Pandemia é 'oportunidade'

O ministro deveria estar preocupado em se juntar às equipes científicas que buscam uma vacina contra o coronavírus

Por: Da Redação  -  25/05/20  -  12:01

No dia em que o Brasil ultrapassou a marca dos 20 mil mortos pelo coronavírus e se tornou o segundo no ranking mundial da pandemia, foram divulgadas as imagens da polêmica reunião do presidente Jair Bolsonaro com seus ministros, em 22 de abril. A divulgação de trechos do encontro revela muito mais que o objetivo inicial, que era apenas o de comprovar, ou não, as denúncias feitas pelo ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, de interferência do presidente na Polícia Federal.


Os diálogos e a forma como eles se dão certamente se transformarão em outras linhas de investigação por parte da Procuradoria Geral da República. Mas um trecho, em especial, merece atenção por revelar a face mais sombria e perigosa de um integrante do Governo.


Em determinado momento de sua fala, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o Governo deveria “aproveitar a oportunidade” que o Governo Federal ganha neste momento, em que a mídia só fala da pandemia, para “ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”.


No sábado (23), Salles tentou explicar que foi mal interpretado e que se referia à atualização de normas de toda a Esplanada quando usou a expressão “ir passando a boiada”. Ele negou que a frase fazia referência a eventual flexibilização de normas ambientais para avanços do agronegócio. Disse, em resumo, que se referia a todo conjunto de regras dos ministérios, e não especificamente ao dele, Meio Ambiente.


Infeliz, a frase vai além da intenção ou não de se referia ao meio ambiente ou a todas as demais pastas do Governo Federal. Ricardo Salles disse que a pandemia é uma “oportunidade”, já que a mídia está focada em cobri-la e, portanto, daria uma trégua a outras questões que se quisesse fazer aprovar.


Não é de hoje que o ministro se envolve em polêmicas. De apoiar a junção da pasta de Meio Ambiente com a Agricultura a minimizar os impactos do derramamento de óleo nas praias do Nordeste, Salles está longe de ser um defensor do meio ambiente ou, ao menos, um ponto de equilíbrio e sensatez entre as questões ambientais e a necessidade de desenvolvimento sustentável.


Para além da falta de habilidade à frente da pasta que ocupa, classificar a pandemia como uma “oportunidade”, ainda que em reunião reservada da equipe ministerial, coloca em evidência uma postura nada coerente diante de uma das maiores tragédias sanitárias do País.


Flexibilizar regras ambientais ou, como ele defende, normas e legislações de todas as pastas, deveria ser a última das preocupações de um ministro neste momento. Esperava-se dele, isto sim, juntar-se às equipes de cientistas que buscam a vacina contra o novo coronavírus ou, quem sabe, analisar os efeitos da quarentena sobre os recursos naturais como ar, água, Litoral Brasileiro.


Salles sai com a imagem arranhada, sob o ponto de vista ético e, mais que isso, humano.


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