O dilema do auxílio

Discursos atravessados e empolgados em excesso não têm serventia e só geram desconfiança

Por: Da Redação  -  26/11/20  -  10:25

Depois de quase dois anos de governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, não cumpriu um trio de ações prometidas - privatizações, reformas (com exceção da Previdência) e medidas modernizantes. Apesar de tantas tarefas a realizar, ele decidiu palpitar sobre assunto do apático colega Eduardo Pazuello, da Saúde. Guedes deu uma importantíssima informação - a de que o auxílio emergencial não vai avançar sobre 2021. Ele disse que o benefício não será necessário, pois a doença "cedeu bastante" e que existe a "evidência empírica" de que não há uma segunda onda de covid-19. Porém, dezembro começa na próxima semana, quando já se pode dizer que se está no fim do ano, e tudo indica que até lá a aceleração dos casos de novo coronavírus deverá se manter. Para complicar - ou confundir - o País, há bem pouco tempo Guedes tinha afirmado que o auxílio voltaria em caso de segunda onda. Sua nova fala parece ser fruto de reprimenda do Palácio do Planalto.


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O reflexo imediato do fim do auxílio será uma aceleração do desemprego calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que considera trabalhadores que de fato estão a procura de uma vaga. Esse impacto não pode ser ignorado ou ser esperado sem o mínimo planejamento.


A ideia inicial do governo era fazer uma espécie de fusão do auxílio com o Bolsa Família e criar um bem encorpado Renda Cidadã. Dinheiro para isso não há. O estado de calamidade termina em 31 de dezembro, encerrando a permissão legal para destinar recursos ao programa emergencial. Se o auxílio ou o Renda Cidadã saírem do papel em janeiro, será gasto direto do caixa federal e, para isso, deverá ser mostrado de onde sairá o dinheiro. O rombo não está proibido desde que não ultrapasse a regra do teto (não pode superar as despesas do ano anterior corrigidas pela inflação), mas há o problema adicional da renovação da dívida pública. São centenas de bilhões de reais de títulos que vencerão e o Tesouro precisará pagar os credores, que sinalizam pressão por juros mais altos. Esse movimento é bem conhecido. Se o governo fica em apuros, o investidor, como prêmio pelo risco, quer receber mais.


É provável que Guedes descartou o auxílio em 2021 para desestimular o ânimo do entorno palaciano que almeja anabolizantes na economia para manter a popularidade do presidente. Este está com a imagem arranhada após tentar turbinar algumas candidaturas, de prefeitos a figuras irrelevantes como a Wal do Açaí. Contudo, para defender a austeridade, Guedes não pode embaralhar esse momento crucial da covid-19. O ministro terá que conduzir a economia em um ano caótico para as receitas federais. Não há dúvidas que a economia voltou com força, mas a base de comparação é com ano de algumas semanas de paralisia e várias outras com muita letargia. Discursos atravessados e empolgados em excesso não têm serventia e só geram desconfiança.


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