Se no domingo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não apontar falhas ou carência de dados, na próxima semana o Brasil já terá duas vacinas para aplicação contra o novo coronavírus, a CoronaVac, do Instituto Butantan/Sinovac, e a parceria da Universidade de Oxford/AstraZeneca. Com o aval, o País entrará tardiamente no já numeroso grupo de nações que começaram a aplicar o imunizante, única forma de combater a perda de vidas hoje de volta à média de mais de mil por dia. Provavelmente o início da aplicação das doses será modesto e não em massa como se esperava, reflexo dos erros do Governo Federal.
Em agosto, a Pfizer ofereceu 70 milhões de unidades ao Ministério da Saúde, que menosprezou a persistência da covid-19, talvez por pouco ouvir os profissionais mais capacitados para essa decisão, os infectologistas. Pelo menos, agora se vê o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que antes era anunciado como um expert em logística, ir a campo, no caso Manaus (AM), onde a doença atingiu seu momento mais grave desde o início da pandemia e possivelmente sem paralelo em outras cidades brasileiras.
A vacinação vai começar no Brasil sob a interferência das mais detestáveis de todas, que é a da política. São ruídos desnecessários que prejudicam o objetivo principal, que é proteger a população. Neste momento, a preocupação é que a Anvisa possa impor restrições ao Butantan por motivos que não sejam o da ciência, tamanho o clima de tensão entre o governador João Doria e o presidente Jair Bolsonaro que, aliás, ironizou a eficácia de 50,38% da CoronaVac, algo inaceitável.
Por outro lado, causou estranheza a demora com o que o instituto paulista levou para anunciar esse percentual, raspando na média mínima de 50% para liberação. No final das contas, as explicações técnicas, nas quais se deve confiar (de que os testes foram abrangentes e o percentual foi baixo devido à aplicação em momento de elevada incidência da doença), geraram comentários. Tal repercussão pode dar munição aos negacionistas e afastar parcela significativa da população da campanha da vacinação.
Deve-se cobrar também que a Anvisa seja mais rápida, inclusive nas autorizações emergenciais. A agência reguladora tem solicitado dados avulsos ao Butantan, que é uma instituição experiente na área. Fica a impressão da falta de comunicação e de excesso burocrático, uma reclamação que não é antiga, com muitas queixas dos laboratórios sobre a espera para liberar medicamentos. O extremo cuidado é essencial, mas há muita pressa, com a média de mortes subindo a cada dia.
Considerando a displicência com festas clandestinas e praias com aglomeração, é previsível que a disseminação da covid-19 aumente ainda mais. O que deve ser feito agora é cobrar uma vacinação abrangente e ágil e que sejam aceleradas as chegadas de mais doses de ambas as vacinas e de outras opções que aparecem, como a da Pfizer e de laboratórios indianos.