Transparência, ética e a pandemia de Covid-19

Do orçamento de R$ 226,8 bilhões anunciado em novas despesas para o enfrentamento da pandemia, R$ 56,5 bilhões já foram efetivamente desembolsados

Por: Júnior Bozzella  -  03/08/20  -  11:40
Atualizado em 03/08/20 - 11:41
Pandemia do coronavírus já vitimou mais de 90 mil pessoas no Brasil
Pandemia do coronavírus já vitimou mais de 90 mil pessoas no Brasil   Foto: Matheus Tagé/AT

O Brasil soma hoje mais de 90 mil mortos e quase 2,5 milhões de casos da Covid-19. O negacionismo do presidente Bolsonaro em relação à pandemia já estava evidenciado nas contas do Governo, onde os gastos com saúde vem sendo claramente negligenciados. Do orçamento de R$ 226,8 bilhões anunciado em novas despesas, R$ 56,5 bilhões já foram efetivamente desembolsados. Desse total, apenas R$ 5,4 bilhões foram direcionados para o Ministério da Saúde. É menos de 10% do que já foi gasto.


O governo tornou disponível R$ 23 bilhões para o Ministério da Saúde e outros ministérios para medidas emergenciais, o que corresponde a apenas 2,3% do total previsto. Contudo, na frente dos gastos do Governo aparece a linha de financiamento da folha de pagamento das pequenas e médias empresas. Dos R$ 34 bilhões orçados, a metade já foi efetivamente executada, ou seja, paga pelo governo federal. O auxílio emergencial de R$ 600 que vem sendo pago aos trabalhadores informais e desempregados aparece logo atrás, onde dos  R$ 98,2 bilhões orçados, um terço já foi pago.


O que causa uma mistura de espanto e preocupação ao analisar esses números é ver que o proposto pelo Governo Bolsonaro e aprovado está longe do realizado. Os valores que se referem a investimento em saúde são assustadoramente baixos se levarmos em contato os altos números da pandemia no Brasil e a verba disponível.


Agora, recentemente, nos causou ainda mais assombro a publicação do levantamento da Transparência Internacional, que esta em sua terceira edição, e incluiu pela primeira vez o governo federal. O resultado da pesquisa coloca o governo Bolsonaro na dianteira dos governos mais sem transparência na contratação de despesas emergenciais durante a pandemia, ficando atrás apenas de Roraima. O estudo, que inclui todos os estados e capitais, verifica como as informações dos contratos feitos para combater a Covid-19 são divulgadas.


No levantamento o governo registrou 49,3 pontos de 100 possíveis, nota considerada regular, que o colocou acima apenas de Roraima, com 40,51 pontos. 


A instituição que realizou a pesquisa aponta a falta de informações detalhadas sobre as contratações emergências como responsável pelos desempenho ruim do Governo Federal quando o assunto é transparência. 


Entre os aspectos abordados pela Transparência Internacional está o fato de que o principal portal de informações sobre coronavírus do governo federal mostra poucos detalhes sobre as contratações e não tem os dados em formato aberto, o que é considerado importante para a transparência porque permite o cruzamento com outras informações. 


De acordo com o estudo, portais de alguns órgãos federais seguem os padrões recomendados, mas só têm informações sobre suas respectivas contratações e não do governo como um todo. 


Enquanto o governo Federal leva cartão vermelho no que se refere à transigências nas contratações durante a pandemia alguns estados como Ceará, Espírito Santo e Rondônia atingiram a nota máxima. 


Na mesma velocidade em que aumentam o número de contaminados e óbitos, aqui no Brasil já passa de R$ 1,5 bilhão o valor de contratos investigados pelas polícias Federal e Civil e pelo Ministério Público nos estados, por indícios de fraudes em compras e contratos assinados para enfrentar a doença. Para ilustrar melhor o que esses números significam, o montante é 13 vezes superior ao rombo atribuído à máfia dos sanguessugas (esquema de compra superfaturada de ambulâncias, descoberto em 2006, que movimentou R$ 110 milhões) e muito superior aos R$ 173 milhões movimentados pelo mensalão (escândalo de compra de votos de parlamentares durante a tramitação no Congresso de projetos de interesse do governo Lula, em 2005).


Os fatos acendem um alerta em relação à lisura com que o governo federal vem conduzindo o enfrentamento à pandemia e explicitam que o governo Bolsonaro segue batendo recordes na pandemia, liderando agora o ranking dos governos menos transparentes na divulgação dos contratos emergenciais durante Covid-19, atrás apenas de Roraima. Mais uma vez essa ausência de transparência por parte do governo nos mostra uma tentativa de mascarar a falta de ética que a cada ação vem sendo evidenciada.


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