Um dos pilares bem definidos por este governo desde a campanha eleitoral é o do liberalismo de Paulo Guedes. Essa linha se opõe ao desenvolvimentismo que fascinou tanto os petistas como os militares da ditadura, cada um a doses específicas, mas com problemas parecidos – endividamento público e falta de capacidade para investir. Já o mundo liberal de Guedes prega redução e até ausência do Estado. Assim, o mercado e a meritocracia cuidam de aprimorar a sociedade e as atividades econômicas. Porém, esse ideário praticamente não se vê no mundo, a não ser pela baixa presença estatal, como é o caso dos Estados Unidos.
Guedes foi o ímã que atraiu de forma hábil a adesão do empresariado que não seguia necessariamente a cartilha de costumes defendida pelo então candidato. Agora, entretanto, o esforço ainda sem sucesso do governo para expandir programas sociais e entregar obras sinalizam uma guinada na orientação econômica do Planalto.
A mão do Estado tem a vantagem de garantir resultados mais rápidos. Basta observar o impacto do auxílio emergencial na popularidade do presidente. Se todo ano o 13º é aguardado com ansiedade pelo comércio para turbinar as vendas e desde a gestão de Michel Temer a liberação do FGTS estimula o consumo e o pagamento de dívidas, era óbvio que o socorro de R$ 600 seria um sucesso. Nada muito diferente fizeram os governos petistas, experts em transferência de renda, como Bolsa Família, Fies (financiamento estudantil) e elevado subsídio aos pobres no Minha Casa, Minha Vida.
Porém, o caos fiscal deixado pelas gestões do PT mostram que o abuso com essa receita foi devastador para o Estado, que já chegou à pandemia sem fôlego para enfrentar essa paulada na economia. Com o novo coronavírus, despejou-se dinheiro público no mundo todo. Quem gastou mais sofreu menos, como Alemanha, Brasil e EUA, economias que recuaram abaixo de 10% no segundo bimestre. Os defensores da presença forte estatal vibraram, mas a conta será cobrada – com intensidade acentuada sobre quem já estava frágil.
Em sinal de mais um desgaste, a equipe de Guedes foi ameaçada com o “cartão vermelho” do presidente, que se irritou com declarações precipitadas e desastrosas do secretário da Fazenda, Waldery Rodrigues, ao G1 sobre congelar aposentadorias. Guedes disse que a reprimenda não foi para si, mas não convenceu, afinal Rodrigues é seu principal assessor e responde diretamente a ele.
Guedes já era cobrado por resultados antes da pandemia. Porém, é um defensor de reformas, importantíssimas para modernizar o País, mas, sob o aspecto eleitoral, de resultados no médio e longo prazos. No curto, geram insatisfação, como trabalhadores irritados por mudanças, o que pesa nas urnas. Por isso, a sedução do desenvolvimentismo ou de algum tipo de interferência estatal mais ampla está tão forte.