Frederico Bussinger: Da FIPS proposta à ferrovia portuária necessária: desafios à frente

O projeto e a governança da FIPS já são amplamente aceitos e caminham para serem consolidados

Por: Frederico Bussinger  -  13/02/21  -  00:37

“Inútil dormir que a dor não passa”
(Bom Conselho, de Chico Buarque e Maria Bethânia)


“Vamos botar de lado os entretanto e partir logo pros finalmente”
(Odorico Paraguaçu em O Bem-Amado, de Dias Gomes)


“Comunidade portuária pede inclusão da Ferradura na malha do Porto”, manchete destacada de A Tribuna, nesta quinta-feira (11), capta bem o eixo e a conclusão principal da recente audiência pública sobre a proposta de uma nova concessão da Ferrovia Interna do Porto de Santos (FIPS), planejada pela Autoridade Portuária de Santos (APS).


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Dito de outra forma: o projeto e a governança da FIPS já são amplamente aceitos e, salvo um detalhe aqui, outro ali, caminham para serem consolidados. O problema passa a ser o que poderia ser denominada FEPS – Ferrovia Externa do Porto de Santos (malhas ferroviárias entre o sopé da Serra e a FIPS): foi o depreendido da maioria das intervenções.


Também interessante observar (como, de certo modo, o fora na audiência dos portos capixabas): i) o reconhecimento, ainda que implícito, da importância do poder público (na regulação e com sua “golden share”); ii) idem em relação à função de autoridade-administradora (há muito reduzida a um ativo); iii) audiência, convocada para obter “contribuições” (em geral técnicas e formais), como espaço de mobilização e apoiamento político-administrativo.


A concessionária MRS, que explora as linhas entre o sopé da Serra do Mar e o complexo marítimo, procura tranquilizar a comunidade portuária: na sua intervenção, como também já fizera em recente webinar (24m15s), reconhece os desafios, mas assegura investimentos necessários a tempo e a hora. Para isso, resgata fatos e dados da sua atuação no Porto até hoje.


Mas os usuários não parecem tão seguros: crescem vozes pró fusão da FEPS com a FIPS, tema até aqui em geral tratado com circunlóquios (cerca-lourenço). P.ex: “... que os preceitos que estão sendo colocados na FIPS, de rateio de custos, de investimentos, de melhoria de eficiência, estejam também presentes no restante das linhas férreas do Porto” (1h20m55s).


Sem rodeios: a malha da MRS na Baixada, por essa ideia, seria incorporada ao escopo da FIPS, passando a ser gerida por um único “arranjo associativo” empresarial. Outros desdobramentos: i) na renovação da MRS, sua malha da Baixada precisaria ser excluída da “base de ativos” da “Malha Sudeste” (designação do contrato original); ii) essa malha deixaria de estar regida por uma contrato de concessão, passando a sê-lo pela “modelagem cooperativa” proposta para a FIPS; iii) assim, SMJ, deixaria de estar regulada pela ANTT. Ela concorda?


Mas... “no meio do caminho tinha (tem) uma pedra”, como diria Drummond! Possivelmente mais de uma!


Respeito a contratos e segurança jurídica foram termos muito ouvidos na audiência. A MRS, aparentemente, trata a renovação antecipada como direito, bem assim, líquido e certo. O contrato prevê a renovação, mas “a exclusivo critério da concedente”, que “verificada sua conveniência e oportunidade... definirá as condições técnico-administrativas e econômico-financeiras necessárias à prorrogação do contrato”. Dúvida: a exclusão da malha da Baixada do escopo do contrato renovado da MRS violaria a segurança jurídica? Até agora não se tratou disso publicamente.


Mas o maior obstáculo deverá ser o econômico-financeiro: a MRS informa que sua capacidade de atendimento crescerá de 63 (2021) para 109 Mt (2056). Ou seja, um potencial da ordem de 3.075 Mt ao longo de 35 anos. O Ato Justificatório da FIPS informa (4.27) que o valor cobrado pela MRS pelo direito de passagem é R$ 240,15/mil TKU (valor recentemente reajustado em 30,93% pelas Resoluções nº 32 e 33 da ANTT: R$ 314,43/mil TKU). Por que e como a MRS abriria mão dessa (monopolista) receita?


Há desafios e tarefas à frente. E a areia da ampulheta segue caindo.


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