Com 36 anos de experiência no Parlamento e a Vice-Presidência do Governo Obama, Joseph Biden Jr., de 78 anos, é a figura ideal para consertar as fraturas deixadas por Donald Trump na sociedade americana e, por consequência, no mundo. Consagrado vencedor pela imprensa, como manda a tradição do país por não haver por lá um órgão eleitoral específico, Biden tem ainda a missão paralela urgente de abrandar os males da pandemia. Ainda há a ameaça dos ruídos que Trump pode produzir ao decidir recorrer contra os resultados das urnas nos estados que garantiram a vitória apertada de Biden no voto popular, mas relativamente folgada no peculiar colégio eleitoral.
Porém, em décadas, esta corrida eleitoral americana foi a que mais interessou ao Brasil, considerando a influência ideológica de Trump sobre o bolsonarismo. Em diversos momentos, o presidente Jair Bolsonaro usou de seu poder de Estado para manifestar preferência pelo atual presidente dos EUA, inclusive antes eleições, indicando um adesismo desnecessário e de parcos resultados para o Brasil. A diplomacia brasileira é historicamente neutra ou pelo menos discreta, com algumas crises de médio intensidade, como quando agentes americanos bisbilhotaram o Governo Dilma Rousseff. Biden visitou Dilma durante a Copa do Mundo em busca de apaziguação e agendou encontro na Casa Branca, que acabou sendo cancelado pelo Brasil.
Próximo à eleição, Bolsonaro tornou pública a usa preferência por Biden, entre outras declarações imprudentes, principalmente porque o democrata, em debate na TV americana, disse que poderia impor restrições ao Brasil se o governo não agisse contra a destruição da Amazônia. Pelo menos até ontem, quando líderes como a alemã Angela Merkel e o francês Emmanuel Macron e até mesmo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o governador João Doria (PSDB) felicitaram o vencedor, o Palácio do Planalto optou pelo silêncio. Muito melhor do que se posicionar como já tinha feito, mas na diplomacia não dar boas-vindas ao vencedor pode ter um peso mais forte do se gostaria.
O Brasil de hoje não é o mesmo de décadas atrás, como quando Bill Clinton, nos anos 1990, deu fôlego ao Governo FHC patrocinando a liberação de dólares do Fundo Monetário Internacional para o Brasil. Mas os EUA são hoje destino essencial de industrializados e serviços brasileiros, enquanto a China compra commodities. Ironicamente, em caso de alguma crise com o tradicional parceiro da América do Norte, há risco do Brasil, em pleno Governo Bolsonaro, ficar dependente do país asiático tão esnobado pelo bolsonarismo.
Diplomacia à parte, o centrismo de Biden vem em boa hora para conter as ameaças que Trump pode causar à democracia, servindo de exemplo para seguidores fanáticos. Não se deve acreditar em volta à normalidade ou que o trumpismo e movimentos imitadores desaparecerão, mas a vitória do democrata é um alívio.
O trumpismo e movimentos imitadores não desaparecerão, mas a vitória do democrata é um alívio