'Autoconhecimento não é se embrenhar na positividade tóxica', diz Suzane Gil Frutuoso

Para ela, é preciso "compreender que nem tudo é sobre você'

Por: Suzane Gil Frutuoso  -  26/06/22  -  17:07
Atualizado em 26/06/22 - 20:46
Processos de autoconhecimento exigem divã. Confio no suporte de psicólogos para essa busca
Processos de autoconhecimento exigem divã. Confio no suporte de psicólogos para essa busca   Foto: Adobe Stock

Escrever crônicas e contos é um exercício de observação do mundo e de como as pessoas existem nele. Muito do que coloco aqui para você é inspirado em histórias reais, cenários vividos, dores e alegrias compartilhadas. Minhas, de quem me cerca, com quem convivo profundamente ou na superfície. De quem já passou pela minha vida e permanece lembrança especial. De quem já passou pela minha vida e perdeu a importância. São linhas do cotidiano, que em maior ou menor grau, perpassam todas e todos nós.


Não significa que quando escrevo é um recado específico para alguém. Imagine, então, minha surpresa quando recebo uma mensagem com a pergunta relacionada a um texto: é sobre mim? Pessoa essa, que surge das profundezas das redes sociais e que, enquanto eu escrevia, não estava no meu pensamento. Mas, se a carapuça serviu tanto, tem alguma coisa aí no coração para ser sentida e ressignificada. E sim, agora a reflexão é direta – e a quem mais tocar.


Essa situação me lembrou uma conversa recente com um amigo sobre autoconhecimento. Sobre como algo bom e essencial, esse conhecer a si mesma(o) e as emoções que carregamos, virou clichê esvaziado. Um acreditar que autoconhecimento é superioridade. Passe livre para enxergar quem não segue as mesmas verdades como ser não evoluído (que pavor do #gratiluz). Isso é não entender nada sobre a própria confusão interna.


Identificar nossos padrões de comportamento e sentimentos, como agimos e reagimos em determinados contextos, medos e vergonhas que não contamos nem para o espelho... Isso envolve autoconhecimento. É mergulhar fundo naquilo que machuca, sem responsabilizar os outros, admitindo sua parte na bagunça. Saber que esses outros são humanos também tentando fazer o melhor que podem dentro de suas realidades. Desapegar e seguir em frente. Processos de autoconhecimento exigem divã. Confio no suporte de psicólogos para essa busca. Não descarto possibilidades como mentorias, terapias holísticas e literaturas afetivas como complementares para esse exercício. Defendo o uso de medicamentos com orientação de psiquiatras dependendo do quadro. Seja como for, para ter resultado, não é tranquilo. Se estiver suave, não vai funcionar.


É tempo de desconstruir a jornada da heroína e do herói. De admitir nossas imperfeições, chorar bastante, questionar certezas, até que sejamos capazes de errar um pouco menos e olhar nossas relações com compaixão e delicadeza.


Autoconhecimento não é se embrenhar no rolê motivacional da positividade tóxica. Não é acreditar que o universo gira em torno da gente e nos dar autoimportância demais. É, finalmente, compreender que nem tudo é sobre você.


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