CPI das Fake News das Eleições de 2018 encerra fase conceitual e inicia oitivas

Na próxima sexta-feira (31), a partir das 10h30, a expectativa é de que já possam ser ouvidos os representantes do Facebook, Instagram e Twitter

Por: Caio França  -  29/07/20  -  11:28
França quer que projeto seja exemplo de tratamento isonômico entre pessoas de sexos distintos
França quer que projeto seja exemplo de tratamento isonômico entre pessoas de sexos distintos   Foto: Divulgação/Alesp

Na última segunda-feira (27), a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Fakes News sobre as Eleições de 2018 da Alesp encerrou a fase conceitual com a participação de especialistas que somaram informações e conhecimento sobre o tema objeto da CPI. Na próxima sexta-feira (31), a partir das 10h30, a expectativa é de que já possam ser ouvidos os representantes do Facebook, Instagram e Twitter.


Foram três reuniões consecutivas e seis especialistas participantes. O Prof. Dr. Mauricio Januzzi Santos, advogado, especialista em Direito Penal se concentrou no tema 'Conceito de Fake News com relação aos crimes contra a honra'. Apontou uma pesquisa do Massachusetts Institute of Technology - MIT, publicada na revista Science, que concluiu que as Fake News possuem 70% mais chances de se propagarem mais rapidamente do que uma notícia verdadeira.


Entre as diversas proposituras que tratam sobre o assunto, destacou os Projetos de Lei Congresso Nacional nº 2630/2020 e nº 1258/2020, que buscam criminalizar as Fake News. Salientou a previsão legal de criminalização de Fake News no contexto eleitoral pela Lei nº 13.834/2019, que inseriu o art. 326-A no Código Eleitoral e prevê pena de reclusão de dois a oito anos e multa a quem atribuir a alguém a prática de crime ou ato infracional de que o sabe inocente, com finalidade eleitoral. Citou ainda as consequências da utilização das Fake News como meio para o cometimento de outros crimes, tais como: crimes contra a honra, falsa comunicação de crime ou contravenção e denunciação caluniosa. 


Em seguida, o Prof. Dr. Marcelo Xavier de Freitas Crespo, especialista em proteção de dados e direito digital, disse que se deve entender e limitar o escopo das 'Fake News', com enfoque nos vícios das atividades democráticas e econômicas. O especialista destacou que a atividade não é restrita a um ou outro partido ou viés ideológico.


Segundo ele, a grande dificuldade é trazer o conceito das Fake News para a legislação e a partir disso fazer uma regulamentação, sendo necessário retirar o foco do conteúdo e colocar na questão comportamental. “O combate a partir do conteúdo pode cercear a liberdade de expressão e não é essa a ideia”, considerou.


Crespo destacou ainda que é preciso uma abordagem técnica e neutra, que não seja vinculada a um tipo de plataforma ou aplicação, uma vez que a tecnologia é muito mais veloz que qualquer mudança legislativa. Ele alertou que se deve pensar no mecanismo de funcionamento da internet e em soluções que abranjam toda a tecnologia, uma vez que é praticamente impossível fazer cumprir uma legislação do Brasil em outros países.


No entendimento do especialista, as penas no Brasil a crimes contra a honra ainda são baixas. O professor defende também uma aproximação com plataformas para que se estabeleçam mecanismos de transparência sobre conteúdos denunciados e removidos. 


Na reunião do dia 24 de julho, foi a vez do convidado Prof. Dr. Pablo Ortelado, que desenvolve pesquisa na área de Privacidade, Políticas Culturais e Movimentos Sociais, trazer um pouco dos resultados dos estudos aos quais vem dedicando nos últimos cinco anos por meio de um laboratório que observa o consumo e distribuição das notícias.  


Pablo recordou que o termo fake News na acepção contemporânea surgiu na cobertura jornalística da eleição presidencial americana de 2016. É um fenômeno que possui algumas características novas e extremamente persuasivas. O estudioso citou três formas de disseminação: a primeira delas é a migração dos sites e blogs de um formato opinativo para um formato noticioso, mas que não dispõe do procedimento jornalístico de apuração dos fatos. Já o boato é o testemunho de alguém que teve acesso a uma verdade que estava escondida e que está revelando ao mundo. Neste caso, segundo ele, a força de persuasão vem do testemunho das pessoas que contam a história e isto se propaga numa velocidade muito grande. E a terceira forma é o convencimento pela repetição de evidências empíricas, muito comum nos grupos do Whatsapp, em que as pessoas compartilham vídeos e conteúdos diversos reforçando a mesma ideia.


Em seguida, o prof. Dr. Wilson Gomes contribuiu com a sua experiência. Ele destacou que Fake News é uma espécie de gênero da informação e que nenhuma opinião pode ser considerada Fake News. “Elas podem ser falsas, inautênticas, mal intencionadas, parciais, partidárias, no entanto, condená-las não significa de forma alguma prejudicar a liberdade de opinião, mas a liberdade de produzir impunimente determinado tipo de informação”, reforçou.


O professor ponderou que fake news são um tipo peculiar de propaganda, de um tipo desonesto. Ele exemplificou dizendo que propaganda é um processo sistemático de gerenciamento de informações voltado para a promoção de determinado objetivo e com a finalidade de obter uma resposta popular. De acordo com ele, isto não é incorreto, a falha está em produzir um tipo de propaganda apoiada em fake news cujo fim está associado a engano, mentira e manipulação. “Campanhas baseadas em fake news fazem com que pessoas assumam atitudes, gerem convicções e tomem decisões convenientes para quem falsificou e disseminou a informação e não para elas”, finalizou.


Colaborando para o encerramento da fase conceitual da CPI, na reunião da última segunda-feira, dia 27, o Procurador de Justiça Criminal do Ministério Público de São Paulo, Cesar Dario Mariano da Silva, destacou que o tema é complexo porque gera diversas interpretações e conflitos. 


Segundo Dario, as Fake News podem caracterizar algum tipo de infração quando ligadas à propaganda eleitoral, ressaltando que há dispositivo expresso que pune a propaganda enganosa que possa prejudicar o pleito eleitoral.  “A notícia falsa pode ainda caracterizar um crime de opinião, uma calúnia, uma injúria, uma difamação, apologia ao crime e em situações específicas até um crime contra a Segurança Nacional”, acrescentou.


Por outro lado, o procurador ressaltou que existe uma linha muito tênue entre a liberdade de expressão e pensamento e a prática de crime, e que dessa forma o entendimento dependeria da subjetividade do intérprete. Ele relembrou também que pessoas públicas estão mais suscetíveis às críticas e que, portanto, quando entram para a vida pública devem estar cientes dessa exposição.


Por último, o advogado, Dr. Tiago Pavinatto, reduziu o conceito de notícias falsas à essência do conceito de mentira, considerando que nem sempre ela é condenável. Ele citou a mentira juridicamente permitida que não obriga as pessoas a produzirem provas contra elas mesmas. Mencionou ainda as mentiras socialmente aceitas e por último, disse que as notícias falsas tratam da mentira que causa dano, que tem identificação com tipos penais já existentes na legislação. Ele destacou que tudo o que causa dano a terceiro tem a resposta do direito.


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