Paixão pelo churrasco destaca artesão de carne renomado em Santos

Domingos Neto é conhecido como Netão, apelido que ganhou de suas centenas de milhares de admiradores, ávidos por seu conhecimento e sua paixão pelo churrasco

Por: Fernanda Lopes & Da Redação &  -  12/08/19  -  17:42
Domingos Neto, o Netão, preza pela qualidade das carnes e novos cortes
Domingos Neto, o Netão, preza pela qualidade das carnes e novos cortes   Foto: Alexsander Ferraz/ AT

Com 33 anos, o açougueiro, churrasqueiro e empresário santista Domingos Neto, o Netão, como é conhecido por todos, tornou-se um dos especialistas em carne mais renomados do País. Participa de vários festivais nacionais e esteve nos Estados Unidos, onde fez um tour de churrasco pelo Texas. Sua grande paixão é a carne de qualidade e os novos cortes. Para isso, realiza um trabalho de parceria com fazendeiros e produtores, para oferecer diferenciais aos restaurantes e hamburguerias da Cidade. Ele indica, a seguir, qual o corte de carne que está na moda e, ainda, como prepará-lo. Também dá dicas para fazer um bom hambúrguer.


Trajetória


Como começou essa sua paixão pela carne?


Desde os 7 anos, acompanhava meu tio no açougue dele. Ele é meu padrinho e a gente sempre foi muito próximo. Ia nas viagens aos frigoríficos e, assim, começou a paixão. Eu tinha o sonho de ter o açougue dele, que hoje é meu, apesar de não ter comprado dele.


E quando foi que passou a trabalhar com isso?


Quando tinha 16 anos, fui trabalhar no açougue do meu tio. Depois, ele vendeu e consegui comprar de quem comprou dele. Meu tio é um homem de negócios, não um apaixonado pelas carnes como eu. Hoje, trabalha com gelo e carvão.


Sua especialização em churrasco aconteceu como?


O churrasco sempre esteve na minha vida. Meu pai teve uma churrascaria. Como eu tinha o objetivo de comprar o açougue, trabalhava de dia nele e à noite na churrascaria para juntar dinheiro. Além disso, toda festa de família é em volta da churrasqueira. E eu sempre gostei de ficar ali.


Evolução


A forma de se fazer churrasco mudou muito no Brasil?


Sim. Primeiro, por causa da evolução da qualidade da carne. Antigamente, a gente tinha que fazer a carne no espeto, um pouco longe da brasa, para que ela fosse assando lentamente e, assim, ir amaciando, transformando o colágeno em gelatina. Ela era mais dura. Agora, a gente tem uma carne macia. Meu objetivo é mostrar ao público como preparar o corte de qualidade. Grelhando e não assando como antes. Porque grelhando, você mantém a suculência da carne.


Como se faz isso? Qual é a distância da carne para a brasa?


Quando você vai comer uma carne, procura maciez, sabor e suculência. O corte de qualidade já é macio e a suculência se mantém grelhando em alta temperatura, fazendo a caramelização das proteínas. Ela dá o sabor que a gente gosta no churrasco. Indico duas distâncias: para o churrasco profissional, no qual o churrasqueiro fica com a atenção total na carne, uma distância mais próxima, entre 15 cm e 18 cm do fundo da churrasqueira, que é mais rápido e aumenta a suculência. Já no doméstico, indico de 20 a 22 cm de distância entre a carne e o fundo, porque a atenção é dividida com a família e amigos. Deixar um pouco longe da brasa, evita que queime.


Além da qualidade, mudaram também os tipos de corte no Brasil? 


Como a carne tem mais qualidade, a gente consegue extrair do gado brasileiro cortes que antes não conseguia. Agora, usamos referências de cortes estrangeiros. Quando falamos de prime rib, usamos uma referência britânica ou norte-americana; assado de tira é de origem uruguaia ou argentina.


Temos cortes brasileiros de assinatura?


A picanha é o corte mais usado no País e não tem no resto do mundo, exceto na Argentina e no Uruguai. Mas eles não o usam muito. Esse corte é o preferido desde que os pampas começaram a fazer churrasco. É tradição. Fora isso, é mais uma adaptação dos cortes estrangeiros. Por exemplo, nós fazemos a fraldinha red, sem gordura nenhuma, que é ótima para o churrasco.


Tendências


O que está surgindo de novidade?


Nós tivemos sempre no Brasilia carne produzida totalmente a pasto. Recentemente, começamos a terminar a produção no confinamento para aumentar o marmoreio, dar padronização da camada de gordura e, assim, melhorar a qualidade final. Agora, está voltando a produção a pasto. Esse nicho tem crescido. Porém, o movimento forte é o da evolução da carne de qualidade. Há três anos, a qualidade era uma; agora já está bem maior e o consumidor se mostra exigente. O açougue é fundamental nessa cadeia de produção. Ele pode colocar a perder todo o trabalho.


O que faz uma carne ter qualidade?


Seleção genética, um bom manejo, um embarque bem feito para o transporte, um bom abate, uma boa maturação, um bom armazenamento e uma boa manipulação.


As raças como Angus e Black Angus realmente são mais nobres e melhores?


Doa a quem doer: não basta a raça. Se você pegar o Angus de uma genética ruim ou, se mesmo tiver um de qualidade boa, mas a sua criação for ruim, ele não terá uma carne de qualidade. Não adianta, precisa seguir todas as etapas do processo. O nosso Nelore do dia a dia pode ser muito bom.


O Nelore é a raça mais comum no Brasil?


Sim, é a carne commodity. Hoje, existe um projeto no País de um Nelore de altíssima qualidade, chamado Nelore do Golias, de Birigui, São Paulo. Ele é extremamente macio e marmorizado. Eles foram buscar uma genética antiga de Nelore e, agora, estão produzindo essa nova.


A churrasqueira ainda é um reduto masculino?


Ainda é, mas, a cada dia, vemos mais mulheres dominando muito a arte do fogo e da carne. Tanto no mercado quanto nos ambientes domésticos. Todo festival de churrasco tem de 15 a 20% de mulheres comandando estações. Nos meus workshops, esse público também está crescendo. Teve um grupo de mulheres que se preparou para os 10 KM Tribuna FM – Unilus e combinou que, após a prova, faria um workshop de churrasco como comemoração. Foi bem bacana.


Orientações


Para um churrasco, o que você indica como o corte do momento?


A picanha é a paixão do brasileiro, mas, hoje, o flat iron é o frenesi do momento. Ele figura como o último corte a ser descoberto. Foi desenvolvido por um instituto norte-americano. E nada mais é do que um corte retirado da paleta. Porém, tiram-se todas as fibras e gorduras e deixa-se só aquela carne macia e saborosa. No teste da mordida, ele é o segundo corte mais macio do boi, perdendo somente para o filé-mignon. A diferença é o sabor. O mignon precisa de molho, tempero. O flat iron é rico em sabor. Para quem gosta de carne magra e macia, ele é o ideal. Pode ser preparado na churrasqueira ou frigideira. Só não se deve fazer ensopado, porque desmancha rápido. Ele é um corte dianteiro, que, antigamente, seria considerado um corte de segunda. Para prepará-lo, coloque sal de parrilla em toda a peça e leve à churrasqueira. Coloque na grelha com a brasa bem forte e deixe por um minuto e meio de cada lado. Retire do fogo, deixe descansar por alguns minutos, fatie e sirva. É importante que toda carne descanse antes de ser fatiada. 


Como é que se prepara uma boa picanha, a carne preferida do brasileiro?


Leve a peça inteira à churrasqueira em brasa forte e deixe selar por três minutos de cada lado, para dourar bem a gordura. Retire da brasa e corte a picanha em steaks ou tiras (na perpendicular) e volte para a grelha por mais três minutos de cada lado. Retire e deixe descansar por um minuto. Fatie e coloque flor de sal ou sal de parrilla para servir.


Quanto de carne devemos calcular por pessoa em um churrasco?


O cálculo de carne normalmente é de 300g por pessoa, mas, em um churrasco, essa estimativa sobe um pouco. Utilizo nos meus churrascos a base de meio quilo por pessoa. 


Oficinas


Seus workshops fazem sucesso. Como tudo teve início?


O motivo de tudo isso é que, cada vez mais, as pessoas querem aprender a preparar os novos cortes e também hambúrgueres.


Os festivais de churrasco estão ficando comuns. Vai a muitos?


Tenho ido a poucos agora, escolho os que são grandes. Seleciono os que realmente têm muito público e que também sejam bacanas, que ofereçam uma boa experiência para quem participar. Eu já fui a eventos que não condiziam com minha proposta. Passei a avaliar bem antes de ir.


Você me disse que seu maior foco é o trabalho com o comércio de carnes. Pensa em crescer? Porque parece que o seu açougue se tornou pequeno...


Sim. Sem dar spoiler, vem coisa boa por aí, algo inédito em Santos. Quando estiver tudo certo, vocês serão os primeiros a saber. Sempre pensei que o marketing deve estar no mesmo nível da qualidade da carne que eu vendo. Agora, que estou com uma carne de alta qualidade, posso crescer.


Quantos restaurantes e hamburguerias você atende na Cidade?


Certamente, mais de 200, sem contar os marmiteiros. Faço blends exclusivos para cada hamburgueria. Realizamos entregas diárias para cada um, com horário marcado. Eu me especializei em hambúrguer. Fui o único açougueiro a fazer o curso do maior especialista em hambúrguer do mundo: o norte-americano George Motz. Ele mesmo falou, no workshop, que era uma pena que açougueiros não fizessem o seu curso e se surpreendeu quando eu disse que era um.


Para você, qual o melhor blend de hambúrguer para fazer em casa?


Uma mistura para fazer em casa é a de peito de Angus, que tem gordura entremeada na carne, com acém do meio de Nelore. Em qualquer proporção. Os dois são muito saborosos. Se for mais gordo, põe mais peito. São cortes baratos e fáceis de encontrar.


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