Audiobooks narram histórias 'ao pé do ouvido' e ganham potencial na era digital

Mercado de livros em áudio não é novo no mundo, mas está dando os primeiros passos no Brasil

Por: Vinicius Holanda  -  16/12/18  -  17:14

Foi-se o tempo em que o livro era um objeto feito apenas para ser folheado. Agora, o leitor tem a possibilidade de ouvir suas obras preferidas em alto e bom som. Diferentemente dos e-books, cujo conteúdo textual é adaptado para dispositivos da internet, os audiolivros (audiobooks) possibilitam ao usuário ouvir a história de uma publicação tradicional via aplicativo em smartphones. Em outras palavras: onde e quando quiser.


O sistema é semelhante ao da Netflix, provedora de filmes e séries por streaming. O assinante paga uma mensalidade fixa e tem acesso a todo o catálogo de livros em áudio disponibilizado pela empresa. Ele pode utilizar o serviço a qualquer momento, sem limites, intercalando o número de títulos que pretender.


Em meio ao encolhimento sofrido por grandes redes do mercado editorial - como Fnac e Saraiva -, os audiolivros são vistos como um nicho do setor com amplo caminho para crescer. O formato não é exatamente novo: os livros narrados já existem no Brasil há tempos. Quem não se lembra da coleção de CDs em que o apresentador Cid Moreira declamava trechos da Bíblia?


A vantagem dos tempos digitais é que o novo formato dispensa as mídias físicas, como CDs, fitas cassetes ou disquetes de computador - que, na prática, esbarram nas mesmas limitações do livro de papel. Nas plataformas de streaming, o usuário pode não apenas ter a versão digitalizada da obra (e-book) em seu celular, como carregar a narração do título no aparelho.


Aplicativos com o serviço de streaming permitem ouvir as narrações
Aplicativos com o serviço de streaming permitem ouvir as narrações   Foto: Divulgação

Em um exemplo básico dos tempos atuais: se estiver disposta, a pessoa pode ler o livro físico em casa, acessá-lo no computador ou smartphone durante o trabalho e, ainda, ouvir seu enredo no carro após o expediente. Simples assim.


Se já saíram do berço há muito tempo nos mercados americano e europeu, os audiolivros estão começando a dar os primeiros passos em solo brasileiro. As duas principais startups do filão, Ubook e Tocalivros, chegaram ao mercado há quatro anos, baseadas nos modelos de sucesso observados no exterior.


Em movimento


Segundo a diretora de Conteúdo do Ubook, Cristina Albuquerque, o direito de ir e vir escutando um livro é realmente o chamariz para a plataforma. "O avanço da tecnologia facilitou isso. Antes, eram necessárias três horas para fazer o download e outras três para carregar no MP3. A funcionalidade do atual sistema foi impactante. No aplicativo, é possível marcar o trecho em que você parou de ouvir e retomá-lo depois".


A representante da empresa - finalista do Excellence Award 2018 (na categoria Editora de Audiobooks do Ano) da Feira do Livro de Londres - explica que, ao longo da consolidação da marca, demandas dos próprios assinantes foram incorporadas ao sistema. "A pedidos, criamos uma função que permite aumentar a velocidade da narração, tornando mais rápida a leitura do livro".


Pioneira no segmento, Cristina diz que, no Brasil, o número de editoras que produzem simultaneamente seus livros no formato físico e de áudio é incipiente, ao contrário do que ocorre lá fora. A maior parte dos selos com que a Ubook mantém contrato utiliza produções em audiobooks desenvolvidas pela empresa. Tanto que, dos cerca de 15 mil títulos disponibilizados, 3.200 são em português. O restante está gravado em inglês e francês. O assinante paga R$ 29,90 por mês para ter o acesso ilimitado.


Um exemplo é o livro Infiltrado na Klan, de Ron Stallworth, que originou o filme homônimo de Spike Lee. Na versão feita para a Editora Seoman, o ator André Ramiro (de Tropa de Elite) narra o enredo.


"As pessoas associavam a ideia do livro em áudio a um produto voltado para deficientes visuais e crianças", explica a diretora. "A gente trabalha com o conceito do leitor multileitura. Verificou-se que o principal consumidor desse formato é a pessoa que gosta de ler mas não tem tempo. O livro físico não anula o audiobook. O leitor ganha a perspectiva de adequar o formato que melhor se encaixa para o momento".


Para o diretor comercial da Tocalivros, Ricardo Camps, o leitor que experimentar o formato dificilmente vai deixá-lo de incorporar a seu cotidiano. "O que me motivou a montar a empresa foi essa possibilidade que o aplicativo proporciona de consumo de conhecimento de uma maneira tão prática". Ele garante que, após testar audiolivros em inglês há seis anos, acabou sendo fisgado.


O início foi modesto, com 74 títulos disponíveis - hoje já são mais de 1.400. A maioria, com produção própria. O caminho das pedras foi aprendido na marra. "É bem diferente de lançar um livro físico, muito mais trabalhoso. Mas fico satisfeito de ver que nos tornamos a maior produtora de audiobooks no País". A mensalidade do serviço é de R$ 19,90.


O diretor comercial cita sua versão de Macunaíma, de Mário de Andrade, como exemplo do apuro técnico dispensado às gravações. "O narrador, Jefferson Britto, é um ator familiarizado com o personagem há mais de 20 anos. Deu uma interpretação especial, acompanhado da trilha sonora com toques africanos e indígenas". O resultado final se assemelha a uma peça teatral.


A proximidade com o universo do livro também foi pesada na narração da biografia Leonardo - Não Aprendi a Dizer Adeus, feita pelo radialista Guaracy Júnior, referência em música sertaneja.


Camps não acredita que haja uma resistência do leitor tradicional ao audiobook. "Quem gosta de livros não se importa com o formato. Ao contrário, agrega uma nova forma de conhecer ainda mais obras".


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