Tolerância zero

Episódio envolvendo o jogador Robinho pode servir para contagiar uma ampla campanha contra a violência doméstica e sexual

Por: Da Redação  -  18/10/20  -  12:38
Atualizado em 18/10/20 - 13:37

O Santos Futebol Clube suspendeu, na sexta-feira (16), o contrato recém-assinado com o jogador Robinho, que faria sua quarta passagem pelo clube. O ato foi uma decisão conjunta entre o atacante e a agremiação, pelo menos assim foi divulgado. Robinho é condenado em primeira instância na Itália, mas nega que tenha cometido o crime de estupro coletivo contra uma mulher de 23 anos. Não há previsão para o trânsito em julgado. A gota d´água para o desfecho de sexta-feira foi a revelação de diálogos que o jogador teve com amigos, em que conversam sobre o suposto crime, em que a jovem aparentava estar embriagada.


O fato extrapolou as quatro linhas e atingiu o ponto mais importante do clube, as finanças. Quatro importantes patrocinadores ameaçaram romper com o Santos caso mantivesse o jogador. Independentemente da sentença em última instância, o recado aos clubes está dado: jogadores ou quaisquer outros membros da equipe técnica que se envolvem em crimes contra mulheres não são bem-vindos. 


Episódios semelhantes já ocorreram no universo do futebol e também fora dele. O goleiro Bruno foi, talvez, o mais representativo desse novo momento da sociedade. Depois de cumprir pena de sete anos por feminicídio, Bruno tenta voltar ao futebol, mas encontra a barreira da torcida e de parte da imprensa. Patrocinadores não querem ter suas marcas associadas a um clube que acolhe feminicidas ou acusados de estupro. Tampouco tolera quem responde por violência doméstica, assédio moral e sexual.


Independentemente do desfecho que terá o caso Robinho, se conseguirá provar sua inocência e se retornará ou não ao clube, o episódio vale uma análise mais cuidadosa sobre o caminho que a sociedade traçou até aqui: de enxergar casos assim como parte de uma cultura patriarcal e machista, a não mais tolerar sequer uma suspeita de crime. A ordem é tirar da sombra aqueles que flertam com velhos hábitos nada republicanos, e ainda entendem que se trata de exagero denunciar quem subjuga, humilha ou agride a mulher.


Esse mesmo ímpeto com que se tirou Robinho de campo antes mesmo da ação transitar em julgado pode e deve ser estendido a todos aqueles casos de violência doméstica que só fazem crescer no País, e para os quais ainda não há uma legião de pessoas dispostas e denunciar, combater e tornar público. Os dados mais recentes dos órgãos oficiais indicam um aumento de 50% de casos de violência doméstica durante a pandemia. No Estado de São Paulo, o aumento de feminicídios foi de 46%.


Embora órgãos públicos, imprensa e entidades do terceiro setor venham propagando mais o tema nos últimos anos, ainda é insuficiente frente ao desafio que é jogar essas estatísticas para baixo. O episódio Robinho ganhou notoriedade por ser quem é e pelo time que pretendia jogar, mas há muitos outros na penumbra, à espera de uma onda de indignação semelhante. 
 


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