Veja o que fazer com as crianças na quarentena

A pandemia do coronavírus trouxe uma nova rotina às famílias; especialistas dão dicas para todos se adaptarem

Por: Por Joyce Moysés  -  29/03/20  -  19:45

A família da nutricionista Beatrizse ajusta à nova realidade. (Foto: Alexsander Ferraz)

Com a suspensão das atividades escolares regulares e o confinamento domiciliar, não está nada fácil manter os pequenos entretidos. “É importante esclarecer à criança que não está de férias – claro, respeitando o nível de compreensão de cada faixa etária – e adotar medidas de prevenção para manter a saúde da família, além de ajustar o convívio na casa”, orienta a pediatra Sonaira Fonsêca Nascimento, gerente de Regulação da Central Nacional Unimed.

O diálogo sincero e construtivo a respeito da pandemia do novo coronavírus é fundamental para que os filhos entendam a necessidade de cumprir as medidas de confinamento e higiene. Além disso, os pais podem encarar a situação como oportunidade de estreitar os laços familiares. Para isso, Sonaira recomenda duas atitudes básicas:

1 - Desenvolva junto com a criança uma agenda diária. Combine com ela os horários para o sono, a alimentação, o banho, as brincadeiras (sozinha e acompanhada) etc.


2 - Tente inclui-la nas tarefas domésticas. Isso é possível e pode servir como uma forma de entretenimento, além de estimular o senso de responsabilidade, reafirmando que todos devem manter a casa limpa e arrumada.

Mas não poder ir brincar no parquinho ou abraçar os avós causa tédio, irritação, tristeza, desânimo em muitas crianças. E isso deixa os adultos com o coração partido. “Mudanças bruscas no cotidiano como as que estamos vivendo podem trazer medo, insegurança, preocupação com entes queridos e conosco também”, analisa a médica Luciana Mancini Bari, clínica geral do Hospital Santa Mônica. No entanto, ela acredita que as pessoas e as coisas vão evoluindo para adaptação mais adequada.

A família da nutricionista Beatriz Medina Onha se ajusta à nova realidade. Ela é mãe do Eduardo, de 12 anos, e da Larissa, de 9, que estão dentro de casa desde o dia 16. O Colégio Presidente Kennedy, onde os dois estudam, montou uma estrutura de apoio on-line, enviando atividades para a mais nova e oferecendo as aulas pela internet ao mais velho, que cursa a 7ª série do Ensino Fundamental. “Eles sentem muita falta de ir à escola, encontrar os amigos e estar com os avós. Meu filho fazia ainda treinamento funcional; e minha filha, patinação. Até sugeri praticarmos todos alguns exercícios na sala, mas o Eduardo não se animou com a ideia”.

A distração do garoto é o videogame, e Beatriz percebeu que seu semblante melhorou depois que começaram as aulas on-line, por resgatarem um pouco do seu dia a dia e do contato com o mundo exterior. “Nunca imaginei que veríamos Big Brother Brasil e torceríamos, os quatro, na formação de paredão como se fosse jogo de Copa do Mundo. Virou motivo para conversar, dar risada, vibrar”, acrescenta a nutricionista sobre a rotina da família. Mesmo assim, domingo passado, Beatriz teve uma crise de pânico, principalmente pelo fato de seu filho estar no grupo de risco do Covid-19 (ele é asmático).

Transmita tranquilidade e segurança. Para evitar ou contornar situações delicadas, a médica Luciana Bari orienta os pais a explicar aos filhos de 3 anos para cima o que está acontecendo e deixar claro que é algo passageiro. Que tal contar que lá onde vivem as crianças chinesas o caos já está sendo superado? Para dar um toque lúdico, pode-se incentivar as crianças pequenas a procurar a China no mapa ou convidá-las para ver (ou rever) a animação Kung Fu Panda, ambientada no país asiático.

Também é fundamental mostrar a importância dos cuidados de higiene. “As crianças possuem uma capacidade de entendimento maior do que se imagina. Será mais fácil se forem informadas sobre por que não podem sair, por que precisam lavar as mãos várias vezes etc. Quanto às restrições a ir à escola, ao clube, shopping, não tem jeito...

E há vários artistas, professores, contadores de histórias abrindo canais na internet com atividades para a garotada”, lembra Luciana. Outra sugestão para passar tranquilidade e segurança ao filho é resgatar fotos para olharem juntos.

Chance de desenvolvimento. Maria Cleonice Cefaly Machado, diretora do Colégio São José, admite ser desafiador encarar a quarentena: “De um lado, há a preocupação com os mais velhos que amamos e são do grupo de risco. Do outro, a tensão pelo confinamento de todos e, logicamente, dos mais novos. O assunto não deve ser tratado com desespero, como se o mundo fosse acabar, mas de uma forma que as crianças entendam que a situação exige pensarmos no coletivo”. 

A educadora alerta que, no caso dos adolescentes, o confinamento levanta outras questões, a começar pela saúde emocional: “A família deve ficar atenta a reações fora do habitual, incluindo alterações de sono e apetite e nas relações com os outros e o futuro”. 

Para tornar essa fase menos dolorosa para eles, a chave pode estar nesta pergunta de Cleonice: você já pensou sobre o que os seus filhos precisam desenvolver para enfrentar as mais diversas situações e dificuldades da vida?

Realmente vale combinar uma rotina a ser mantida. “O que inclui se exercitar, para reforçar, assim, hábitos saudáveis. Também é boa pedida retomar o gosto por jogos de tabuleiro e quebra-cabeças, que aliviar um pouco o estresse”, sugere a educadora. E a cozinha pode virar um laboratório de experimentação de receitas.

Enquanto brincam com as crianças, “os pais ajudam a desenvolver capacidades como autonomia, reflexão e solução de problemas. Os eletrônicos podem fazer parte das atividades, mas com horários definidos, pois seu uso poderá ser longo com várias escolas propondo aulas remotas. Já pensou fazer um diário desses dias de isolamento social escrevendo ou desenhando? Ler depois poderá ser emocionante”, opina Cleonice.

Equilibrando prioridades. Beatriz Onha encara desafio operacional, que é o fato de haver na casa só um computador. Afinal, ela ainda precisa administrar a Haverim, distribuidora de dietas enterais (para pessoas que se alimentam por sonda) e suplementos fundada por ela e o marido, Nicolas, que não pode parar. Como o casal optou por deixar os únicos dois funcionários em casa, a carga de trabalho e a logística ficaram gigantes.

Nicolas vai ao escritório honrar as entregas; Beatriz fica no lar dividindo-se entre os papéis de mãe e empreendedora, resolvendo burocracias e os pedidos, que vêm aumentando – porque, para liberar leitos, dentro do possível, hospitais têm mandado para casa pacientes em recuperação de outras doenças e muitos deles se tornaram clientes da Haverim. 

“Às vezes, estou no meio de atendimento por telefone quando um filho grita, outro chama. Apesar das dificuldades, nunca estive tão presente na vida deles, e isso é valioso para nossa família”, analisa Beatriz, apostando que esse momento trará mais união.

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