No Dia da Mulher, especialista dá dicas para que elas conquistem espaço no mercado

Cresce a participação feminina em funções predominantemente masculinas, mas ainda há muito caminho pela frente

Por: Fernanda Balbino & Da Redação &  -  08/03/20  -  21:54
Rita Zaher:
Rita Zaher: "estamos construindo uma história que pode inspirar pessoas"   Foto: Alberto Marques

No Dia Internacional da Mulher, celebrado neste domingo, há muito o que comemorar. Mas também há oportunidades de avanço. Elas conquistaram o mercado de trabalho e vagas que antes eram destinadas apenas aos homens, como no setor portuário. Por outro lado, os salários ainda são menores e o preconceito persiste. A professora universitária e consultora na área de Recursos Humanos, Rita Zaher, é um desses exemplos de superação. Ela abriu espaço para outras mulheres no setor. E na entrevista a seguir, dá dicas para quem busca uma colocação profissional.
 
Qual é o papel da mulher no mercado de trabalho nos dias de hoje?


Atualmente a mulher tem um papel importante no mercado de trabalho. Muitas sustentam suas famílias, outras não casaram para priorizar o trabalho. De acordo com as pesquisas do IBGE no ano de 1950, o percentual de mulheres que estavam empregadas era inferior a 14% e o de homens era de 80,8%. Hoje estamos em uma situação bem diferente. Elas já são maioria, ocupando 51,3% dos postos de trabalho. Mesmo assim, ainda são inferiores no que diz respeito a salários e períodos de descanso.


Por que isso ainda acontece?


As diferenças salariais se devem aos postos de maior nível hierárquico que são, em sua maioria, ocupados por homens e as horas de descanso em função das obrigações domésticas e familiares que acabam assumindo, muitas vezes sozinhas.  Apesar de tudo isso, elas vem marcando território e transformando o mercado de trabalho, além de estarem também se transformando e descobrindo sua força a cada dia. 


Cada vez mais, elas ocupam posições predominantemente masculinas, como funções operacionais no setor portuário e cargos de gestão. Há estatísticas ou percepções de quanto essa participação vem crescendo?


Sim, e sou um exemplo disso. Fui a segunda mulher gestora de uma empresa portuária onde atuei e, depois disso, vieram várias outras mulheres. Além dos cargo de gestão, os cargos operacionais também estão muito mais abertos. Vemos mulheres como operadoras de carreta, empilhadeiras etc. Elas se mostram muito cuidadosas com os equipamentos e não são inferiores aos homens em nenhum aspecto técnico. Um estudo realizado pela Grant Thornton denominado Women in Business 2017, realizado em 36 países envolvendo mais de 5 mil mulheres, aponta que o número das que ocupam cargos elevou-se de 11% para 16%. Essa pesquisa ainda afirma que isso pode ser um circulo vicioso pois, sem exemplos a serem seguidos, não há muitos estímulos para as empresas avaliarem a possibilidade da mulher na gestão nem para as próprias mulheres pensarem em ocupar cargos de liderança. 


Quais são os maiores desafios que elas enfrentam nessas funções que eram (e ainda são) destinadas aos homens?


Os maiores desafios, se referem a poder mostrar sua capacidade e força, sua resistência à pressão. São recorrentes as queixas sobre preconceito e desconfiança em sua competência, além de assédios por parte de superiores, colegas e até mesmo de subordinados, o que vem trazendo o adoecimento das mulheres no mercado de trabalho. Quando falo sobre isso lembro das mulheres no trânsito, o que também foi uma revolução. Na maioria das vezes que estávamos estacionando o carro, as pessoas que estavam por perto paravam para olhar, muitos já com olhar de deboche. Essa situação é muito parecida porque as pessoas ainda trazem resquícios, mostrando onde pensam que as mulheres deveriam estar, expressando coisas como: “vai pra casa lavar roupa” ou “só podia ser mulher”. Esse pensamento ainda persiste em muitas pessoas infelizmente. Muitas mulheres, mesmo falando baixo e delicadas, são excelentes técnicas, administradoras, negociadoras. Outras, casadas e com filhos, dedicam-se ao máximo, as descasadas e com filhos, a mesma coisa, pois o salário já é um grande contribuidor em casa. Lógico que isso é provado com muita luta e quebrando as ideias pré-concebidas e estereotipadas por muitas pessoas até mesmo dentro da própria família. Ainda bem que estamos em tempos de mudanças e mesmo sendo uma minoria, ainda existem pessoas que já se despiram dos preconceitos. Demonstrar uma boa performance em equipamentos mais pesados poderia até ser mais difícil em função da força física que precisaria ser empregada mas, se pensarmos que hoje muitos equipamentos, mesmo dentro do porto ou ambientes operacionais, são sofisticados e precisam muito mais de destreza e delicadeza do que de força física, as mulheres já saem na frente.


Para as empresas, quais são as vantagens em contratar mulheres?


Em primeiro lugar a mulher é um ser humano como o homem e o que vou falar aqui pode se aplicar a qualquer ser humano (homem ou mulher). Porém, há uma tendência maior da mulher a ser mais cuidadosa. Pesquisas apontam que os horários de menos acidente de trânsito são os períodos da tarde quando há mais mulheres do que homens ao volante. Elas são mais propensas às múltiplas tarefas, conseguindo administrar bem diversas coisas ao mesmo tempo; são boas negociadoras porque sabem equilibrar interesses; são boas ouvintes, o que pode gerar elevados níveis de liderança e excelentes níveis de trabalho em equipe; são resilientes e comprometidas, buscando concluir tudo que iniciam no tempo correto; entre outras coisas. 


O que as mulheres devem esperar para o futuro?


Estamos crescendo e mostrando nosso poder. Quando falo sobre isso, não me refiro ao poder para brigar, mas para contribuir com um universo de coisas. Hoje, vemos um melhor preparo, escolaridade elevada, possibilidades de carreira e que estamos marcando território, construindo uma história para os que virão depois. Esse caminho ainda é longo mas estamos crescendo e desenvolvimento e isso não acontece do dia para a noite. Por isso, acredito que o futuro está cada vez mais promissor consolidando as conquistas de hoje.


Há dicas para as mulheres que estão entrando no mercado ou buscam novos postos no setor portuário? 


Embora as dicas caibam para qualquer setor, no setor portuário pode haver maior preocupação quando se imagina que é um ambiente masculino. Sendo assim, é importante indicar que: desenvolvam-se em termos técnicos (se preferir dirigir carreta ou operar guindastes, profissionalize-se nisso) e educacionais (Ensino Médio e Superior – cultura traz informação e nos fortalece), busquem estar antenadas com o que está acontecendo no Porto (ou no setor que gostaria de trabalhar), informe seus amigos sobre suas vontades, não se culpe por querer ter uma carreira sólida. Eu mesma sempre tive esse conflito, cuidar dos filhos ou trabalhar? Hoje, meus filhos já são crescidos e sinto que sentem orgulho da carreira que construí. Somos fortes e capazes de enfrentar os obstáculos. 


Como elas devem se qualificar e quando o comportamento influencia na hora da contratação?


Mesmo sabendo que as mulheres tem superado os homens nos indicadores educacionais, ainda temos problemas com isso. Muitas não conseguem seguir os estudos em função dos filhos mas acredito que hoje exista já uma camada que prefira estruturar-se primeiro para depois construir uma família.  Estudar, desde o curso técnico até a pós-graduação é muito importante. Para o setor portuário, o inglês é fundamental, dependendo do cargo que se quer ocupar.  Uma coisa que é frequente neste setor e apresenta uma desvantagem para a mulher que tem filhos é o trabalho em turnos. Porém, já sabendo disso, muitas mulheres já acordadas com a família, tem a proposta de entrar nesse regime com tranquilidade.  As viagens também podem ser algo frequente e, por isso, deixar tudo estruturado facilita no momento de posicionar-se com o Sim da entrevista.


E o comportamento?


O comportamento influencia e muito na hora da contratação. Posso dizer que ele praticamente define muitas delas. Por isso mostrar-se disposta, verdadeira, interessada e responsável é fundamental. Estudar a empresa antes de ir para a entrevista, chegar antes da entrevista, ser solidário e empático além de simpático conta muito pois, hoje em dia os trabalhos em equipe são valorizados e todos os conceitos acima mostram como é seu o convívio com o outro. Enfim, precisamos nos lembrar que estamos construindo uma história que pode inspirar pessoas, esse é o legado que estamos deixando por onde passamos. Uma grande responsabilidade, não é mesmo?


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