Desestatizações e outras ‘cositas’ mais

"Sei que nada será como antes, amanhã” (Milton Nascimento e Ronaldo Ribeiro)

Por: Hudson Carvalho  -  01/04/22  -  10:44
  Foto: Carlos Nogueira

Desde a última coluna, no início de março, quantos fatos novos no mundo e no setor portuário do Brasil! O acirramento do conflito entre Rússia e a Ucrânia e seu reflexo no comércio internacional; o fim do prazo para a entrega de contribuições para a consulta pública, parte do processo de desestatização do Porto de Santos (leia-se, de sua administração, apenas); o avanço do projeto de ligação seca entre Santos e Guarujá (nunca se reuniu tantas condições favoráveis sob os pontos de vista econômico, financeiro e político); e a privatização da Companhia Docas do Espírito Santo, ocorrida na quarta-feira e que alcançou valor de outorga de R$ 106 milhões.


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É muito, não? Todos essas fatos, por sinal, com impacto sobre o nosso Porto de Santos. Como o assunto desta coluna é o desenvolvimento da mão de obra, não posso deixar de pensar nos 60 mil empregos diretos e indiretos, número que vem sendo anunciado como a quantidade de postos de trabalho a serem gerados ao longo do futuro contrato de concessão. A quantidade já conhecemos. Falta saber a qualidade desse número, quais serão os cargos, as atividades e os processos de trabalho a serem criados na nova cadeia produtiva da atividade portuária que surgirá. Quais as competências e qualificações necessárias para exercê-las?


Esse número e seus impactos sobre a economia da Baixada Santista deveriam ser as preocupações principais da sociedade local. Imagine que esses empregos sejam, em sua maioria, conquistados por candidatos de nossa região. Se cada emprego afetar uma família composta por quatro pessoas, em média, já serão cerca de 240.000 atingidos, cerca de 15% da população da Baixada. Confirmado, esse cenário será uma revolução no mercado local de trabalho, poucas vezes vista. Vejo com preocupação a pouca mobilização em torno desse tema. Não dos governantes ou das instituições, mas dos reais afetados, os atuais e futuros profissionais que aqui residem e trabalham.


Não acho que seja prematuro conhecer, nem que seja para estimular a mobilização da qual sinto tanta falta, quais são os planos da Fundação Cenep (Centro de Excelência Portuária de Santos) para esse cenário. Explico, de forma superficial: ela foi criada em 2007 pelo Conselho de Autoridade Portuária (CAP) – no uso de suas atribuições iniciais – e pela Prefeitura de Santos. Seu presidente executivo, historicamente, é um profissional originário da Santos Port Authority (SPA). Em seus conselhos técnico e curador, têm assento os diversos operadores portuários, instituições de ensino e sindicatos de trabalhadores.


É preciso levar ao conhecimento da sociedade o que está planejado. Ampliar o número de parceiros institucionais será igualmente uma boa ideia para gerir de forma adequada o conhecimento e as ferramentas de gestão, para dar conta do planejamento e execução da enormidade de trabalho que há pela frente. Como veem, não tenho preocupação com os recursos. Sei que eles virão. Minha preocupação é com a gestão desses recursos.


Por fim, outra preocupação relacionada a esse processo: os profissionais portuários que não terão tempo de adequar-se à tecnologia e aos novos processos de trabalho que virão desse cenário, em especial os trabalhadores portuários avulsos (TPAs). Por questões relacionadas à idade, aos aspectos culturais e à fase que vivem em suas carreiras, muitos terão dificuldades de adaptação. Nesse ponto, será interessante conhecer os planos do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), erroneamente chamado de “RH dos avulsos”, pois ele é muito mais.


O que fazer para que esses milhares de trabalhadores não engrossem o contingente de desempregados? De novo, seria um enorme impacto sobre a economia de Santos e demais municípios da região. Quem disse que seria fácil? Não começamos com música? Então vamos terminar assim também. A mesma, por sinal, na qual o compositor diz que continua “resistindo na boca da noite um gosto de sol”.


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