Câmera e microfone: novos utensílios nas aulas

Cursos de Gastronomia se adaptam à realidade imposta pela pandemia e professores viram também cinegrafistas e editores

Por: Júnior Batista  -  25/08/20  -  15:46
  Foto: Arquivo Pessoal

Ingredientes, utensílios, fogão, jeito de fazer e... uma câmera e microfone. É assim que tem acontecido as aulas dentro dos cursos de Gastronomia da região, assim como em todo o País, desde que começou a pandemia. Atualmente, são 304 cursos presenciais do tipo em atividade, segundo o Ministério da Educação. Haja boa vontade dos professores. 


Para Michele Leiko Uemura, chef de cozinha e coordenadora do curso superior de tecnologia em Gastronomia da Universidade Católica de Santos (UniSantos), a situação toda foi uma surpresa. Os professora foram avisados no dia 13 de março que a partir do dia 16 teriam que ingressar nas aulas on-line. “Em nosso caso, como o curso é mais curto, de dois anos, a prática laboratorial se faz muito presente”, explica ela. 


No caso dos professores da Universidade, a adaptação foi de sopetão, mas, como em 2018 já haviam feito um projeto em formato EAD, houve uma melhor capacidade de se entender com esse novo formato.


Michele conta que, mesmo assim, nos primeiros 15 dias houve bastante resistência dos alunos, mas depois, com o entendimento do estado em que o País se encontrava por conta da pandemia, houve consenso de que não havia outra alternativa. “Hoje, estamos muito mais tranquilos”. 


Alunos participam de webniário de aula on-line
Alunos participam de webniário de aula on-line   Foto: reprodução

Para Jacqueline Barauna, docente da Universidade São Judas - Campus Unimonte, de um dia para o outro toda a programação de aulas teve que mudar. “Foi bastante desafiador porque criamos essa aula de um dia para o outro, mas mostrando para eles o passo a passo de cada etapa nas disciplinas”, diz ela.


Nesse caso, a professora virou câmera, editora e produtora de conteúdo. “Eu me vestia com o uniforme, filmava junto com eles, fazia ao vivo, montando com ingredientes que eu mesma montava e fazia passo a passo a produção. Algumas coisas foram ao vivo e outras gravava, explicando as técnicas”.


Lados positivos


Para ambas as docentes, há lados bons também deste novo jeito de ensinar. Jacqueline menciona que percebeu um novo formato para incentivar os alunos a fazerem mais pesquisas.


“Cada receituário que eu passava a gente ia listando na hora da aula os ingredientes que eles não conheciam, técnicas novas e pedia para eles pesquisarem e me entregarem em formato de relatório na próxima aula. Fomos criando mais conhecimento, direcionado, claro”, diz ela, que emenda: “o nível de pesquisa aumentou muito”.


Na visão da professora Michele, outro fator positivo foi a maior acessibilidade de especialistas no assunto, inclusive internacionais, que puderam conversar mais e fazer workshops que não seriam possíveis presencialmente.<CF70>


“Por estarmos em casa, tivemos adesão muito boa de grandes chefes, inclusive pelo mundo. Chamamos muitas pessoas, do mundo inteiro, para enriquecer o conteúdo”, diz ela, que na última segunda-feira fez um encontro com estrelados Michelan, uma das maiores classificações de profissionais que existe, reconhecida no mundo todo.


“Esses alunos vão se formar e irão encontrar um mundo totalmente diferente. Essas lives também é para que eles saibam o que está acontecendo pelo mundo. A covid-19 trouxe desafios, mas também trouxe oportunidades”, conta Michele. 


Professora Jacqueline Barauna teve que se adaptar
Professora Jacqueline Barauna teve que se adaptar   Foto: Arquivo Pessoal

Degustação


Para conseguir adaptar as aulas em que são necessárias as experimentações dos pratos, cada instituição de ensino foi se virando como pôde. As soluções precisaram ser criativas. 


No caso da UniSantos, o jeito foi suspender as práticas laboratoriais. “Estamos mantendo os conteúdos são só das disciplinas teóricas. Porque no presencial, no ambiente de cozinha, orientamos, acompanhamos e damos o retorno nas técnicas de preparo”, diz Michele. 


Na São Judas-Campus Unimonte, foi feita uma adaptação. “Cada um faz sua produção e a gente avalia somente pela análise visual. Se tá bonito, tem a textura correta e está conforme em termos de coloração. Uma fritura, por exemplo, você vê se tá correta e crocante só de olhar”, diz Jacqueline. 


Curso à distância teve desafio menor


Para quem já estava mais acostumado com esse universo on-line, os desafios foram menores, mas não menos importantes. É o caso da professora Simone Caivano, docente do curso de Nutrição e Gastronomia (EAD) da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes), que é totalmente on-line.


O EAD, aliás, tem ganhado espaço. Atualmente, já são 55 universidades pelo País que oferecem a modalidade, segundo o MEC. Isso representa 18% do total de cursos credenciados pelo ministério no Brasil.


Dentro desse universo, esse aluno, que já conhece as ferramentas disponíveis no curso, houve pouca adaptação. “O que adaptamos foi de compra de materiais. Temos uma atividades de análise sensorial, por exemplo, que demandava experimentação, então houve adaptação para aqueles que não podiam de repente fazer preparação e testes para outras pessoas”, diz ela.


É que no caso do curso que ela ministra, há alunos que moram em diferentes universos. Há os que vivem sozinhos e até mesmo aqueles que residem fora de centros urbanos e não têm muito acesso à compra de ingredientes. 


“Então houve flexibilização de algumas atividades adaptativas, além da ampliação do período de atividades avaliativas. Ainda há alunos que trabalham na área de saúde, ou seja, que estão com demanda profissional muito maior”.


Para as degustações, os alunos fazem análises sensoriais com membros do polo ou então na casa deles e dividem a experiência com familiares. “Ele não faz junto dos professores, é uma atividade assíncrona. A atividade prática não é permeada em torno somente de degustação, e sim da aplicação de técnicas corretas, empratamento etc. Isso nós observamos por meio de registro fotográfico e relato dos alunos”.


Futuro


A professora acredita que um ponto positivo foi que outras pessoas que não são do universo do curso à distância começaram a olhar de uma forma mais positiva. “Começaram a se interessar mais. É totalmente possível estudar gastronomia on-line, porque a gastronomia envolve cultura, gestão do restaurante, história, segurança dos alimentos, uma infinidade de conceitos que ultrapassam a técnica culinária”.


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