Contando a história de João e Maria

Conheça a história do casal “contrapropista” – trabalha e se sustenta “por conta própria” – que, com todo o esforço, foi vítima da pandemia

Por: Sergio Pardal Freudenthal  -  20/08/20  -  11:00

João e Maria, casados há mais de 30 anos, estavam ambos com 58 anos de idade, já criaram seus dois filhos, mas nem conseguiram comprar a casa própria. Depois de 20 anos trabalhados na área industrial, em diversas empresas e, infelizmente, sem terminar nem o curso fundamental e sem maiores qualificações profissionais, João ficou desempregado nos últimos 5 anos.


Maria, do lar, fazia salgados deliciosos, e, junto com João desempregado, colocou-os no mercado informal, oferecendo nos horários de movimento, em pontos de aglomeração. Enfim, sobreviviam “por conta própria”, sem qualquer contrato formal, empresa, PJ ou MEI. Subsistiam e ainda davam uma forcinha na criação dos dois netos. Evidentemente não sobrava para contribuição previdenciária.


Com a pandemia, nem preciso dizer como ficou a situação dos dois. Não tem movimento, não tem aglomeração e não tem comprador de salgadinhos. Com o auxílio-emergencial de 600 reais, mesmo os dois sendo beneficiários, mal dava para comer. Pois na quarentena, João foi contaminado, adoeceu, foi internado, entubado e faleceu. Nem um enterro decente Maria pôde realizar. Ainda deixou de receber o auxílio-emergencial do João.


Como João tinha 20 anos de contribuição, alguns inclusive até ganhando bem, Maria requereu a pensão por morte através do site Meu INSS, que, com alguma velocidade, respondeu que ela não teria direito. Não tem direito ao benefício porque o de cujus, o falecido, já tinha perdido a qualidade de segurado quando ocorreu sua morte.


Com 20 anos de contribuição e 58 de idade, João não reunia as exigências para qualquer aposentadoria voluntária. Para os benefícios decorrentes de sinistros, invalidez ou morte, é preciso que o segurado ainda tenha essa qualidade na ocasião do infortúnio. É bom lembrar que sendo um seguro de caráter social (pelo menos, por enquanto) o desempregado, sem possibilidade de contribuir, ainda mantém a qualidade de segurado por um bom período, entre 12 e 36 meses, de acordo com o tempo de contribuição que tinha. Pois sem contribuir por mais de 5 anos, João, quando ficou doente e veio a falecer, já não tinha mais qualidade de segurado; portanto, sem direito a se aposentar por invalidez e sem gerar a pensão por morte para sua viúva Maria.


Maria, com 58 anos, na miséria e sem nenhuma contribuição, para ter direito ao benefício assistencial (LOAS), deve esperar completar 65 anos de idade. E o mercado de trabalho também não vai lhe oferecer nada. Resta, enquanto durar, o auxílio-emergencial.


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