Audiência pública: debate ou ritual

Prevista em diversas legislações, a audiência pública é um dos instrumentos mais importantes de participação cidadã na administração pública

Por: Caio França  -  06/11/19  -  10:03
Audiência pública: debate ou ritual
Audiência pública: debate ou ritual   Foto: Carlos Nogueira/ AT

O parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal de 1988 é claro: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio dos representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.


Prevista em diversas legislações, a audiência pública é um dos instrumentos mais importantes de participação cidadã na administração pública. Na última semana, em Itanhaém, o poder que emana do povo falou mais alto (literalmente), impedindo a realização da audiência pública sobre o projeto de concessão do sistema rodoviário do litoral paulista, pela Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp).


Com cartazes dizendo ‘Não ao Pedágio’, os manifestantes protestavam contra a implantação de praça de pedágio no trecho que envolve o Litoral Sul, mais especificamente no Km 326 da Rodovia Padre Manoel da Nóbrega (SP-55), em Itanhaém.


O projeto envolve, também, outras rodovias, como a Mogi-Bertioga e a Rio-Santos, com propostas de intervenções necessárias para garantir maior segurança e facilidade de deslocamento do usuário por meio de duplicações, passarelas, viadutos, novos acessos e retornos, além de ciclovias. Estão previstos investimentos da ordem de R$ 3 bilhões em obras.


Tenho convicção de que ninguém que estava protestando na Câmara é contra o desenvolvimento do Litoral Sul paulista, as pessoas estão tão somente saturadas de tributos, tudo o que visualizam é mais uma cobrança, sem qualquer benefício aparente para a cidade. Para mudar essa percepção, será necessário muito esforço por parte dos governantes e órgãos públicos. E o primeiro passo neste sentido seria buscar a conciliação por meio do diálogo e da transparência.


Se a situação fugiu do controle na sede do Legislativo municipal, o ideal seria cancelar e propor uma nova data, em outro formato e local. Certamente esta não foi a primeira e nem será a última audiência pública realizada pela Artesp. Os funcionários são preparados para lidar com as situações mais adversas no tocante à manutenção da ordem pública. E desistir de ouvir o povo nunca será a melhor opção.


Diante do ocorrido, e motivado pela indignação das pessoas que se sentiram prejudicadas com a decisão da Artesp de validar a audiência, como se ali estivesse apenas para cumprir um ritual, levando em consideração as poucas sugestões recolhidas, apresentei um projeto de lei na última semana, disciplinando justamente a realização de audiências públicas.


A proposta prevê a realização de encontros preferencialmente após as 18h, ocasião em que se oportuniza maior participação da sociedade, fora do horário de expediente. Também foi incluído no texto o estabelecimento de no mínimo 30 questionamentos para os participantes, além da aceitação de inscrição prévia, na localidade, com antecedência de uma hora do tempo determinado para o início das atividades.


Ao acessar o site da Artesp, constatamos que a audiência foi dada como encerrada, ou seja, validada, mas ainda confiamos que a decisão possa ser revista, permitindo que o projeto possa ser elucidado e levado exaustivamente à discussão como deve ocorrer em toda audiência pública que tenha o real interesse de colher e analisar as contribuições de todas as partes interessadas no assunto.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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