Recado
“Última flor do Lácio, inculta e bela, / És, a um tempo, esplendor e sepultura: / Ouro nativo, que na ganga impura / A bruta mina entre os cascalhos vela...”
Olavo Bilac
Nesta terça-feira (5) se comemorou o Dia Mundial da Língua Portuguesa. Viva! . É o quinto idioma mais usado no mundo, o terceiro no Ocidente e o primeiro no Hemisfério Sul. Sem dúvida, tem enorme relevância. Os falantes sabem disso? Os mitos respondem. Versões tantas vezes repetidas viram verdade.
Língua de Deus
Para os muçulmanos, o árabe é a língua de Deus. Entre 6.800 idiomas, o Senhor escolheu o deles pra ditar a mensagem divina. O recado encontra-se no Corão, joia da literatura mundial.
Precisão
Para os nascidos na terra de Goethe, o alemão é sinônimo de precisão. O inimigo da ambiguidade não tem alternativa. É estudar alemão, ou estudar alemão. Por isso nove entre dez filósofos escrevem no idioma que tem declinações e montões de palavras coladas umas nas outras.
Clareza
Os franceses se consideram donos da clareza. Montaigne, há 400 anos, disse que o estilo tem três virtudes – clareza, clareza e clareza. Parisienses & cia. afirmam que o estilo francês tem quatro – clareza, clareza, clareza e... clareza. O privilégio tem explicação. Chama-se escola de qualidade.
Dificuldade
E o português? O idioma de Camões cultiva vários mitos. Um deles: língua linda, mas muito difícil. Ninguém consegue dominá-la. Verdade? Não. As línguas de cultura apresentam dificuldade. Todas. O chinês, por exemplo, desafia os chinesinhos a interpretar 68 mil ideogramas. O árabe fala uma língua e escreve outra. Sai-se bem em ambas.
O segredo? Boa escola. Ensino de qualidade. Seriedade e dedicação. O português, como as demais línguas, exige empenho pra revelar os mistérios. Quanto mais se aprende, mais se sobe na escala do conhecimento. E mais liberdade se ganha.
Possibilidades
A língua é um sistema de possibilidades. Dominá-lo significa ampliar o leque de escolhas A criança se vira muito bem com a palavra casa. À medida, porém, que descobre as nuanças de lar, residência, domicílio, morada, moradia, habitação, pousada & cia., comunicar-se-á com mais precisão e consciência. Voará mais alto. E ultrapassará obstáculos.
Degrau por degrau
Embora pequenos, tropeços em crases, preposições, concordâncias e outras manhas da língua causam estragos. Evitá-los é possível. Basta estudar. Aos poucos, como quem sobe uma escada, degrau por degrau, vai-se dominando a norma culta. Oba! O texto agradece. O leitor também.
De Voltaire
“Aprender várias línguas é questão de um ou dois anos. Ser eloquente na própria língua exige a metade da vida.”
Eça de Queirós ensinou
“Uma pessoa só deve falar, com impecável segurança e pureza, a língua da sua terra. Todas as outras as deve falar mal, orgulhosamente mal, com aquele acento chato e falso que denuncia logo o estrangeiro.”
Leitor pergunta
Aldir Blanc foi pro céu. Elis Regina o recebeu com a majestosa interpretação de “O bêbado e o equilibrista”. Deus, de longe, presenciava o encontro. De repente, uma dúvida O desafiou. Bêbado ou bêbedo? O Senhor estudou português há muito tempo, lá pelo século 11. Estava meio esquecido. Com delicadeza, perguntou a Antônio Houaiss, que estava ao lado. Eu, aqui na Terra, fiquei curioso. Qual foi a resposta?
José Ricardo, Brasília (DF)
O dicionário registra as duas grafias – bêbado e bêbedo. Escolha uma. A consequência é uma só. Acertar ou acertar.