturas eletrônicas – que está longe de ser convencional. É certo que nem o talento de Jamie Hewlett como artista gráfico nem a engenhosidade de todo esse pacote transmídia, em que o concreto e o digital se confundem, bastaria para garantir o mesmo resultado, caso as músicas não fossem tão boas.

Para alguém que foi um dos principais símbolos do espírito de revalorização do rock inglês, depois da autocombustão do grunge, o ex-Blur não podia estar mais sintonizado com o cutting edge da música (algo que o classicismo natural do Oasis poucas vezes permitiu). Poucos músicos entendem tão bem a estética pós-moderna, e se essa compreensão já havia definido o espírito de Parklife, ela é ainda mais evidente em cada desdobramento de Song Machine.

Por mais que o Gorillaz, quando surgiu, tenha confundido o público (afinal, aquilo era uma banda de verdade, um desenho animado musical, ou o quê?), nunca houve muita dúvida quanto à eficiência e ao apelo do som. Mesmo sem superar seu trabalho no Blur, mas a exemplo dele, Damon Albarn continua definindo o pop de sua época.


Logo A Tribuna
Newsletter