Os servidores públicos não são os culpados!

Uma reforma aprovada em 1º turno, com uma quantidade apertada de votos favoráveis, demonstra a dificuldade do governo na legitimação da medida e a insatisfação de uma boa parte dos parlamentares

Por: Caio França  -  26/02/20  -  09:13
Atualizado em 26/02/20 - 09:29
França quer que projeto seja exemplo de tratamento isonômico entre pessoas de sexos distintos
França quer que projeto seja exemplo de tratamento isonômico entre pessoas de sexos distintos   Foto: Divulgação/Alesp

No final do ano passado escrevi um artigo neste espaço comemorando o adiamento da votação da Reforma da Previdência para 2020 por meio de uma decisão judicial, convicto de que a medida possibilitaria um maior aprofundamento e discussão de pontos considerados essenciais, com chances de revermos distorções e ajustá-las.


Desde o começo tenho me posicionado a favor da discussão da pauta. Não sou intolerante à Reforma da Previdência Estadual, tendo em vista que a expectativa de vida dos brasileiros cresceu e nos foi garantido que a Reforma da Previdência aprovada na esfera federal seria trazida na íntegra a São Paulo, com amplo debate, nos mesmos parâmetros da nacional. Mas não foi o que vimos. Não foi o que ocorreu.


Dessa forma, o ano virou, o Legislativo voltou do recesso e pouco avançamos no que compete às diversas emendas que sugerimos ao projeto com a finalidade de equilibrar o texto original. Assim, não me restou outra opção se não votar contra a Reforma da Previdência Estadual nos moldes em que ela foi apresentada.


Uma reforma aprovada em 1º turno, com uma quantidade apertada de votos favoráveis, o mínimo exigido de 57 a favor e 31 contra, demonstrando a dificuldade do governo na legitimação da medida e a insatisfação de uma boa parte dos parlamentares, que reconhece que os servidores públicos não podem “pagar o pato” da falta de gestão ao longo dos anos. É importante lembrar que a Alesp já aprovou três mudanças na previdência dos servidores nos últimos 20 anos, cito, por exemplo, a criação da SPPREV e da SPPREVCOM, previdência complementar.


Algumas questões que justificam o meu voto: o direito adquirido não foi acatado na sua totalidade; a vacacio legis que foi levada em considerada na proposta federal e, em São Paulo, não; o abono permanência que está na reforma federal e não foi observado na reforma estadual; os cinco anos de classe e nível em que for concedida a aposentadoria, que foram exigidos em São Paulo e não estão contemplados na esfera federal; a falta de previsão para adesão dos servidores que ingressaram no funcionalismo estadual no período de 2003-2013 na previdência complementar, entre outros.


Também quero destacar a forma como o debate foi conduzido, na minha concepção, de maneira equivocada. Um projeto com reflexo na vida de mais de 1 milhão de pessoas não poderia ser trabalhado com uma relatoria especial. Com a suspensão da liminar, o texto foi pautado no mesmo dia em sessão extraordinária. O encaminhamento dado pela Assembleia Legislativa ao tema foi muito diferente do tratamento dado pelo Congresso Nacional, que prezou pela realização de audiências públicas e possibilitou o amplo debate com a participação dos servidores.


As mudanças afetam diretamente o planejamento de vida dos funcionários que prestaram um concurso há 30 anos, inclusive, alguns já na iminência de aposentar. Em plenário, registrei a minha posição em relação à condução do debate e fiz um paralelo entre os argumentos utilizados pelo governo que prevê economia de R$ 32 bilhões pelos próximos 10 anos com os números apresentados pela SPPREV, mas que faz uma previsão orçamentária de isenção fiscal da ordem de R$ 23 bilhões somente em 2020.


Com isso, julgo que algo está em desacordo, porque se você abre mão de receitas de um lado, você não pode compensar dessa maneira de outro. Assim, espero que até o 2º turno da votação alguns colegas possam ser sensíveis aos argumentos apresentados, possibilitando mais tempo e espaço para que os servidores possam contribuir efetivamente com a construção de uma proposta mais justa.


É importante relembrar também das promessas feitas em período eleitoral, ocasião em que, durante a realização dos debates, o governador João Dória comprometeu-se a não fazer mudanças na previdência dos servidores, já que durante o governo Geraldo Alckmin já haviam sido realizadas diversas alterações.


Por fim, deixo claro que não compactuo com a mensagem que querem impor de que os servidores são os culpados pela atual situação administrativa e financeira do governo estadual, tendo em vista que eles são descontados em folha, na fonte. O servidor público nunca foi o problema, mas a solução. É ele que faz a máquina girar e as coisas acontecerem.


Minha mãe é professora e já passou pelo serviço público. Meu pai foi oficial de justiça e a posição ocupada por ambos sempre foi motivo de orgulho para a nossa família. O serviço público é essencial para as pessoas, em especial para as que mais precisam e dependem exclusivamente de escolas e hospitais, entre outros equipamentos. A mobilização dos servidores na Alesp é essencial para mudarmos o resultado do primeiro turno. É momento de fazermos justiça!


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
Ver mais deste colunista
Logo A Tribuna
Newsletter