O jogo da desoneração da folha

Se a desoneração simplesmente terminar vai aniquilar empresas que hoje estão afogadas pela pandemia

Por: Da Redação  -  09/09/20  -  09:32

Ainda nesta semana, o governo deve jogar a toalha e fechar acordo para a derrubada do veto à prorrogação da desoneração da folha de salários. Se assim se consumar, segmentos altamente geradores de empregos como construção, call center, tecnologia da informação e indústria têxtil e de calçados devem continuar até o final do próximo ano pagando menos imposto sobre a remuneração dos funcionários. O benefício deveria acabar em dezembro, mas deputados embutiram nas entrelinhas da Medida Provisória 936, que nada tem a ver com a concessão tributária. A MP 936 versava sobre a suspensão de contratos de trabalho e a redução proporcional de jornada e salários, medidas emergenciais para preservar o trabalho frente à pandemia.


A desoneração em vigor permite que empresas específicas – e não todas – possam pagar de 1% a 4,5% sobre o faturamento bruto ao invés de 20% sobre a folha para a Previdência Social. Para quem tem centenas ou milhares de funcionários, a economia é considerável. Já o governo diz que perde R$ 10 bilhões por ano com ela.


O embrião da desoneração é a MP 540, convertida na Lei 12.546 de 2011 como resposta do Governo Dilma à crise mundial de 2008 – a ideia era estimular a geração de emprego. Não deu muito certo provavelmente pela economia em baixa que demandava pouca mão de obra. Entretanto, o desconto ajudou as empresas. Tanto que o alívio foi ampliado pelo menos 11 vezes.


Ao vetar a desoneração, o presidente Jair Bolsonaro citou a Lei de Responsabilidade Fiscal, de que a emenda deu isenção sem apontar contrapartida de receita. O ministro da Economia, Paulo Guedes, critica a tributação da folha por destruir empregos. Por meio do imposto, o trabalhador custa mais do que seus equivalentes em outros países. Guedes, ao ver minguar o caixa do governo, de forma paradoxal lutou até onde pôde pelo veto.


Com a provável derrubada do veto, o ministro admitiu negociar com a própria base, altamente pressionada pelo lobby das empresas beneficiadas. A ideia é sacrificar o veto em troca de apoio para a reforma tributária. Guedes parece achar que terá espaço para uma desoneração até mais ambiciosa. O caminho seria com a nova CPMF, de 0,2% sobre todas as transações. Assim, reduziria o custo do salário, mas deixaria a conta para todos, inclusive aposentados, informais, liberais e negócios que pouco empregam e não têm custos elevados com a folha.


No final das contas, o governo tenta agora se livrar de mais um monstro fiscal criado por ele por não conseguir fazer reforma tributária ao longo das décadas. A desoneração beneficiou empresas que têm trânsito em Brasília e não gerou os empregos esperados. Mas se a desoneração simplesmente terminar vai aniquilar empresas que hoje estão afogadas pela pandemia. Como sempre, é provável que saia um acordo para prorrogar a bondade fiscal sem prever um artifício sustentável para o longo prazo.


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