Projeto Expresso faz da arte uma ponte para a nova vida

Projeto na Fundação Casa estimula jovens a sonhar e ter esperança

Por: Ronaldo Abreu Vaio  -  25/01/22  -  09:18
“O projeto, para mim, é uma ressignificação do que vivi
“O projeto, para mim, é uma ressignificação do que vivi   Foto: Divulgação

Entre duas vidas possíveis, há uma ponte e ela se chama arte. Daniela Machado, hoje economista e pós-graduada em Projetos Sociais, sabe bem disso. À frente do Projeto Expresso, que durante três meses apresentou a 30 adolescentes, entre 12 e 18 anos, da Fundação Casa, esse mundo que possibilita sonhar e ter esperança, Daniela vê nessas crianças a sua própria história: ela mesma já passou pela antiga Febem e foi resgatada pela arte.


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“O projeto, para mim, é uma ressignificação do que vivi. Um encontro com eles e uma ressignificação, por meio de nossas histórias”, resume Daniela.


Durante três meses, entre setembro e dezembro, os jovens viveram as artes plásticas, a partir de ateliês da cidade de São Paulo. Foram trabalhadas técnicas de desenho, pintura, fotografia, música e audiovisual.


O resultado dessas vivências pode ser apreciado de amanhã até domingo (30), em uma exposição realizada no Casa Feminino Parada de Taipas (Rua Ilha da Juventude, 518, no Jaraguá, em São Paulo). A visitação é gratuita e aberta ao público das 11 às 16 horas.


Daniela nasceu e cresceu no bairro Capão Redondo, que já foi um dos mais violentos da Capital Paulista. Lá, morava com a mãe, do lar, um irmão menor e o padrasto, desempregado. “Meu pai estava ausente, minha mãe não podia estar presente... Eu me sentia abandonada”.


Como em toda periferia, a luta pela sobrevivência é difícil, desigual e, por ela, é fácil resvalar por descaminhos. Aos 14 anos, envolveu-se com drogas; aos 16, em 2001, foi presa e encaminhada à Febem. “Eu tive o privilégio de ficar em uma unidade modelo, a chamada Febem Chiquinha Gonzaga, com atividades pedagógicas e artísticas aos internos”.


O fim e o recomeço

“O que você acha que pode ser o fim, na verdade pode ser um recomeço”. A frase, que constava na carta de uma tia recebida nos primeiros tempos na Febem, mais as atividades de capoeira, pintura, teatro e ioga, as quais ia conhecendo e entregando o coração, fizeram-lhe enxergar uma esperança para além da esquina de Capão Redondo.


“Era uma ironia: antes da Febem, não tinha acesso a nada disso. Não tinha oportunidades de frequentar um teatro, um esporte...”, reflete Daniela.


Ao deixar a unidade, era outra pessoa, graças sobretudo às interações possibilitadas pela arte. “A cumplicidade que existia com os outros melhorou meu humor. Apesar de estar em um ambiente de punição, a arte era uma expressão de liberdade. A arte aceita o delírio, você pode criar uma nova vida por meio dela”.


A nova vida se cristalizou quando Daniela deixou a unidade e foi procurar a professora de ioga Márcia de Lucca, precursora da modalidade no Brasil, em busca de emprego para ajudar a mãe.


O trabalho não veio logo a seguir, mas o destino, em sua teia, teceu um caminho firme: uma empresária conhecida da professora e tocada pela situação assumiu para si os custos dos estudos de Daniela até a faculdade.


Daniela já fez e viveu o que era inimaginável na adolescência. O Projeto Expresso nasceu do desejo de reverter o seu trabalho e conhecimento a outros jovens em situação similar à dela. “Às vezes, eu estou com eles e me vejo neles. Com 16 anos, eu era exatamente como eles são hoje”.


Contudo, ressente-se de que projetos como o Expresso ainda sejam tão necessários. “Estamos em um País onde ainda falta investimento para o desenvolvimento da criança e do adolescente. Sem o apoio do Estado e da família, muitas vezes desestruturada e com membros no álcool e drogas, é muito difícil a um jovem quebrar esse ciclo”.


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