Teste da bochechinha detecta mais de 200 doenças

Teste é realizado com análise do DNA do bebê – um avanço na medicina neonatal

Por: Daniela Paulino  -  15/07/19  -  18:30

Quando um bebê nasce, traz com ele a expectativa de um futuro promissor. Os pais projetam planos e o que mais importa é o velho clichê: “saúde é o que importa”. Em busca desse futuro, cada vez mais pesquisas são realizadas para detectar doenças antes do aparecimento de qualquer sintoma. Vários testes são feitos no recém-nascido, como o do pezinho, da orelhinha etc. E agora existe um realizado pelo DNA: o teste da bochechinha.


Trata-se de um exame de triagem, capaz de detectar 287 doenças que, apesar de graves e silenciosas, são todas tratáveis, como explica o neurologista, especialista em genética e CEO do Mendelics, David Schlesinger. “Não teria fundamento descobrir doenças que não têm tratamento ainda. Foram dois anos de estudos, em que especialistas detectaram quais seriam interessantes para o recolhimento de um material genético como esse”. Entre essas patologias tratáveis está a Síndrome de Brown Vialetto, em que o organismo não absorve a vitamina B12. “Essa deficiência é descoberta meses ou anos depois, quando a criança apresenta um quadro degenerativo. Com o diagnóstico precoce, a reposição da vitamina já é feita e o paciente pode crescer com menos problemas e mais qualidade de vida”, enfatiza o médico.


Foi o que fez Julianne Guerreiro, mãe do Lucca, de 1 ano, que não crescia e nem engordava. Depois de baterias de exames, ela descobriu o teste da bochechinha, que diagnosticou Glicogenose Tipo 2. Hoje, com o filho em tratamento contínuo com dieta à base de aveia e amido de milho, Julianne respira aliviada. “Se não o tratasse corretamente, ele poderia ter uma hipoglicemia, causando uma convulsão e até o estado de coma”.


Mas o teste da bochechinha não é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Ele custa cerca de R$ 800 e pode ser pedido pelo site do Mendelics. O laboratório manda o kit para recolher o material (uma espécie de cotonete para esfregar na bochecha, por dentro). Depois da análise, que leva cerca de 20 dias, os resultados com as orientações são enviados. Na região, o teste pode ser feito no Laboratório de Análises Clínicas Cellula Mater, WhatsApp (13) 99647-9224.


No SUS


Todos os bebês que nascem no Brasil têm direito a uma série de testes gratuitos. O do pezinho é o mais famoso (veja mais no quadro), criado pelo médico Benjamin José Schmidt, no final dos anos 1970, como explica o filho dele, o também pediatra, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Charles Schmidt. “Naquela época, o teste foi feito em parceria com a Apae e detectava duas doenças, a fenilcetonúria e o hipotireoidismo, que causam deficiência mental. Com o tempo, foi ampliado para seis doenças: fibrose cística, anemia falciforme, hiperplasia adrenal congênita e deficiência de biotinidase”.


O teste do pezinho deve ser feito entre o terceiro e o quinto dia de vida do bebê e é obrigatório por lei (a de n o 3.914, de 1983). “As pesquisas continuaram, com mais trabalhos, e o teste começou a crescer. Em 6 de junho de 2008, efetivou-se e foi ampliado para seis doenças. Curiosamente, meu pai morreu exatamente um ano depois, em 6 de junho de 2009, mas não viu seu feito ganhar corpo, pois teve Alzheimer”, lamenta Charles.


Mas o legado de Benjamin está cada vez maior. Hoje, o teste do pezinho ampliado (fornecido por alguns convênios) já detecta 50 doenças metabólicas. “Precisamos repensar o tema. Hoje são mais de 13 milhões de brasileiros com alguma doença rara. Não é pouca coisa. Mas, para podermos avançar, com teste ampliado, incluindo o de genética, pelo SUS, precisamos, primeiramente, equilibrar a questão da saúde pública. Não podemos ter diagnósticos do que não podemos tratar, em um País que ainda não tem saneamento básico para todos”, afirma Charles Schmidt, que encerra com uma frase do pai: “Não podemos perder a esperança, ele dizia. Esperança de dias melhores da saúde pública no Brasil, com recurso necessário, bem pensado, sem FOTO desperdício e sem corrupção”.


Testes pelo SUS


Pezinho


É uma das principais formas de diagnosticar seis doenças que, quanto mais cedo forem identificadas, melhores são as chances de tratamento: fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme e outras hemoglobinopatias, fibrose cística, deficiência de biotinidase e hiperplasia adrenal congênita. Deve ser feito entre o 3° e o 5° dia de vida. É feito no pezinho por ser uma região bastante irrigada do corpo, o que facilita o acesso ao sangue para a coleta da amostra. Esse não é um exame que traz riscos ao bebê.


Olhinho


É um exame simples, rápido e indolor, que consiste na identificação de um reflexo vermelho, que aparece quando um feixe de luz ilumina o olho do bebê. O fenômeno é semelhante ao observado nas fotografias. Pode detectar qualquer alteração que cause obstrução no eixo visual, como catarata, glaucoma congênito e outros problemas – cuja identificação precoce pode possibilitar o tratamento no tempo certo e o desenvolvimento normal da visão. O exame é realizado nas maternidades públicas até a alta do recém-nascido. A recomendação é que seja feito pelo pediatra logo que o bebê nasce. Se isto não ocorrer, o exame deve ser feito logo na primeira consulta de acompanhamento.


Orelhinha


A triagem neonatal auditiva ou teste da orelhinha é feito, geralmente, no segundo ou terceiro dia de vida do bebê e identifica problemas auditivos no recém-nascido. Desde 2010 é determinado por lei que nenhuma criança saia da maternidade sem ter feito o teste, que é gratuito. As crianças nascidas fora do ambiente hospitalar devem fazê-lo antes de completarem 3 meses de vida. É realizado com o bebê dormindo, em sono natural, é indolor e não machuca.


Coraçãozinho


Todo bebê tem direito de realizar o teste de coraçãozinho ainda na maternidade, entre 24h a 48h após o nascimento. O teste é simples, gratuito e indolor. Consiste em medir a oxigenação do sangue e os batimentos cardíacos do recém-nascido com o auxílio de um oxímetro - espécie de pulseirinha - no pulso e no pé do bebê. Caso algum problema seja detectado, o bebê é encaminhado para fazer um ecocardiograma. Se alterado, é encaminhado para um centro de referência em cardiopatia para tratamento.


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