Pesquisa revela que fazer refeições à mesa traz benefícios físicos e emocionais

A hora da refeição é corrida para muitos pais, mas juntar-se aos filhos, ao invés de cada um comer num canto, pode ser uma ótima meta para 2020

Por: Joyce Moysés  -  18/11/19  -  17:05
“As pessoas geralmente se abrem mais nessa situação de descontração”, diz Claudia Melo, psicóloga
“As pessoas geralmente se abrem mais nessa situação de descontração”, diz Claudia Melo, psicóloga   Foto: Brandless/Unsplash

A Universidade de Harvard se propôs a analisar 15 anos de pesquisas acadêmicas sobre refeições familiares e confirmou: traz benefícios físicos e emocionais, e ainda favorece taxas menores de uso de drogas e de depressão, maior resiliência, vocabulário ampliado, menos obesidade e até notas melhores na escola e nos vestibulares. Há até um site (thefamilydinnerproject.org), do projeto homônimo abrigado dentro da universidade, que indica receitas e tópicos de conversa para quem se cadastrar. 


“A gente pensa sempre que sentar à mesa traz conexão, aproximação e intimidade, pois todos conversam, riem, falam de coisas interessantes... Nós não saímos para jantar com quem não temos intimidade, a não ser que seja um jantar de negócios. As pessoas geralmente se abrem mais nessa situação de descontração. E, se repararmos bem, quando os jovens estão à mesa, acabam se expondo mais”, opina a psicóloga Claudia Melo, incentivando pais a aproveitarem esse momento para trazer os filhos para perto, de forma mais tranquila. Se for de outra forma, com cobranças, a hora de comer vai ser tensa. 


Claudia, que tem formação em Terapia Cognitivo Comportamental, Brainspotting (ferramenta neurobiológica de apoio na relação clínica terapêutica), Técnicas de Atendimento Psicoterápico a Criança pela UERJ e Testes Psicológicos pelo Instituto de Psicologia Crescer, sugere “temperar” esse jantar em família com afeto, pensando em fortalecer vínculos, e criar um outro momento para broncas, estímulos a mudanças de hábito ou a estudar mais. Durante o diálogo, vale atenção ao que os jovens realmente querem, lembrando que vários não querem muito além de escolher o sabor da pizza e de serem ouvidos sobre seus gostos pessoais...”. 


A psicóloga percebe pais que acreditam que nunca vão alcançar essa aproximação: “Na adolescência será mais difícil. Então, criem uma base de confiança antes, na infância, para ter retorno positivo nas fases seguintes. Caso não seja possível, tomem a iniciativa de conversar, pedir perdão, demonstrar transparência, para reparar o laço daqui em diante. Essa aproximação é mesmo desafiadora. Sem entender as necessidades dos filhos, dificilmente haverá conexão, pois eles são seletivos (não conseguem estar com quem não querem estar)”. 


Adolescentes seletivos  


A psicopedagoga, coach e orientadora vocacional Georgea Vianna, que acaba de criar o projeto Espaço de Pais, visando facilitar a relação com seus filhos adolescentes, concorda. “Tudo vai depender do tipo de relação que os pais construíram com os filhos desde o nascimento deles, ou até antes. Mas é claro que pode ser mudada, pois somos pessoas que vamos mudando ao longo da vida. Desde que não seja algo forçado, é importante ter proximidade com os adolescentes, por ser uma fase de conflito grande devido à busca da identidade (então, muitas vezes, eles se afastam). Se a nossa companhia nas refeições, enquanto pais, for agradável, as conversas vão fluir bem”, avalia. 


Um dos cuidados, segundo Georgea, é de o papo não virar interrogatório (“E aí, como foi seu dia?”, “O que você fez?”...). Alguns adolescentes vão contar e outros, não; e devemos respeitar. Além disso, filhos aprendem com exemplos. Por isso, pais que não se alimentam de forma saudável ou comem grudados no celular devem se atentar a isso. 


A psicopedagoga sugere combinar não só de comer juntos, mas de preparar o jantar juntos. Que tal uma noite do hambúrguer gourmet? “Nessa hora, evite reclamações como “Nossa, você é bagunceiro” ou “Aposto que você não vai me ajudar”. E todos podem fazer combinados, como de deixar os celulares na bancada ou de falarem sobre séries de TV, de forma a entrar um pouco no mundo deles. 


Assuntos que facilitam conflitos, como religião, podem ficar para outra hora. “Há jovens que estão cheios de ideais; e, se dialogam com pais completamente desiludidos com a política e a economia do País, podem sair da mesa se arrependendo de ter estado ali. Aproveite o momento para planejar a próxima viagem de férias, rir de uma história engraçada, falar dos sonhos e ambições de cada um para 2020”, conclui Georgea. 


Cozinhar junto com os filhos faz bem  


Um bom caminho para estreitar o relacionamento, ensinar diversas lições e ainda fazê-los se alimentar melhor. Um artigo publicado na revista Appetite diz que as crianças que cozinham comem mais vegetais. Para chegar a tal conclusão, os cientistas avaliaram 47 famílias com filhos entre 6 e 10 anos de idade. Elas foram convidadas a preparar uma refeição bem variada: frango empanado, salada, couve-flor e macarrão. Metade das crianças auxiliou o pai ou a mãe no preparo, montando a salada ou ajudando a empanar o frango, enquanto os demais ficaram brincando ao passo que um dos pais cozinhava sozinho. O resultado: as crianças do grupo mestre-cuca comeram 76% mais salada e 27% mais frango, assim como ingeriram 25% mais calorias em geral.  


A coordenadora do curso de Gastronomia da São Judas - Unimonte, Fatima Duarte, ressalta que essa prática é importante para resgatar a refeição caseira e evitar o fastfood. “Traz a união entre pais e filhos, já que cozinhar é um ato de amor, que se propaga na hora de comer. Hoje, com a vida corrida e estressante, cada vez mais temos que trazer nossos filhos para perto da gente, seja criança ou adolescente”. A saúde também conta. “Cozinhando podemos escolher melhor o que comemos, além de economizar comprando o que é da época. Esse é um dos princípios do slow food: alimento limpo, bom e justo, feito com as pessoas que você ama”, diz Fátima. 


A cozinha, no entanto, é um ambiente onde acidentes acontecem. Por isso, cuidado! É preciso acompanhar. Mesmo uma criança maior, com domínio, é ainda uma criança. Você tem que dar liberdade para ela errar, mas sempre com supervisão. Facas e superfícies quentes devem ser evitadas. Já ensine que é preciso higienizar as mãos e usar cabelos presos para cozinhar. Regras, disciplina e limpeza são princípios que se aprende brincando e com leveza na cozinha. (Colaborou Fernanda Lopes) 


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