Para além da abstenção no Enem

Seria oportuno investigar origem e destino dos quase 3 milhões de estudantes que faltaram aos exames deste ano

Por: Da Redação  -  25/01/21  -  09:10

Mais de 2,8 milhões de estudantes deixaram de ir ao primeiro domingo de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), totalizando 51,5% de abstenções, índice recorde desde que o exame foi criado, há 23 anos. Entre os motivos que justificaram a ausência, o medo de contaminação pela covid-19 predominou, já que muitas salas de aula estavam lotadas. Ontem foi realizada a segunda etapa da prova, e a abstenção continuou alta.


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Em visita à região, ontem, no segundo e último domingo de provas, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que o número de faltosos era esperado, já que em anos anteriores, mesmo sem pandemia, também houve índices de abstenção bastante expressivos. Milton Ribeiro disse, também, que os alunos ausentes que requisitaram remarcação de provas em função de estarem com covid-19 ou por terem desistido quando encontraram salas superlotadas terão nova oportunidade em fevereiro.


O adiamento das provas vem sendo debatido e requisitado há semanas. A Defensoria Pública da União chegou a formalizar o pedido após a primeira prova, mas o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), responsável pelo Enem, manteve as datas.


Se a principal motivação para o adiamento era o risco de contaminação, é pouco provável que o cenário de risco fosse muito diferente em fevereiro, já que a expectativa de vacinação massiva só deve ocorrer no final do primeiro semestre. O que não parece coerente, por outro lado, é que houvesse superlotação em salas de aula mesmo com tanto tempo para planejar a logística das provas.


De qualquer forma, a alta abstenção nas provas deste ano é apenas um elemento a mais quando o tema é acesso ao ensino superior em tempos de pandemia. O ano de 2020 deixará inúmeras lacunas na formação dos jovens mais carentes, muitos privados das atividades remotas por não terem acesso a banda larga ou equipamentos adequados para acompanhar as aulas.


O Enem é, hoje, a principal porta de acesso às universidades públicas. Embora o regime de cotas preveja 50% das vagas para estudantes provenientes de escolas públicas, há que se considerar as falhas que eles trarão desse período em que a formação foi repleta de lacunas. Além disso, entre os mais de 2,8 milhões de jovens que não compareceram às provas estão aqueles que abandonaram os estudo para trabalhar e complementar a renda das famílias mais vulneráveis, em que o desemprego tirou do mercado de trabalho quem antes podia sustentar os filhos estudando em parte do dia.


Seria oportuno, então, que um amplo levantamento fosse feito no pós-pandemia, investigando a origem e o destino dos estudantes faltosos. Para esses, a pandemia pode ter representado muito mais que o risco de se contaminar: pode ter sido o elemento fundamental para tirar da rota quem acalentava o sonho de chegar à universidade. Para esses, será difícil recuperar o tempo e a oportunidade perdidos.


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