O professor, o entregador de panfletos e o coronavírus

Qual será a sensação de alguém que não consegue realizar a tarefa básica de seu oficio?

Por: Cida Coelho  -  07/02/20  -  09:00
O professor e o desafio de formar para a vida
O professor e o desafio de formar para a vida   Foto: Imagem ilustrativa/Tra Nguyen/Unsplash

Dia desses, parada no trânsito, aguardando o semáforo, fui abordada por um rapaz que desejava apenas me entregar um folheto com anúncio de um novo empreendimento imobiliário nas redondezas. Abri o vidro, recebi e agradeci. Antes de mim, no entanto, ele já havia tentado entregar o folheto a outros motoristas, que ignoraram seu pedido. Fiquei a pensar: a tarefa dele é apenas entregar o folheto.  Qual será a sensação de alguém que não consegue realizar a tarefa básica de seu oficio?


Ao meu lado estava um grande amigo, professor, que me disse, em tom de brincadeira, mas falando sério: “Até hoje, eu achava que o único profissional que se empenha em entregar seu produto e o cliente não quer receber é o professor. Agora vejo que os professores não estão sozinhos. Tem os entregadores de panfletos também”. Rimos muito dessa situação, mas essa analogia me tocou profundamente e me levou a algumas reflexões, diante de fatos importantes que estamos vivendo na nossa atualidade.


Estamos acompanhando o drama de mais uma pandemia em nosso planeta. É o coronavírus, que já fez mais de 400 vitimas e infectou mais de 20 mil pessoas na China. Em meio à crise, o governo chinês admitiu suas falhas na resposta ao coronavírus.


Por outro lado, no entanto, a China inaugurou essa semana um hospital com 1.000 leitos, em uma área de 25 mil metros quadrados, construído no tempo recorde de 10 dias!  Ainda é impossível saber como vai terminar essa história, mas me impressionou muito essa rápida ação concreta. 


Paralelamente, não consigo deixar de pensar em qual seria a prontidão da reação do Brasil numa situação como essa. Brasil e China têm histórias absolutamente diversas. Mas há um fator que as torna ainda mais distantes: o valor que chineses e brasileiros dão a Educação.


E não estamos falando aqui de uma sensação subjetiva. A Varkey Foundation é uma organização sediada no Reino Unido que tem por objetivo melhorar os padrões de educação e elevar o status e a capacidade dos professores em todo o mundo. Periodicamente, eles fazem uma grande pesquisa global, denominada Índice Global de Status do Professor, cujo objetivo é avaliar, entre outras coisas, o status e o valor que a sociedade atribui ao professor.


Os últimos dados disponíveis são de 2018. O Brasil aparece na última posição no ranking de prestigio do professor, num total de 35 países. Em 2013, o Brasil ocupava a penúltima colocação num universo de 21 países.   Curiosamente, o primeiro colocado nesse ranking é a China.  A mesma China que hoje, não por acaso, enfrenta dignamente a epidemia de coronavírus.


Esses tristes dados apontam um caminho ainda longo a ser percorrido por nós. Não há crescimento real e sustentável sem Educação. Existem muitos muros a serem derrubados na comunicação de professores e alunos, de professores e a sociedade.


Sou otimista por natureza, e acredito que veremos chegar o dia em que todas as crianças brasileiras terão acesso a educação de qualidade, em que os professores poderão escolher sua profissão por vocação, e não por falta de opção. Somente assim, a comunicação entre esses dois polos, professores e alunos, poderá ser empática e produtiva como deve ser.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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