Home office na pandemia criará nova forma de trabalho

Novo jeito de trabalhar será bem mais híbrido e vai favorecer vida mais equilibrada

Por: Joyce Moysés  -  18/05/20  -  15:13
Quando tudo passar, as formas de trabalho terão mudado e se adaptado
Quando tudo passar, as formas de trabalho terão mudado e se adaptado   Foto: adobe stock

Ah, a eterna dualidade humana... "Quem estava na empresa desejava estar em casa (in home) e vice-versa. Esse mundo não mudou, ele virou do avesso! Principalmente o do trabalho, que em 60 dias modificou-se mais que nos últimos 10 anos", avalia a consultora Lúcia Helena S. Cordeiro, Mestre em Administração, Educação e Comunicação, especialista em Desenvolvimento Humano & Inovação Organizacional, co-Fundadora do LAB4D - Laboratório de Inovação. 


Ao saber que há profissionais com saudade de ir ao escritório, ela pergunta: trabalhar em home office é privilégio ou castigo? E lembra que a tecnologia (criada por nós) já objetivava reduzir as horas trabalhadas dentro das organizações, para que sobrasse mais tempo e garantisse qualidade de vida - um conceito variável de pessoa para pessoa. "Esse tempo chegou. A pandemia agiu como catalisador desse novo mundo, trouxe o isolamento social. Empresas, em poucos dias, tiveram de estabelecer como continuar assegurando resultados. Líderes tiveram que aprender que não faz mais sentido a gestão pelo controle, e sim pela confiança."


Mas, afinal, home office é para todo mundo? Lúcia Helena visualiza três grupos. No primeiro estão aqueles que, de forma mais organizada e disciplinada, desenvolvem melhor suas tarefas em locais de baixo nível de interferência, humana ou tecnológica. Esses até já se disponibilizaram a continuar trabalhando de casa após essa fase de isolamento social, "alegando que apenas estão geograficamente distantes, mas jamais distantes socialmente, graças às plataformas virtuais, onde conseguem ver, ouvir, serem vistos e ouvidos de forma mais objetiva". 


Outros precisam estar presencialmente com diferentes profissionais: para troca de ideias, acolhimento, papo no café. A expert considera um terceiro grupo, que afirma estar gostando da experiência home office, mas, por causa do excesso das demandas domésticas, optam por voltar ao escritório no futuro breve. 


De fato, somos seres sociáveis e estar com o outro potencializa nosso crescimento e evolução. Mas, na opinião de Lúcia Helena, podemos exponenciar isso pela tecnologia. "Inúmeras são as ferramentas virtuais que nos permitem 'estar juntos', como Lives, Webinars, Vídeos, WhatsApp, Stream Yard, além de podermos, no pós-isolamento, estar presencialmente com quem quisermos. Mas também devemos respeitar aqueles que prezam pelo toque, abraço, olhar e até silêncio das pessoas presentes, em seu entorno, profissional e familiar." 


A consultora avisa que o mundo do trabalho está se configurando como "PhyDigital" (físico + digital). "Ou seja, estaremos ora em home office, ora no escritório ou espaço de trabalho, conciliando interesses pessoais e profissionais e fazendo os empregadores reduzirem despesas com transporte, energia e outras). Você está em casa, deu saudades do local de trabalho? Dos amigos? Precisa estar com gente? Acelera resultados estando olho no olho? Vai até lá! Simples assim."


Para Lúcia Helena, neste novo mundo do trabalho seremos cobrados e remunerados por entregas diferenciadas, inovadoras; e não mais pelo tempo à disposição na empresa. Este novo formato "híbrido" propiciará mais foco em resultados, autoaprendizado, convivência harmônica, colaboração, compartilhamento, troca de experiências (mesmo que à distância), visando maior equilíbrio de vida.
Há um certo romantismo.


Muitos profissionais que estão trabalhando em casa se viram precisando trabalhar, cozinhar, limpar, brincar... dia após dia. Tendo que ser professores dos filhos, inclusive. Gabriela Savóia, psicóloga clínica especializada em Saúde Mental do Trabalhador, avalia que, antes da pandemia, o home office vinha sendo usado como uma espécie de benefício das empresas a seus empregados. 


"Por permanecermos jornadas longas fora de casa, às vezes deixando filhos sozinhos ou com cuidadores, poder gozar de um dia semanal de trabalho ou até dois ser ir ao escritório, parecia um sonho. Era a grande possibilidade de almoçar com os filhos e levar à escola; ou apenas de estar num cenário diferente, para variar". Agora que o home office é realidade diária e até compulsória, o quadro muda de figura. 


"Há uma ideia romântica de que trabalhar em casa todos os dias, sem o apoio necessário e com filhos por perto, é um ganho ou benefício. Ledo engano! Nesse atual cenário, profissionais estão se desdobrando para dar conta de seus prazos e reuniões, junto com os tratos com os filhos, comida, limpeza... muitas vezes com pouco ajuda", opina a psicóloga e consultora de RH.


A psicóloga acha natural, portanto, que muitos profissionais sintam necessidade e desejo de retornarem à sua antiga rotina, ao fim do isolamento: "Não só para garantirem seu espaço como também para não adoecerem frente tantas funções e tarefas a desempenhar ao mesmo tempo. Isso traz um esgotamento físico, mas principalmente mental".


Perde-se a interação das equipes


 Entre fazer home office e ir ao escritório, Ronney Teixeira Cardoso, CEO da Tagia Importadora de peças automotivas das marcas Volda e Takao, não pensa duas vezes para responder: "Melhor ir ao escritório. Permite o contato não verbal com a equipe (gestos falam mais que palavras), e consigo ter uma melhor leitura do time e dar feedbacks mais assertivos. Acho produtivo que coloquem indicadores escritos a mão em vidros, quadros e flip charts, e todos observem. Além disso, fazer reuniões perto dos maquinários é produtivo e permite manutenção preventiva com a opinião de todos".


Entretanto, Ronney reconhece a necessidade de trabalhar de casa neste momento em que é necessário conciliar trabalho e saúde: "Fazer as refeições com a família, dar e receber apoio... Estar próximo de quem amamos é fundamental!" Por ter nascido em Santos, ter vivido a juventude no Rio de Janeiro e atualmente morar no Espírito Santo, ele acredita que seja muito difícil ficar dentro de casa, pois "as pessoas que moram em cidades de praia geralmente são mais sociáveis e as conversas não ficam somente em torno de trabalho. A praia democratiza a amizade e faz com que todos sejam mais simples e humanos".


Ele concorda com a psicóloga Gabriela sobre a importância de cuidar da saúde mental para reduzir a saudade daquela rotina fora de casa. "As pessoas que meditam tem conseguido manter mais a serenidade, e também é boa ideia pegar receitas de comidas mais saudáveis na internet para fazer junto com a família", sugere o CEO, que também se exercita com abdominais, flexões de braço e... tarefas domésticas ("gasto muitas calorias e ainda deixo a esposa feliz").


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