Ricardo Tozzi fala de nova peça teatral e sobre os 14 anos de carreira

Ator está na peça Os Guardas do Taj, em cartaz no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, até 17 de fevereiro

Por: Stevens Standke  -  28/01/19  -  18:04
Em entrevista, Ricardo Tozzi fala de nova peça teatral e dos 14 anos de carreira
Em entrevista, Ricardo Tozzi fala de nova peça teatral e dos 14 anos de carreira   Foto: Reprodução/Facebook

Em 2019, Ricardo Tozzi completa 14 anos de carreira e de sucesso principalmente na televisão. Mas o que nem todo mundo sabe é que, antes disso, o ator de 43 anos foi um executivo renomado que, por não estar contente com os rumos que a sua vida tomava, experimentou primeiro pintar quadros e, na sequência, foi estudar teatro à noite e escondido. Essa experiência tem levado Tozzi, inclusive, a ministrar algumas palestras, mesmo que ainda de forma tímida, sobre realização profissional. Natural de Campinas (SP), o ator, que adotou o Rio de Janeiro como seu endereço oficial, pode ser visto na peça Os Guardas do Taj, em cartaz no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, até 17 de fevereiro.


No espetáculo escrito pelo norte-americano Rajiv Joseph, o ator divide o palco com um grande amigo, Reynaldo Gianecchini, para narrar a história de dois guardas e amigos de longa data designados para proteger o Taj Mahal, na Índia, antes da inauguração. E não só por estarem proibidos de olhar para o palácio como por terem de cumprir os caprichos do imperador, esses oficiais fazem, no decorrer da peça, um verdadeiro questionamento dos valores sociais. “Em cena, acontece uma troca intensa entre mim e o Giane. A gente está ali de coração aberto. Um não quer aparecer mais do que o outro, o que é raro no nosso meio. Acho ego um saco”, afirma Tozzi. Apaixonado por astrologia e decoração, o ator ainda fala, na entrevista abaixo, da sua criação de dogues alemães.


Autoconhecimento


Os Guardas do Taj se passa na Índia, em um contexto bem distante do nosso. Ficou preocupado com o modo como o público ia reagir à peça?


Não, porque o texto estabelece uma conexão com o mundo contemporâneo, com a vida que levamos hoje em dia. Tudo bem, o espetáculo gira em torno de dois guardas imperiais, de 1648, na Índia. Mas, por meio deles, vemos que continuamos aprisionados às imposições da sociedade, tentando nos adequar ao que os outros esperam de nós. Eu acho que podemos encarar a vida de uma forma mais peculiar. Devemos nos questionar sobre o que realmente importa, fazer escolhas com o nosso coração. É muito louco perceber o quanto a gente ainda faz coisas em função das expectativas da mãe, do pai, da mulher, dos colegas e professores da escola, das pessoas do trabalho... Então, tem que casar, ter filho etc. Em que momento nos perguntamos o que faz sentido para nós? Se não buscamos esse autoconhecimento, procurando entender nossa missão na Terra, deixamos de fazer o que é preciso. Tem gente que começa a contestar as coisas logo e, aí, dá tempo de reagir. Mas algumas pessoas só entendem que fizeram tudo errado quando já é tarde.


Você deve se identificar bastante com o espetáculo. Afinal, largou uma carreira consolidada de executivo para se tornar ator.


O texto, sem dúvida, me faz lembrar o que vivi. E no fundo, acho que tenho obrigação de abordar esse assunto, pois possuo esse case da minha própria transição, muito radical, de vida, que foi baseada numa busca totalmente pessoal. Seguindo a minha intuição, de certa forma, cheguei aonde me sinto muito mais feliz e completo. Sempre que puder vou falar sobre isso. Tenho dado até algumas palestras sobre o tema, porque percebo uma necessidade de fazer as pessoas se questionarem.


Como anda esse cronograma de palestras?


Ainda o conduzo de forma tímida, pois trabalho bastante. Quando era executivo, também dava algumas palestras, elas eram sobre carreira e vocação. Apliquei na minha vida um pouco do que falava para colegas de empresa e para estudantes universitários. Sabe, conforme você se aprofunda nesse tipo de assunto, começa a questionar até a própria vida. Hoje, as minhas palestras estão diferentes, porque tenho uma história para contar. Acho que a melhor maneira de as pessoas pensarem na vida delas e aprenderem algo é ouvindo o relato de alguém. Não deixei para trás uma carreira frustrante. Pelo contrário, eu era muito bem-sucedido. Isso agrega valor ao que tenho para dizer, mostra a relevância do que senti, conforme a vida ia sinalizando que talvez o meu caminho fosse outro. Precisei me empoderar para ter coragem de mudar tudo e abdicar de uma ótima condição financeira. Além disso, investi na minha formação, com curso, por exemplo, na Universidade de Nova York. Nesse período de transição, estava em um dos melhores MBAs do mundo, o da Thunderbird School of Global Management (em Phoenix, EUA). Mas pensei: “A vida é uma só. Se não fizer isso, vou me arrepender”.


Transição


O que despertou essa vontade de mudar tudo?


Quando você faz sucesso, é cobrado de uma série de coisas. Essa pressão começou a me incomodar de tal forma que me questionei: “Quer dizer que a minha vida será assim?” Junto a isso, foi batendo uma angústia, uma sensação de que estava no lugar errado. Sem falar que para o executivo, por mais que troque de empresa, a tendência é encontrar um contexto profissional basicamente igual. Não podia reclamar, era privilegiado, só que o trabalho começou a me desinteressar, passei a achar aquilo chato. As pessoas têm de fazer escolhas de vida muito cedo sem experiência suficiente, e geralmente erram. A minha transição de carreira foi um pouco mais responsável do que parece. Eu a estruturei com cuidado.


Como foi esse processo?


Já que não sabia qual era o meu lugar, resolvi fazer algo que o meu íntimo, até então, me impedia: ter um hobby relacionado à arte. Foi assim que passei a pintar quadros, o que não tenho conseguido fazer mais por falta de tempo. E aí veio aquela história de o universo conspirar a favor. Três meses após começar a pintar, tinha produzido 11 telas e nove delas, por puro acaso, acabaram sendo expostas e vendidas no prazo de duas semanas. Esse foi o primeiro tapa na cara que recebi do universo. Foi como se dissesse: “Meu amigo, você pode fazer o que quiser, desde que siga o seu coração”. Com o tempo, fui estudar teatro, algo com o que sempre sonhei e que demorei para assumir para mim mesmo. Essa época foi uma loucura! De dia, tinha de lidar com as responsabilidades da minha carreira de executivo e, à noite, fazia teatro escondido.


Não contou para ninguém?


Não, pois eu, primeiro, precisava entender o que estava acontecendo, e aquilo era extremamente pessoal. Também não combinava um executivo, que carregava o nome de uma grande empresa e falava de macroeconomia, se pôr a estudar teatro. Ficou muito claro para mim que precisava haver esse tipo de separação. Até porque, quando tudo começou, não imaginava que ia me tornar um ator profissional. A vida é assim. A gente vai dando chance para nossa essência e para nossa intuição e as coisas vão ocorrendo aos pouquinhos. Apenas troquei de carreira quando realmente me senti um ator de verdade. O que demorou quatro anos para acontecer.


Alguém já falou: “A sua história me incentivou a mudar de vida”?


Já recebi esse feedback algumas vezes. Houve tanto gente que disse que estava com a mesma sensação que tive no passado quanto pessoas que contaram que começaram a se questionar depois de ouvir o meu relato. Por isso é fundamental falar sobre o assunto. Lembro que, aos 21 anos, fiquei chocado com o comentário do Robert Wong, um headhunter renomado, de que a gente só pode ser feliz se fizer escolhas com o coração. Isso foi reverberando dentro de mim e deu no que deu.


Futuro


Você faz aquele exercício de projetar onde gostaria de estar, por exemplo, daqui a dez anos?


Essa é uma pergunta que eu fazia quando entrevistava alguém para uma vaga de emprego (risos). Porque tentar enxergar lá na frente e se analisar com um certo distanciamento é superimportante para sair um pouco do óbvio e ser mais bem-sucedido. Afinal, na vida, a gente é estimulado a ficar no lugar-comum. Eu já estou onde nem almejava chegar: fazendo o que amo. É fato que vou ser ator até morrer. Portanto, a partir de agora, o meu compromisso, a minha responsabilidade, é me aprimorar cada vez mais.


Já que estamos falando das expectativas sociais, lida numa boa com as eventuais cobranças ou mesmo os comentários que as pessoas fazem por você, aos 43 anos, não ter casado e sido pai?


Não estou nem aí para isso. O importante é estar feliz com você mesmo. E consigo separar muito bem a vida pública da privada. Há horas em que simplesmente fecho a porta e ninguém passa. A gente acaba aprendendo a fazer isso, entende? É assim que me sinto à vontade, porque sou bem low profile. Não é algo pensado, considero uma postura de alma. Sempre fui assim na minha.


Estética


Tem algum grilo com a idade?


Tenho zero problema com isso. Acho que a minha vaidade, hoje, está muito vinculada ao trabalho. Me preocupo mais com a estética de um personagem do que com a minha no dia a dia. Você acaba relaxando um pouco no cotidiano, deixa de ligar tanto para si, quando tem que criar novas aparências com regularidade. A minha vaidade também vem da busca por bem-estar. Gosto de ficar em forma, de me exercitar, costumo praticar musculação.


Houve um motivo especial para, recentemente, cortar o cabelo bem curto?


Foi para rodar, há cerca de três meses, um filme uruguaio, que tem lançamento previsto para 2020. Ainda não estou autorizado a dar detalhes do projeto. Posso dizer somente que o diretor queria que eu ficasse com cara diferente, então raspei tudo. Mas sou leonino, bicho. Me ligo bastante no cabelo, em topete. Vou me livrar disso um dia (risos).


Foco


Pretende fazer mais cinema daqui em diante?


Amo um filme, sou cinéfilo. Mas o cinema brasileiro ainda é precário, por falta de dinheiro, de estímulo... Recebo convites para diversos projetos, só que, como geralmente eles não me interessam, acabo dando prioridade para o teatro e a televisão. Acho que, independentemente do veículo, o que importa é o trabalho fazer sentido para você.


Como lida com o rótulo de galã?


Às vezes, isso me incomoda um pouco. O que é o galã, senão um ator que também pode fazer outros papéis? Mesmo assim, tenho consciência de que a televisão, para cumprir seu propósito de comunicar com velocidade, tende a usar os estereótipos e você, nesse processo, corre o risco de ser tachado pelo que aparenta em um primeiro momento. O meu último personagem na TV, o Xavier da novela Orgulho e Paixão, me desafiou nesse sentido. Interpretar um vilão é algo que tira a gente da zona de conforto.


Caseiro


Quais são os seus hobbies atualmente?


Gosto bastante de cachorro. Crio dogue alemão, tenho três. Meu ascendente em Câncer me faz caseiro. Por isso considero a minha casa de campo em Secretário, na Serra Fluminense, um hobby. Como me interesso por decoração e design, participei ativamente da construção do imóvel. Lá é bem roça. Tenho vacas, produzo queijo. É uma vida mais tranquila, exatamente do jeito que eu curto.


Serviço


Os Guardas do Taj tem sessões sextas e sábados, às 20 horas, e domingos, às 18. As entradas variam de R$ 30 a R$ 70 no www.ingressorapido.com.br. O Teatro fica na Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista.


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