Transição uruguaia

Tomou posse no último domingo o novo presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, quebrando a hegemonia de 15 anos da Frente Ampla no poder. A transição no país merece destaque: no discurso de posse, Lacalle Pou salientou o caráter civilizado das relações políticas, elogiando que, desde a redemocratização uruguaia em 1985, todos os presidentes terminaram seus mandatos e transmitiram o poder de modo democrático.

O novo mandatário foi recebido no Parlamento pelo ex-presidente José Pepe Mujica, senador mais votado na última eleição, e ícone da esquerda latino-americana. Mujica foi o responsável por conduzir o juramento de Lacalle Pou e de sua vice, Beatriz Argimón, e houve a tradicional cerimônia de transmissão do cargo, com a presença de Tabaré Vásquez, que deixava a presidência.

O exemplo do Uruguai merece atenção. Os eleitores, em sua maioria, deram a vitória ao candidato de centro-direita, que apresentou plano duro de combate à violência, que inclui o chamado excludente de ilicitude para policiais que matam em serviço e prevê ainda que fiquem isentos de punição os civis que usarem armas de fogo em defesa de sua vida ou de terceiros. Segundo especialistas, o projeto tem boas chances de ser aprovado pelo Parlamento nas próximas semanas. 

Lacalle Pou destacou, porém, que sua posse não deve ser lembrada como a "troca de uma metade pela outra da sociedade", em alusão à vitória obtida por ele por pequena margem de votos, e acrescentou que manterá o que de bom foi feito nas gestões anteriores e mudará apenas o que não vai bem. Não há clima de confronto: ao contrário, o novo presidente, que pertence a um dos mais tradicionais partidos políticos da América do Sul, de tendência conservadora, e fundado em 1836, sinaliza que cultivará a política como prática cotidiana, respeitando adversários e as relações com o Legislativo. 

Em seu primeiro discurso como presidente, disse que é preciso fortalecer o Mercosul para que os países do bloco possam comercializar com países de fora, e que se deve levar adiante o acordo com a União Europeia. Pediu ainda que a união aconteça deixando de lado as questões ideológicas que podem diferenciar as nações membros do acordo, exatamente para que o bloco se fortaleça no cenário internacional. 

Lacalle Pou mostra, no início do governo, equilíbrio, sensatez e tolerância. Sem abrir mão de suas propostas, declarou-se favorável a "recuperar o Estado, reordenar os recursos e gerar a abertura do mercado", e enfatizou, ao mesmo tempo, o combate à violência e à deterioração do meio ambiente, com o governo severo nesta área. O Uruguai desponta, no cenário latino-americano, como exemplo de respeito às instituições democráticas, e sua transição traduz essa realidade, que infelizmente não é seguida nos demais países do continente.