Marcelo Sammarco: O novo Código Comercial e o transporte marítimo

Nesta coluna, o advogado especialista em Direito Marítimo e Portuário fala sobre a necessidade de adequar o Código Comercial que ainda vigora no Brasil

Por: Marcelo Sammarco  -  23/01/19  -  18:25
Marcelo Sammarco, advogado especialista em Direito Marítimo e Portuário
Marcelo Sammarco, advogado especialista em Direito Marítimo e Portuário   Foto: Carlos Nogueira

No Brasil, o setor de comércio e transporte marítimo de cargas é basicamente regido pela segunda parte do Código Comercial de 1850 (ainda em vigor). Embora o segmento esteja também sujeito à legislação esparsa (leis ordinárias e decretos), e também por alguns poucos dispositivos do atual Código Civil (artigos 743 a 756), por tratados e convenções internacionais, além de usos e costumes (Lex Mercatoria), o Código Comercial Brasileiro ainda é a principal fonte normativa deste ramo de atividade, na medida em que disciplina temas importantes como “registro e propriedade de embarcações”, “hipoteca naval”, “seguro marítimo”, “contratos de transporte”, “fretamento”, “conhecimento marítimo”, “acidentes e fatos da navegação”, “créditos marítimos”, “liquidação por avaria grossa”, entre outros assuntos que influenciam e afetam diretamente o cotidiano daqueles que integram a extensa e complexa cadeia de comércio e transporte de cargas.


Dessa forma, o cenário normativo atual denuncia graves problemas que tornam deficitária e ultrapassada a regulamentação deste que é um dos principais setores da economia brasileira. A constatação de que o atual Código Comercial Brasileiro é ainda a principal fonte normativa do setor causa extrema preocupação, na medida em que ele data de 1850, tendo sido inspirado no antigo Código Comercial Francês de 1807.


Apenas a título de ilustração, enquanto no cenário internacional já se discutem regras para regulamentar a atividade de navios não tripulados, os conceitos e dispositivos estabelecidos no nosso Código Comercial Brasileiro remetem a um passado de mais de 200 anos, época em que prevaleciam as caravelas, ocasião em que começavam a surgir as primeiras embarcações a vapor e nem se cogitava o surgimento dos contêineres como equipamento essencial e indispensável ao transporte de carga geral.


Atenta a esta urgente necessidade de adequar a legislação brasileira ao panorama atual do comércio e transporte marítimo de cargas, uma comissão de juristas coordenada pela ABDM (Associação Brasileira de Direito Marítimo) elaborou proposta de emenda ao projeto que visa a instituir o novo Código Comercial Brasileiro (PLC 1572/2011 e PLS 487/2013), em tramitação no Congresso Nacional. Essa emenda foi necessária, na medida em que o projeto do novo Código Comercial não trazia originalmente nenhuma previsão de regulamentar o comércio e transporte marítimo, enquanto que, por outro lado, revogava totalmente as disposições ainda em vigor do código anterior, especialmente as poucas regras sobre transporte marítimo que ainda restavam. Dessa forma, a regulamentação deste importante segmento da vida econômica do país, que hoje é deficitária, se tornaria totalmente carente de regras próprias, mergulhando o exercício da atividade num caos jurídico total.


Diante disso, e considerando a necessidade improtelável de se modernizar a regulamentação do setor, a comissão da ABDM elaborou um projeto de emenda que visa a instituir um capítulo específico sobre Direito Comercial Marítimo no novo Código Comercial, contendo 10 títulos e 262 artigos totalmente dedicados ao Direito Comercial Marítimo, tendo como foco adequar o texto legal à atual realidade do comércio e transporte marítimo no cenário internacional, ventilada por meio de tratados internacionais e pela vasta jurisprudência sobre o tema formada ao longo dos anos na Justiça Brasileira.


No último mês de dezembro, a comissão temporária instalada no Senado Federal para discussão do projeto do novo Código Comercial aprovou o relatório do senador Pedro Chaves (PRB-MS), com a inclusão da emenda do capítulo sobre o Direito Comercial Marítimo. O projeto seguirá agora para votação pelo plenário. Como toda lei nova, os dispositivos propostos na chamada emenda do “Direito Marítimo” são sempre passíveis de opiniões divergentes. No entanto, o objetivo principal da emenda é colocar o Brasil em situação de uniformidade com a comunidade marítima internacional, de modo a propiciar um cenário seguro que seja capaz de atrair cada vez mais investimentos em toda a cadeia de exploração do comércio e transporte de cargas originadas do Brasil ou a ele destinadas. A expectativa é de que em breve seja aprovado o novo Código Comercial Brasileiro, incluindo um capítulo específico sobre comércio e transporte marítimo de cargas, o que finalmente permitirá uma regulamentação moderna e adequada, privilegiando a segurança jurídica do setor, acima de qualquer interesse.


Logo A Tribuna
Newsletter