Delivery de afeto é nova onda da região

Bilhetinhos, flores, mimos e outras formas de carinho estão substituindo o vazio deixado pela falta dos abraços entre amigos, familiares e também empresas

Por: Sheila Almeida  -  12/04/20  -  20:35
Vera Leon recebeu buquê da floricultura que lançou campanha Compartilhe o Amor
Vera Leon recebeu buquê da floricultura que lançou campanha Compartilhe o Amor   Foto: Arquivo pessoal

“Meu aniversário já tinha passado fazia uma semana. Mas o interfone tocou... Quem me mandaria flores assim, sem motivo? Peguei o buquê ainda cismada e, quando vi que foi a própria floricultura que enviou, achei aquilo um gesto tão grandioso, generoso e de uma sensibilidade tão rara até para uma pessoa, quanto mais para uma empresa”.


Assim começou uma tarde de Vera Leon, jornalista, mentora e analista junguiana, surpreendida com uma campanha que tem espalhado alegria por aí. É  #CompartilheoAmor, que a floricultura Gardênia, de Santos, começou há cerca de duas semanas, alegrando e colorindo o lar de quem está em isolamento social, devido à covid-19.


Felipe Villarinho Alvarez, dono da Gardênia, explica que tudo veio da vontade de mandar um mimo para os vizinhos dos pais. “São pessoas sozinhas. Muitos se emocionaram e pensei: ‘Sabe de uma coisa, vou mandar para os amigos e clientes também”, conta sobre o ramalhete embrulhado com papel craft, todo carimbado com as palavras amor, amizade e sonhos. Quem quiser pode pedir igual que a floricultura entrega como presente.


Confeitaria Adriana Nunes entrou na onda e passou a divulgar os bilhetes 
Confeitaria Adriana Nunes entrou na onda e passou a divulgar os bilhetes    Foto: Divulgação

A empresa não é a única a espalhar essa vibe positiva. A empresária e confeiteira Adriana Nunes foi ‘infectada’ por essa onda do bem, a partir de um pedido. 


“Uma avó mandou mensagem para mim e falou: ‘Meu netinho adora brigadeiro. Você poderia escrever no bilhete que o doce é da vovó Jô para o Pedro?’ Achei fofo e postei no Instagram. Depois disso, nossa, um monte de gente começou a pedir, por exemplo, bolos para entregar a alguém e eu passei a escrever recadinhos, com o desejo de que aquilo possa adoçar essa fase tão amarga que estamos passando”.


Flávia Albuquerque passou a enviar e receber mimos de amigos e vizinhos.
Flávia Albuquerque passou a enviar e receber mimos de amigos e vizinhos.   Foto: Arquivo pessoal

A vendedora e blogueira Flávia Albuquerque ainda nem tinha visto nada disso quando também sentiu vontade de enviar às amigas enfermeiras qualquer coisa que as fizesse se sentir melhor.


“Pedi o endereço de uma e falei para não se preocupar com o jantar. Enviei de surpresa uma pizza. Chorei com a reação dela. Esses pequenos gestos a gente já deveria ter o hábito de fazer no dia a dia, mas é bom reforçar agora. É copo de água para o lixeiro, bolos para o porteiro, para os vizinhos...”.


A psicóloga Bruna Leoneli ressalta que, por sermos seres sociáveis, necessitamos de contato. E, para algumas pessoas, o isolamento ajuda a aumentar os níveis de estresse e ansiedade – o que pode desencadear a depressão. Como presentear é uma forma de demonstrar amor, os mimos viram espécies de antídotos contra a distância, uma forma de carinho, quase um abraço, tanto para quem dá quanto para quem recebe.


“Quando recebemos um presente, sentimos que o outro lembrou e deu valor à relação. Ao presentear, a reação é parecida, o que é legal porque a pandemia trouxe à tona a importância dos relacionamentos. Nesse caso, presentear é como dizer que valoriza e sente falta daquele laço”. 


Para Flávia, que tem recebido mimos e bilhetinhos dos vizinhos desde que passou a enviá-los, a satisfação é multiplicada, um oásis próximo ao cenário atual. “A festa do meu aniversário foi cancelada devido à pandemia. Peguei o dinheiro e decidi fazer algo bom com ele. Escrevi cartas, gravei vídeos, postei, e ver as pessoas continuando isso é sensacional”.


Na opinião de Vera Leon, de algum jeito, essa oportunidade de repensar as relações é uma das coisas boas que podem ficar desse momento. “Enquanto muita gente se aproveita do problema, tem quem mostre que, se a coisa está feia, é possível dar uma colorida, uma perfumada. São gestos que nos fazem respirar fundo e pensar: ‘Puxa, ainda temos jeito e ainda dá para acreditar na humanidade’”.


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