Cohousing é forma diferenciada de viver para quem quer se integrar mais com a natureza e pessoas

Conceito promove o compartilhamento de direitos e tarefas

Por: Joyce Moysés  -  30/09/19  -  17:55
O conceito de cohousing é uma forma diferenciada de morar e viver
O conceito de cohousing é uma forma diferenciada de morar e viver   Foto: Adobe Stock

Já pensou em unir privacidade e a vivência em comunidade? Ter um espaço só seu, mas com vizinhos que podem se transformar em amigos? Compartilhar com eles várias coisas como despesas, lazer, horta, cuidados com os filhos?  E que tal aumentar o seu contato com a natureza e ainda envelhecer de uma forma solidária, em vez de solitária? Isso resume o chamado cohousing, e quem nunca ouviu falar nessa palavra precisa saber do que se trata tal inovação no jeito de se viver. 


Esse conceito enfatiza formar uma comunidade colaborativa, de moradores de várias gerações tendo casas independentes, mas desfrutando de instalações comuns e participando de todas as decisões via consenso. Ou seja, eles têm espaços tanto próprios quanto comuns, o que permite interagir com vizinhos, organizar atividades e cuidar uns dos outros. 


Um dos objetivos disso é resgatar o senso de comunidade nos centros urbanos, de acordo com a psicóloga Gisela Sartori Franco, santista que trabalha com educação e protagonismo juvenil na Capital e no município de Bertioga.


“É importante pensarmos em aproveitar melhor os espaços físicos, economizar dinheiro e tempo de deslocamento, só que o argumento que mais me sensibiliza é o de poder relembrar como é bom cuidar de si mesmo, dos outros e da natureza”, diz ela, que fundou O Mágico de Nós para desenvolver projetos que valorizam a magia das relações humanas. “Não é só trabalhar (em cooperação), mas também morar sendo coerente com o que prezo”.


Para adultos e crianças


Mais difundido na Europa, o conceito de cohousing já atrai interessados no Brasil, como professores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Há um ano, grupo orientado por Gisela se organiza para construir o Co-Lares no Mar em um terreno que eles estão “namorando” em Bertioga (conheça no www.colaresnomar.com). 


A bióloga Thais Horta Lotfi faz parte dessa turma. Nascida em Santos, foi trabalhar no Sesc de Bertioga e lá conheceu o marido, com quem tem duas filhas (de 1 e 4 anos).


“Quando nascem os filhos, nascem um monte de questões relacionadas com a educação e o mundo que queremos deixar para eles. Por exemplo: será que podemos criá-los de modo diferente de como fomos educados, para formar cidadãos mais conscientes e que possam ter convivência mais harmônica?”, reflete a bióloga, assim como outras mães que se mudaram para Bertioga atrás de mais qualidade de vida. 


Thais e essas amigas acabaram montando um coletivo que vem discutindo um novo modelo de educação e que se ajuda nos cuidados com as crianças. Elas se encontravam numa hospedaria até decidirem alugar em conjunto um espaço de convivência e educação no bairro Jardim São Lourenço, batizado de Quintal Arueira. 


Essas famílias desejam integrar a comunidade no Co-Lares no Mar. Tanto é que procuraram Gisela para poderem entender o projeto e têm cedido o Quintal para reuniões mensais do grupo. “Podemos repensar a nossa forma de vida – solitária muitas vezes”, opina Thais.


A proposta do cohousing, segundo Gisela, contempla o convívio social e participativo, relações de confiança com os vizinhos, economia colaborativa, práticas ambientais sustentáveis, processos de autogestão, design ambientalmente harmônico para enfatizar o contato entre os moradores e os espaços comuns abertos. Um ponto importante: criar oportunidades de engajamento com a comunidade do entorno por meio de serviços, projetos sociais e culturais que fortaleçam a cidadania de todos. 


Diversidade é bem-vinda


Na hora de formar um cohousing, diversidade é a palavra-chave. Podem e devem participar pessoas de diferentes idades e de diversas composições familiares, raças, gêneros, orientações sexuais, culturais e espirituais. Por exemplo: solteiros que estão atrás do senso de comunidade, casais que são ambientalmente conscientes, idosos procurando evitar o isolamento social, famílias que buscam locais para criar os filhos.


“Você deve estar disposto a abrir o coração, comprometer-se e ouvir. Às vezes, durante longos encontros, ganha a oportunidade de tecer melhores relações (lembrando que um amigo de verdade, estando próximo, nos ajuda a cuidar de nós mesmos), otimizar recursos naturais e reduzir o impacto do consumo administrando o lixo, fazendo compras conjuntas... Gosto de dizer que é uma aldeia na cidade, pois favorece conciliar as facilidades urbanas com os benefícios de viver em harmonia com a natureza. Além disso, o convívio entre crianças, jovens e os mais velhos traz benefícios para todos”, avalia Gisela Franco.


Como várias iniciativas de cohousing não vingam, a psicóloga alerta que “ainda há muito romantismo em torno da ideia de vivermos juntos – seja no casamento, seja com amigos. Queremos sempre os vizinhos que estão no nosso imaginário e não os de verdade, com qualidades e defeitos, gostos e manias, pensamentos e posturas diferentes das nossas. A questão é quanto estamos abertos a melhorar individualmente e também a acolher o jeito de ser dos outros”.


Thais Lotfi concorda e ressalta que conviver com iguais é fácil. “Devemos treinar a aceitação da diversidade, a arte da boa conversa e a paciência. Não é sempre que temos paciência, mas precisamos saber da importância de cultivá-la. Quem topar viver num cohousing pensando apenas na economia de dinheiro e tempo terá dificuldades de adaptação”, diz Gisela, avisando que as relações pessoais acabam definindo o sucesso da iniciativa.


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