Sem conselhos

Assunto merece atenção e cuidado. Reduzir o diálogo entre governo e sociedade sobre políticas públicas é retrocesso que deve ser evitado

Por: Da Redação  -  18/04/19  -  19:57

Decreto publicado pelo governo pode extinguir dezenas de colegiados da administração federal que contam com a participação da sociedade civil organizado. De acordo com a medida, os ministérios terão prazo até 28 de maio para informar quais conselhos pretendem manter ou eventualmente reestruturar.


O presidente Jair Bolsonaro manifestou-se a respeito, afirmando que haverá gigantesca economia, desburocratização e redução do poder de entidades aparelhadas politicamente para impor suas vontades, ignorando a lei e atrapalhando de modo proposital o desenvolvimento do Brasil, não se importando com as reais necessidades da população.


Houve forte reação contrária de segmentos da sociedade civil, que entendem que o decreto reduzirá de forma significativa a participação no debate e encaminhamento de soluções para grandes problemas nacionais. O alcance da decisão, assinada pelo ministro da Casa Civil, Onix Lorenzoni, pode atingir de 600 a 700 colegiados que atuam em várias áreas, como diretos de idosos e pessoas com deficiência, erradicação do trabalho escravo e sobre drogas.


Desde os anos 1990, nota-se, em todo o mundo, o avanço do conceito de governança, que significa meio e processo para solução de problemas e conflitos com participação ampliada. Sua aplicação vai desde as empresas - a chamada governança corporativa, que implica em maior transparência e relações entre os vários corpos diretivos e de fiscalização das firmas - ao panorama internacional, expresso pela governança global. Temas como a preservação do meio ambiente dependem, cada vez mais, da presença e participação de vários atores: estados, organizações internacionais, empresas, organizações não governamentais.


Os conselhos e colegiados, criados e desenvolvidos no país (do nível federal ao municipal), materializam a participação ampliada em muitos assuntos, e a experiência mostra avanços importantes. Evidentemente, sua atuação não é uniforme, e em alguns casos podem ser feitas críticas à ação de algumas entidades da sociedade civil, mas isso não deve ser motivo para interromper um processo que tem se mostrado promissor.


Há alguns órgãos que, criados por leis, não podem ser extintos, como o Conselho Nacional de Saúde (CNS), o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Estes colegiados, porém, podem ser modificados em sua composição e funcionamento, enquanto outros, como a Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio), os comitês do Fundo Amazônico e do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, além do Conselho Nacional de Florestas (Conaflor) e o de Política Indigenista (CNPI) estão ameaçados.


O assunto merece atenção e cuidado. Reduzir o diálogo entre governo e sociedade sobre políticas públicas é retrocesso que deve ser evitado.


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